sábado, 13 de fevereiro de 2016

O Teste da Fé


BANCEWICZ. Ruth. O Teste da Fé. Viçosa, MG: Ultimato, 2013.

“Algumas das questões levantadas pela ciência são as mesmas encaradas por qualquer pessoa. O que é esse universo, afinal? Se pararmos para pensar mais profundamente sobre isso, a própria presença do cosmo se mostra um quebra-cabeça. A maior das questões é: ‘Por que existe algo em vez do nada?’. Ela nos leva a toda sorte de buracos negros filosóficos, mas tem de ser encarada. De onde o universo veio? Há um Deus por trás dele? Essas são questões que todos – e não apenas os cientistas – precisam considerar.” P. 69. (John Briant).

O Teste da Fé (livro e DVD) traz o depoimento de duas dúzias de Cientistas cristãos sobre a relação entre Fé, Razão e Ciência. Todos eles têm uma fé cristã pungente e não se envergonham de acreditar na Bíblia e em Jesus Cristo. Só há um porém, aí: ao contrário do que muitos crentes conservadores e fundamentalistas poderiam pensar a priori, eles não são criacionistas, isto é, não defendem, não creem, não militam a favor do ensino, divulgação e pesquisas que tenham como ponto de partida o livro de Gênesis, contrapondo-o a Teoria da Evolução. Todos eles são evolucionistas e não olham para os textos bíblicos da mesma maneira que os Cientistas da Criação os interpretam. Com certeza o Adauto Lourenço (Físico criacionista) não curtiu isso. 

Para muitíssimos Cientistas e estudantes de graduação nas Universidades, é impossível fazer Ciência e manter a fé religiosa de um modo coerente e satisfatório. Até sabem e cultivam amizades com pessoas religiosas que levam a sua crença em Deus a sério, mas veem esse tipo de conduta com muita desconfiança. Alasdair Coles (Professor Sênior de Neuroimunologia Clínica na Universidade de Cambridge) relata a sua experiência quanto a isso:

“Neurologistas acadêmicos representam um grupo de pessoas pouco espirituais. É incomum, para um neurologista, ser ministro religioso oficial, pois conversas sobre religião e espiritualidade não são bem vistas. Não que eu tenha encontrado alguma hostilidade; certamente encontrei curiosidade, mas raramente um suporte positivo. A reação mais comum é o desinteresse ou o sentimento de que tudo isso seria levemente excêntrico.” P. 43.

Não obstante, para Coles, reduzir tudo a explicações naturalistas é limitar o conhecimento e a nossa percepção da realidade.

“Alguém pode explicar uma pintura com base nos produtos químicos que compõem as tintas a óleo. Essa seria uma explicação perfeitamente verdadeira, mas a maioria das pessoas consideraria profundamente insatisfatória como explicação de uma pintura. Elas diriam que ‘há mais nela do que isso; alguém a fez, ela tem um significado que depende dos óleos, mas, em última instância, não tem nada a ver com eles’. Os pensamentos e o comportamento humanos são dependentes, mas, de algum modo, estão separados do material do cérebro.” P. 42.

Como manter a fé num ambiente onde um de seus pressupostos é o naturalismo? Como acreditar piamente na Ciência e ainda crer que um ser obscuro, estranho e inacessível possa interferir na ordem das coisas, mediante orações e preces? Para Jennifer Wiseman (Ph.D em Astronomia na Universidade de Harvard e Chefe do Laboratório de Astrofísica Estelar na Divisão de Astrofísica Ciência na NASA), isso nunca foi um problema:

"Nunca temi que a minha fé fosse ameaçada por frequentar uma universidade secular. [...] Não penso que o mundo físico, das forças materiais, seja tudo o que existe. Acredito que há um Deus Todo-Poderoso que é responsável pelo universo e que há um mundo espiritual que não pode ser medido com nossas ferramentas científicas. É nesse mundo espiritual que Deus também está ativo". P. 49, 53-54.

A Ciência seria uma forma de exaltar o poder e soberania divina.

“Eu penso que a exploração científica é uma forma de glorificar a Deus, pois explora o que ele criou.” P. 58.

Enquanto muitos estudantes cristãos acabam se deparando com muitas questões e descobertas científicas que podem abalar a sua fé, para John Briant (Ph.D em Bioquímica na Universidade de Cambridge, com Pós-Doutorado na Universidade de East Anglia), a sua vida acadêmica sempre foi tranquila quanto a isso:

"A relação entre ciência e fé nunca me assustou. Nunca me pareceu que realmente houvesse um choque entre elas. Tive de pensar a respeito de algumas coisas e elaborá-las, e, embora haja aquelas para as quais nunca teremos uma resposta, isso nunca me assustou". P. 63-64.

