Muçulmanos são constantemente acusados de
intolerância (e com razão), por serem tão hostis as religiões não islâmicas
como o budismo, cristianismo, judaísmo, espiritismo; fora serem bastante
agressivos com homossexuais, ateus etc., nas sociedades onde são maioria. Se
prezam por uma certa tolerância e diálogo, isto se dá em sociedades não
islâmicas, onde são minoria, estando alijados do poder de mando, para perseguir
e até matar qualquer um que falar algo negativo contra o seu profeta e
religião.
Para contestar e refutar a pecha de intolerantes, não
é incomum, apelarem para uma suposta e mitológica “era de ouro do islã”, ou
“era de ouro da civilização islâmica”, que prezava pela tolerância e
convivência pacíficas entre o islã, religião dos dominantes, e o cristianismo e
outros credos, religião dos vencidos, em que estes viviam a plenitude de suas
religiões e credos, sem serem importunados pelo poder estatal islâmico.
Eles também apelam para os poucos e duvidosos casos
de tolerância muçulmana no mundo atual, fazendo dessas exceções à regra.
O presente texto focará no mito da idade de ouro,
trazendo à baila as conclusões de historiadores que discordam da propaganda
ideológica muçulmana de que no medievo, os muçulmanos eram exemplos de muita
tolerância. Alguns desses historiadores também falará do mito de que os
muçulmanos viveram uma era de ouro nas várias áreas do conhecimento. As
citações finais atestarão o medíocre estado em que se encontram atualmente os
países árabes nas ciências e educação.
Para Mohamad Ballan, Ph.D em História Medieval e
Islâmica na Universidade de Chicago, as coisas não foram bem assim. Ele
escreve:
“[...] a ideia de uma ‘Idade de Ouro muçulmana’ é
uma construção historiográfica. [...] Existem muitos problemas com essa
perspectiva. [...] seu principal argumento de que o período entre o século VIII
e o século XIII pode ser caracterizado principalmente pela tolerância,
eflorescência cultural, unidade política e harmonia religiosa é contrário a
muitos dos fatos que encontramos ao ler a história das várias civilizações que
são incluída na categoria de ‘civilização islâmica’, uma frase que esconde a
diversidade linguística, cultural, intelectual, teológica e política das terras
em que os muçulmanos residiram durante os períodos medieval e início da
modernidade. Isso para não falar do fato de que as narrativas promovidas por
essas perspectivas da ‘Idade de Ouro’ costumam ser um retrabalho de histórias
oficiais que não levam em consideração as realidades de grupos marginalizados
durante o mesmo período. A perspectiva da ‘Idade de Ouro’ também é problemática
porque é em muitos aspectos reacionária e uma resposta aos muitos desafios
políticos, religiosos e intelectuais enfrentados pelo mundo muçulmano no
período moderno.”
O historiador diz que a “idade de ouro islâmica” é
pura ideologia, que não tem respaldo nos fatos históricos.
“A ênfase em uma ‘Idade de Ouro muçulmana’ é
portanto, normalmente não com base em qualquer envolvimento abrangente com
fontes históricas ou um desejo de descobrir a realidade real da história
muçulmana medieval e do início da modernidade. Em sua essência, o projeto é
puramente reacionário e busca fornecer aos muçulmanos a armadura ideológica de
que precisam para resistir às críticas modernistas contra sua civilização.
Infelizmente, no entanto, ao fazê-lo, o paradigma da ‘Idade de Ouro’ tende a
submeter os fatos históricos a seus estreitos interesses ideológicos. Em outras
palavras, as nuances da história e da civilização muçulmana são completamente
obscurecidas em face de declarações amplas e abrangentes voltadas para
enfatizar não apenas a retidão, mas até mesmo a supremacia absoluta da
civilização muçulmana, como se acreditava ter se manifestado entre o século IX
e o século XVIII. É nesse ponto que a história deixa de ser um esforço
intelectual crítico e se torna polêmica e apologética.”
