segunda-feira, 8 de junho de 2020

Os Evangélicos Norte-Americanos e o Racismo


Na sociedade norte-americana, dentre os grupos religiosos mais racistas, os evangélicos se destacam, mostrando que estão longe de serem a "luz do mundo" dita nos Evangelhos. Li três livros evangélicos que reconhecem a problemática do racismo em seu meio, dos quais destaco O Escândalo do Comportamento Evangélico, de Ronald Sider, evangélico e Ph.D em História na Universidade de Yale.

“Em 1989 George Gallup Jr. e James Castelli publicaram os resultados de uma pesquisa para determinar quais grupos nos Estados Unidos eram mais propensos a rejeitar vizinhos negros – um bom indicador de racismo. Católicos e cristãos não evangélicos foram classificados entre os menos propensos; 11% fizeram objeção ao contato entre negros e brancos. Os protestantes históricos chegaram próximo dos 16%. Com 17% batistas e evangélicos ficaram entre aqueles mais propensos a repudiar a possibilidade de ter vizinhos negros, e 20% dos batistas do sul rejeitaram a ideia de ter vizinhos negros.

[...]

Durante o movimento de direitos civis, quando os protestantes históricos e os judeus se uniram aos afro-americanos em sua luta histórica por liberdade e igualdade, líderes evangélicos foram quase totalmente omissos. Alguns se opuseram ao movimento; outros não se pronunciaram. Quando Frank Gaebelein, então co-editor de Christianity Today, não apenas cobriu a marcha de Martin Luther King sobre Selma, como também endossou o movimento e a ele se juntou, experimentou oposição e hostilidade da parte de outros líderes evangélicos.” P. 25.

“Michael O. Emerson e Christian Smith escreveram um livro crucial [...] explorando as atitudes racistas presentes no mundo evangélico. Concluíram que ‘o evangelicalismo branco provavelmente faz mais para perpetuar a sociedade racista do que para reduzi-lá’. Os protestantes conservadores brancos têm mais que o dobro de propensão que os outros brancos de apontar falta de motivação entre os negros (e não a discriminação) como fator responsável pela desigualdade entre brancos e negros. Os protestantes conservadores são seis vezes mais propensos a citar a falta de motivação que o acesso desigual à educação.” P. 27.

“[...] como é possível que os evangélicos sejam as pessoas mais racistas e preconceituosas de nossa sociedade?” P. 47.
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SIDER, Ronald J. O Escândalo do Comportamento Evangélico. Viçosa, MG: Ultimato, 2006.

O documentário Reavivamento da Rua Azusa: A História Nunca Antes Contada reconhece que apesar do movimento em seu início ter juntado em seus cultos, negros e brancos, a “harmonia” racial não teve repercussão duradoura, sendo apenas em 1994 que houve um pedido de desculpas sobre a tensão racial entre brancos e negros nas fileiras pentecostais.

Entretanto, Billy Graham, o pastor mais conhecido e respeitado do século XX-XXI, posicionou-se eminentemente contra o racismo dos anos 1950-1960, tendo o reconhecimento de Martin Luther King, que disse sobre ele:

"Não fosse pelo ministério do meu amigo Billy Graham, meu trabalho em prol dos direitos civis, não teria alcançado o mesmo sucesso."

Recortei a parte do documentário Billy Graham: O Embaixador de Deus, que fala sobre quais foram as atitudes de Graham frente ao racismo, mostrando o quanto ele foi um homem corajoso que lutou pela igualdade de todos, fato que o próprio King admite, em sua fala já citada, quando muitos pastores e líderes evangélicos empunham as suas Bíblias para dizer que os negros eram inferiores e deviam ser tratados com tal. 

Racismo: A Culpa não é só dos Estados Unidos


O racismo norte-americano é PERVESO, NOCIVO, GROTESCO, NOJENTO, uma VERGONHA para aquele país. Entretanto, nesse macabro time, muitos outros países não escapam de terem em suas fileiras um histórico grotesco de racismo que perdura até hoje.

