ORR-EWING,
Amy. Por que confiar na
Bíblia? Viçosa, MG: Ultimato, 2008.
Há mais ou menos 15 anos, começou a proliferar no
mercado protestante editorial brasileiro, uma enxurrada de obras apologéticas;
livros que têm por objetivo mostrar as razões científicas, teológicas,
históricas, filosóficas (lógica e ética) e antropológicas, que corroboram/autenticam/
provam/evidenciam/consubstanciam a fé cristã alicerçada na Bíblia.
Nas principais editoras (Vida, Vida Nova, CPAD,
Cultura Cristã, Hagnos, Ultimato, etc.), muitos desses livros são bem vendidos
e aceitos pelo público consumidor, ávidos em mostrar para os descrentes, que a
Bíblia é verdadeira naquilo que ensina, prega e ordena. Uma parte considerável
de seus escritores são pessoas com Doutorados nas áreas de Ciências, Filosofia
e outras áreas afins. São autores que conhecem bem, o que os céticos, ateus e
antirreligiosos andam dizendo acerca do Cristianismo, e, assim, tentam
neutralizar os ataques desferidos por eles, com uma variedade enorme de
argumentos. Apesar de muitas vezes serem apologias repetitivas e meras cópias
umas das outras (igual a essa postagem). Se bem que os ataques a fé, também
geralmente são os mesmos.
O livro em foco, escrito por Amy Orr-Ewing, que não é
nenhuma Ph.D, repete muitos dos velhos
argumentos apologéticos. Mas traz um bom resumo do que seria uma defesa aparentemente razoável do Cristianismo (mesmo que não traga o famoso argumento cosmológico em
suas páginas). Ele não figura entre os livros mais comentados, requisitados e
aplaudidos entre o povo evangélico, no entanto, é o que temos por aqui. Espero
em não muito tempo, resumir/resenhar outros livros do mesmo teor.
Por Que Confiar na Bíblia? começa a sua defesa,
destacando a incoerência dos pós-modernos que gritam aos quatro cantos, que não
podemos saber o verdadeiro significado de um texto. Sendo a Bíblia um texto,
aliás, vários textos, e ainda por cima escrita por várias pessoas, durante vários séculos, é impossível
sabermos o que as suas palavras realmente significam. Filósofos como
Wittegenstein, Lyotard, Foulcalt e Derrida, estão na linha de frente nessa
guerra contra o verdadeiro significado de qualquer texto. Sendo o primeiro, de
longe o mais sofisticado. Em resumo, jogos de linguagem, jogos de poder e metanarrativas, são artifícios que criam uma ilusão de que a verdade
pode ser encontrada em qualquer instância, inclusive na hermenêutica de um
texto. As palavras, frases e livros, não possuem significado inerente, mas o
sentido que atribuímos a eles. Nós fabricamos e inventamos a verdade, e ponto
final.
Em resposta, Orr-Ewing fornece uma ótima objeção a
esse modo contra-intuitivo de ver as coisas:
“Se as palavras não possuem significado
próprio, então aqueles que concordam com este argumento deveriam ficar calados.
Como poderíamos expressar uma ideia em palavras e ao mesmo tempo negar a essas
mesmas palavras a possibilidade de significado?” P. 24.
A balela fajuta desses Filósofos vai bueiro abaixo,
com essa simples objeção.
Agora, isso não quer dizer que seja fácil sabermos o
significado que os autores de dois milênios quiseram passar. A Bíblia é um livro
extremamente difícil de interpretar. Umas das maiores provas empíricas disso
são as várias igrejas, religiões e Teólogos que desde o início do Cristianismo
dizem saber o que o texto diz ou ensina. Pode até haver uma certa concordância
em muitos pontos. Mas não é suficiente. Os estudiosos, principalmente os
fundamentalistas religiosos, só faltam se matar, para provar que a sua
interpretação é a correta.
Outro ponto que ela aborda, é semelhante ao primeiro.
Podemos ter acesso confiável ao passado? Alguns retardados mentais,
contaminados pelas ideias lamacentas do relativismo pós-moderno, dizem-nos que
é impossível determinar o que aconteceu tanto num passado remoto, como no
passado recente. É a era da incerteza! Ironicamente esses intelectuais dizem
não poderem descobrir o que aconteceu na história, mas “brilhantemente”, com um
cinismo nojento, descobriram que tudo
não passa de invenção. Como ficaram sabendo
que as coisas são assim?
Basta lembrar que sobriamente a grande comunidade de
Historiadores (ela não menciona isso) não abraçou essa ideia ridícula. Estão
cônscios de que o positivismo do século XIX não é mais o caminho para o fazer
historiográfico, mas nem por isso, acham que tudo que se escreve sobre o
passado é mera ficção.
