quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

A Grande Tradição Intelectual Cristã


DOCKERY, David; GEORGE, Timothy. A Grande Tradição Intelectual Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2015.

Dando continuidade a leitura de livros sobre a história da Igreja, acabei lendo esse, escrito pelos Teólogos Timothy George (Ph.D e Mestre em Teologia na Universidade de Harvard, EUA) e David S. Dockery (Ph.D em Humanidades na Universidade do Texas, EUA), que fala-nos sobre as grandes mentes teológicas e filosóficas que contribuíram para a grande tradição intelectual cristã, desde Justino Mártir, no século II, aos dias atuais, com o Teólogo Thomas Oden.

Logo de início é admitido que o cristianismo já não tem a relevância que antes gozava nas Universidades e outras instituições de ensino. A fé cristã foi relegada ao âmbito privado.

“[...] a maioria das universidades da Europa e da América do Norte, atualmente, entende que a tarefa de descobrir e de transmitir conhecimento é algo totalmente distante de qualquer conexão com a fé cristã, apesar de muitas dessas instituições acadêmicas atribuírem suas origens a uma herança cristã.” P. 17.

Páginas à frente, eles retomam esse tema:

“[...] Comumente, todos sabem que o pensamento cristão não é mais considerado um tema relevante na universidade moderna. Talvez seja admitido no departamento de História ou de Religião, onde há possibilidade de se fazer um trabalho sobre o que uma vez criam os cristãos.” P. 77.

No Brasil, Universidades como a Mackenzie (Igreja Presbiteriana do Brasil) e UNASP (Igreja Adventista do Sétimo Dia) tentam superar essa situação, dando ênfase a temas que julgam importantes para um cristianismo pulsante e atuante na sociedade. Por exemplo, ambas julgando a Teoria da Evolução uma inimiga mortal da grande tradição intelectual cristã, promovem eventos, cursos e disciplinas que questionam o darwinismo como a melhor teoria sobre a origem dos seres vivos.

Mas quem foram os homens que moldaram a grande tradição intelectual cristã, a despeito da sua atual crise nas grandes Universidades? Num imenso time que esculpiu o pensamento cristão, o livro traz em sua lista, nomes conhecidos e carimbados da Teologia Cristã, tais como:

JUSTINO MÁRTIR (século II) – “De forma brilhante, Justino vinculou o Antigo ao Novo Testamento.” P. 22.

ORÍGENES (séculos II-III) - “O trabalho de Orígenes foi grandemente influenciado pelo pensamento neoplatonista.” P. 24.

JOÃO CRISÓSTOMO (séculos III-IV) – “Deu primordial atenção à intepretação literal, gramatical e histórica das Escrituras.” P. 28.

JERÔNIMO (séculos III-IV) – “Sem dúvida, Jeronimo classifica-se como intérprete bíblico de primeira ordem, uma reputação que permanece até hoje.” P. 31.

AGOSTINHO (séculos IV-V) – “O trabalho de Agostinho formou o que há de melhor na tradição intelectual cristã, como poucos outros nos dois mil anos de história da igreja.” P. 31.

Muitos outros são mencionados: Anselmo, Aquino, Lutero, Calvino...

No tocante aos “hereges” que surgiram para atrapalhar o andamento da coisa, temos o trio do beiçudo – Marcião, Ário e Pelágio. Pense em três figuras que deram uma enorme dor de cabeça as lideranças da igreja. Concílios precisaram ser feitos para liquidar ou atenuar a influência “maléfica” que esses três causaram. E pior: ainda hoje, o protestantismo e catolicismo tem que lidar com os atuais arianos (testemunhas de Jeová) e com os pelagianos em suas próprias fileiras. As carcaças de Ário e Pelágio agradecem.

Um enunciado que chamou bastante atenção foi este:

“[...] sola gratia é herança comum do protestantismo histórico e do catolicismo fiel, assim como o é a confissão compartilhada pelo calvinismo tradicional e pelo arminianismo de João Wesley.” P. 51.

Os autores são dois Teólogos de tradição calvinista. Dessa forma, o reconhecimento deles de que João Wesley foi um cristão em consonância com a sola gratia (reconhecem a ortodoxia de sua teologia), se reveste de primordial importância para o longo debate entre arminianos e calvinistas. Os calvos do Facebook, por exemplo, com certeza em sua grande maioria, fariam chacota desse tipo de afirmação, caso viesse de autores arminianos. No entanto, devem se resignar. E note bem: Dockery e George usam a expressão "arminianismo de João Wesley", o que implica em dizer que os ensinos de Jacó Armínio estão fundamentados no SOLA GRATIA. Todavia, não é isso que os calvos de internet dizem. Sempre estão prontos a dizer de peito aberto que Armínio distorceu essa doutrina.

Felizmente nos últimos anos, as obras de autores arminianos têm preenchido o vácuo da Teologia protestante no tocante a essa questão, em terras brasileiras. Para quem se interessa por História da Igreja e Teologia Histórica, as prateleiras já dispõem de ótimas obras arminianas, que desmentem os espantalhos criados em torno de Armínio e dos arminianos.

Trazendo um dado triste e cruel do imperador Nero, o livro diz:

“[...] Os que visitam Roma podem ver o Coliseu. Esse lugar foi a princípio uma área de lazer do grande palácio de Nero, no alto da colina. Em um de seus banquetes, Nero mandou amarrar cristãos de Roma em postes e ordenou que ateassem fogo neles, de forma que quando os convivas chegassem, a caminho do banquete, passassem por onde os cristãos estavam sendo queimados, como postes de luz vivos.” P. 57.

Séculos depois, foram os ditos cristãos que fizeram coisas semelhantes. Bastou o poder mudar de lado. Humanos fazendo humanices.

E agora trazendo um trecho de uma carta do famoso Cientista Albert Einstein:

“[...] Somente a igreja se opôs à luta que Hitler empreendia contra a liberdade. Até então, eu não tinha nenhum interesse pela igreja, mas agora sinto grande admiração e estou bastante atraído por ela, que teve coragem persistente de lutar em favor da verdade espiritual e da liberdade moral. Sinto-me obrigado a confessar que agora admiro aquilo que costumava considerar de pouco valor.” P. 65.

Imagino os ateus mais empedernidos e cheios de ódio contra a religião, dizendo que essa carta não existe ou que os autores tiraram o texto do seu contexto, e assim, distorceram o que o Físico quis dizer. Haja paciência com esses também. Mesmo que o Einstein não tenha sido um religioso no sentido tradicional, esse tipo de reconhecimento de sua parte, da utilidade benéfica da religião num momento tão crucial da história humana, é algo que os ateus raivosos não curtem.

E terminando, nas páginas finais, os autores conclamam toda a comunidade cristã a lutarem e batalharem para que a grande tradição intelectual cristã tenha seu espaço nas Universidades e nas pesquisas de ponta do saber. Excelência, seriedade e pesquisa, nas mais diversas áreas devem ser feitas com entusiasmo pelos cristãos. Afinal, toda verdade é uma verdade de Deus. As ciências da natureza, humanidades, artes e todo tipo de conhecimento, deve ser buscado com diligência, para que Deus seja glorificado.