O Brasil é um exemplo clássico. O documentário da BBC, Racismo: Uma História, chega à seguinte conclusão:

"Os chefes militares brasileiros são completamente brancos. A elite política brasileira foi, até recentemente, completamente branca. [...] o Brasil manteve a democracia racial, significando que o homem branco deita com mulheres negras sem sentir culpado, gerando crianças mestiças de grande beleza. Mas o sistema permanece perversamente desigual. O Brasil é a sociedade mais desigual do mundo ocidental. E os negros estão completamente no fundo da base. É um sistema pernicioso. É um Apartheid, sem as leis do Apartheid. E no topo é absolutamente racista".

Na Rússia, ex país líder da maior experiência comunista já feita, a coisa é muito feia para os negros lá. Theodore Dalrymple, Psiquiatra que tem uma substancial literatura que trata de temas culturais contemporâneos, escreve:

"Os negros não podem andar com segurança pelas ruas de Moscou." P. 16.

"Negros em Moscou correm o risco de sofrer agressão, especialmente se estiverem na companhia de mulheres russas." P. 65.
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DALRYMPLE, Theodore. Em Defesa do Preconceito. São Paulo: É Realizações, 2015. (PDF).

Na África, a vida que os negros levam, de um modo geral, é indiscutivelmente pior que a dos negros nos EUA. Nem preciso citar fonte alguma para tal asserção.  

Num episódio do documentário O Mundo Segundo os Brasileiros: Porto, uma brasileira negra que mora nessa cidade, conta essa história lamentável:

"[A cidade do] Porto não tem tantos negros, tem muito mais em Lisboa, porque é mais miscigenado. Então tem até umas histórias ‘engraçadas’. Um dia eu tava na ribeira com uma amiga, e a gente estava conversando e vieram dois rapazes falar com a gente; e aí um deles ficou conversando comigo, perguntou: ‘De onde você é? O que você faz?”. Aí o assunto acabou, e ele falou assim: ‘Olha, mas você é meio negra, né?’ Aí eu: ‘Não, sou inteira!’ Aí ele: ‘Não, não fica assustada não! Não foi isso que eu quis dizer. Eu só quis dizer que tem piores’. Eu tava ali do lado rio; joguei ele do rio. Mentalmente. Mas eu queria ter jogado. Mas assim, eu levo na boa, não me preocupo muito.”

A experiência pessoal dessa garota, talvez seja um indicativo de uma sociedade que ainda não superou o racismo. Claro que não estou equiparando o racismo norte-americano ao que porventura ocorre em Portugal. Todavia, serve para evidenciar um racismo generalizado, que não está preso apenas na região norte da América, mesmo que seja num grau muito menor.  

O país de Trump é apenas o mais visado nessa cruel realidade, e é até compreensível isso. Mas talvez as palavras de Karnal e cia, sejam uma voz de equilíbrio nessa temática:

"Quando criticamos os EUA como um país que apenas pensa em si e apenas conhece o mundo dentro de suas fronteiras, expressamos um sentimento de pesar por não sermos conhecidos/reconhecidos por eles". P. 11.

"Os EUA não são a única fonte dos problemas do mundo. P. 14.

"Tornou-se hábito reclamar da arrogância do governo de Washington, como se algum governo imperial do passado tivesse sido humilde, filantrópico ou expandido seu poder em busca da melhoria coletiva da humanidade. Para piorar nossa angústia, a alternativa é difícil: os governantes mais antiamericanos na Ásia ou América Latina não parecem garantir a possibilidade de um mundo mais confiável ou justo." P. 233-234.
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FERNANDES; Luiz Estevam; KARNAL, Leandro; MORAIS, Marcus Vinícius; PURDY, Sean. História dos Estados Unidos: Das Origens ao Século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. (PDF).