Dessa forma, podemos ter acesso histórico confiável
(nem que seja dentro de certos limites) aos muitos acontecimentos mencionados
nos textos bíblicos, através do que a Orr-Ewing chama de linhas convergentes de evidência. Principalmente ao evento ímpar, a
vida de Jesus. Podemos ter conhecimento histórico sobre Cristo.
Mesmo cientes de que podemos saber o que um escritor
bíblico quis transmitir e ter acesso aos eventos históricos, é possível que os
manuscritos existentes da Bíblia mereçam a nossa consideração? Seriam
confiáveis? Foram preservados de tal forma, que podemos olhar para nossas
Bíblias modernas e saber que o conteúdo que está ali é basicamente o mesmo que
o de 2000 anos atrás?
A resposta é positiva. Há um vasto número de
manuscritos antigos autênticos que quando comparados, guardam em seus papiros e
pergaminhos, a mesma mensagem. Claro que existem muitas variantes nas milhares
de cópias disponíveis, contudo parecem não prejudicar a essência do que está
ali escrito. Há uma convergência assustadora entre os diversos códices; há uma
multiplicidade de cópias tanto do Antigo Testamento como no Novo Testamento que
excedem em muito o número de manuscritos de outras obras antigas.
Um adendo: não posso deixar de mencionar que o Bart Ehrman
é um destacado erudito que contesta toda essa empolgação em torno da
confiabilidade dos manuscritos do Novo Testamento. Livros seus, costumam ser
bem persuasivos em nos convencer do contrário. E para horror dos mais apegados
a confiabilidade, ele não está só nessa. Outros especialistas juntam-se a ele,
nessa questão. Aqui se pode ver um
debate do Ehrman sobre esse tema:
Uma coisa são os diversos manuscritos serem em
essência iguais aos escritos originais, outra completamente diferente é se o
conteúdo deles é verdadeiro!
“A prova de que os manuscritos bíblicos são confiáveis não é garantia de que seu conteúdo também o seja. Embora os manuscritos sejam cópias antigas genuínas, sem possibilidade de fraude, isso não significa que o que está escrito ali não seja uma tentativa de fraude”. P. 55.
“A prova de que os manuscritos bíblicos são confiáveis não é garantia de que seu conteúdo também o seja. Embora os manuscritos sejam cópias antigas genuínas, sem possibilidade de fraude, isso não significa que o que está escrito ali não seja uma tentativa de fraude”. P. 55.
Orr-Ewing destaca alguns pontos que nos dão indícios de
que os relatos bíblicos merecem confiança. Eis alguns exemplos:
- A maneira negativa com que os evangelhos descrevem os
apóstolos;
- A coerências dos evangelhos diante dos evangelhos
apócrifos;
- Documentos
extrabíblicos da época, que relatam eventos locais e acontecimentos presentes
nas escrituras. Josejo, Tácito, Suetônio e Plínio.
Obviamente é questão de fé acreditar se as histórias
presentes no Antigo e Novo testamento são fidedignas. Por mais que se apresentem
argumentos razoáveis a favor da ressurreição, por exemplo, apenas a fé pode dá
o derradeiro passo.
Nos capítulos seguintes ela responde as respectivas
perguntas:
E quanto ao cânon?
E quanto aos outros livros sagrados?
Seria a Bíblia um livro sexista?
E quanto às guerras?
A opinião da Bíblia sobre sexo não estaria
ultrapassada?
É possível conhecer a verdade?
Com relação sobre a Bíblia e a sexualidade, a autora
irá abordar a proibição bíblica do sexo antes do casamento e a condenação da
prática homossexual. Particularmente quando olho para os textos bíblicos, pelo
menos no Antigo Testamento, não há uma exigência tão rígida em se guardar até o
matrimônio, em relação ao sexo masculino. No Novo Testamento, em teoria há uma
rigidez maior. Nota-se nos escritos de Paulo que a frouxidão presente no Antigo
testamento deve cessar.
Quanto à homossexualidade, a Bíblia é inflexível. É pecado;
é aberração; é contrária a natureza. Isso é extremamente ofensivo aos milhões
de homossexuais hoje em dia. Mas é o que ela diz.
Naturalmente todos os pontos frisados em Por Que
Confiar na Bíblia? podem ser questionados. Todos os temas tratados são
analisados de uma maneira muito simples e sem profundidade, cabendo ao leitor
procurar outras obras que trabalhem mais detalhadamente cada assunto abordado.