Bill Newsome (Ph.D em Neurobiologia no Instituto de Tecnologia da Califórnia e Professor de Neurobiologia na Escola de Medicina da Universidade de Stanford, EUA) admite sem nenhum pudor a precedência da sua fé cristã sobre a ciência:

“Eu amo a minha atividade científica e tenho sido muito gratificado por seu sucesso, mas, se alguém pusesse uma arma na minha cabeça e dissesse: ‘Bill, escolha entre a sua ciência e a sua fé’, não tenho dúvida de que eu escolheria a minha fé antes da minha ciência, pois ela é a parte mais fundamental e mais profunda de quem eu sou como ser humano.” P. 76.

Talvez muitos ateus e pessoas não muito afeitas a religião, que se julguem ultrarracionais, fiquem horrorizadas com tal declaração. Um pecado imperdoável vindo de um Cientista. Em contrapartida, quantos desses "livres pensadores" seriam racionais e imparciais diante das evidências? Quantos aceitariam as descobertas científicas ou evidências filosóficas, que porventura viessem a abalar suas certezas materialistas mais caras? Desconfio da racionalidade e comprometimento desapaixonado na busca da verdade, da maioria dos que esbravejam furiosamente contra a fé, Deus e a religião. Será que muitos deles também não se encaixam no que o Newsome diz logo abaixo?

“Quando vamos a fundo, descobrimos tipicamente que as pessoas que respondem com todo esse calor emocional [contra a fé], normalmente, tiveram em seu passado alguma experiência muito desagradável, a qual é a causa da sua raiva.” P. 85.

Em complemento, cito as palavras de John Polkighorne (ex-Professor de Física na Universidade de Cambridge, Pós-Doutor em Física no Instituto de Tecnologia da Califórnia):

“Lembro-me de um amigo bioquímico, ótima pessoa, que me disse anos atrás: ‘Eu simplesmente não quero que exista um Deus’.” P. 126.

Creio que eles acentuam bem a questão. Salientando também que muitos crentes têm aversão a Ciência com um enorme temor de que esta possa contradizer as suas crenças bíblicas. E na verdade, ela até contradiz mesmo.

Ainda nas palavras do Polkighorne, ele confirma o que eu já tinha lido de outra fonte, de que entre os Cientistas, os Físicos estão entre os que mais estão propensos a crer:

“É provavelmente verdade que os físicos são muito mais abertos a questões de fé do que outros cientistas. Penso que há várias razões para isso. Uma é que os físicos olham a realidade a partir de certa perspectiva, na qual o mundo é belissimamente ordenado e há um tipo de religiosidade cósmica natural que emerge dessa experiência. Não é irracional perguntar se há uma ‘mente’ por trás de tudo isso.” P. 126.

Quanto ao mito popular, que até muitos universitários confusos e apressados pensam, de que a Ciência está baseada estrita e absolutamente em fatos, Polkighorne os contradiz:

“As pessoas dizem que a ciência lida com fatos, certezas e coisas do gênero, mas é claro que isso não é verdade. A atividade científica é a relação entre a teoria e a experimentação, de modo que precisamos da teoria para interpretar o experimento. O experimento confirmará ou refutará a teoria. Isso é algo muito mais sutil.” P. 126-127.

Simon Conway Morris (Professor de Paleobiologia Evolucionária da Universidade de Cambridge, Inglaterra), no DVD afirma que a Teoria da Evolução e ateísmo não caminham necessariamente de mãos dadas.

“Você pode dizer: ‘sou biólogo evolucionista, sou ateu’. Essa é uma posição válida. Eu não a adoto. Mas não podemos afirmar: ‘Evolucionismo e ateísmo caminham juntos’. Isso não tem fundamento. Evolucionismo é uma teoria, tem de estar inserido em um sistema metafísico, e temos de decidir quais sistemas metafísicos é o mais empolgante, qual deles tem mais potencial, qual deles lhes dá coceira nas mãos. Niilismo? Bem, não obrigado.”

Quanto a isso, eu creio que a Teoria da Evolução nos termos em que é formulada, leva forçosamente ao ateísmo. No entanto, alguns Filósofos e Cientistas têm invertido essa relação. Por exemplo, Alvin Plantinga (Ph.D em Filosofia pela Universidade de Yale) tem argumentado que a evolução corretamente interpretada é uma evidência poderosa a favor do teísmo. Seguindo Plantinga, também está William Lane Craig (Ph.D em Filosofia na Universidade de Birmingham, Inglaterra).

Muitos outros Cientistas participaram da composição do livro e documentário, trazendo suas histórias, sua relação com a Ciência, vida acadêmica, Deus, Religião, Jesus, e, como tudo isso afeta as suas vidas. Apenas dei umas pequenas pinceladas dispersas sobre o que dizem alguns deles.

Livro e DVD muito agradáveis de ler e assistir. Mais uma obra em português que vem mostrar a relação entre Ciência e Religião, revelando que ambas podem andar juntas, sem necessariamente se digladiarem.