Discordo de algumas conclusões do autor no
parágrafo final (não estou falando desses excertos postados). No entanto, o
texto dele é muitíssimo bom. Vale dá uma conferida.
Muitos apologetas muçulmanos adoram dizer, que no
reino de Andaluz, na Espanha, a tolerância religiosa para com os judeus e,
também, cristãos, era política de estado. Uma idade de ouro da alteridade!
Mas a realidade se impõe sobre declarações fundadas
mais em ideologia, e na ânsia de nos mostrar um islã do passado amigável,
atraente e tolerante, do que na documentação existente, que desmente esse mito
de que os judeus e cristãos viviam numa espécie de paraíso multirreligioso. O
discurso muçulmano é exagerado e, infelizmente, muitas vezes, mentiroso.
Darío Fernández-Morera, Ph.D em Literatura
Comparada na Universidade de Harvard, e autor do livro O Mito do Paraíso
Andaluz: Muçulmanos, Cristãos e Judeus Sob o Domínio Islâmico na Espanha
Medieval, contradiz todo esse discurso de tolerância islâmica fundado em um
desejo de livrar o islã e os muçulmanos da pecha de intolerantes.
“Por quaisquer padrões objetivos, então, e apesar
de suas realizações artísticas, literárias e científicas inegáveis e do
pensamento moderno e desejoso de 'vamos todos nos dar bem' que tenta encobrir
as evidências em contrário, a Espanha islâmica foi não é um modelo de harmonia
multicultural. A Andaluzia foi assolada por conflitos religiosos, políticos e
raciais controlados nos melhores tempos apenas pela aplicação de força
tirânica. Suas conquistas são inseparáveis de sua turbulência.”
Richard Fletcher, Professor de História na
Universidade de York, é categórico:
“O testemunho daqueles que viveram os horrores da
conquista berbere, da fitnah [provação] andaluza no início do século XI, da
invasão dos almorávidas - para citar apenas alguns episódios perturbadores -
deve dar isto [isto é: a visão rosada de Espanha muçulmana] a mentira.
A verdade histórica simples e verificável é que a
Espanha mourisca foi mais frequentemente uma terra de turbulência do que de
tranquilidade. … Tolerância? Pergunte aos judeus de Granada que foram
massacrados em 1066 ou aos cristãos que foram deportados pelos almorávidas para
o Marrocos em 1126 (como os mouriscos cinco séculos depois). … Na segunda
metade do século XX, surge um novo agente de ofuscamento: a culpa da
consciência liberal, que vê os males do colonialismo - mais presumidos do que
demonstrados - prenunciados na conquista cristã de al-Andalus e na perseguição
de os mouriscos (mas não, estranhamente, na conquista e colonização mourisca).
Misture bem a mistura e distribua-a gratuitamente para acadêmicos crédulos e
pessoas da mídia em todo o mundo ocidental. Em seguida, derrame-o generosamente
sobre a verdade ... nas condições culturais que prevalecem no Ocidente hoje, o
passado deve ser comercializado e, para ser comercializado com sucesso, deve
ser embalado de forma atraente. A Espanha medieval em estado natural carece de
grande apelo. Fantasias auto-indulgentes de glamour ... fazem maravilhas para
aguçar sua imagem. Mas a Espanha mourisca não foi uma sociedade tolerante e
esclarecida, mesmo em sua época mais cultivada.”
A historiadora Gisèle Littman, conhecida por Bat
Ye'or, faz coro, elencando um exército de fatos na Andaluzia, que faz evaporar a
narrativa de uma sociedade exemplar quando o assunto é convivência pacífica e
exemplar:
“Em 730, a Cerdagne (na Septimania,
perto de Barcelona) foi devastada e um bispo foi queimado vivo. Nas regiões sob
controle islâmico estável, judeus e cristãos eram tolerados como dhimmis - como
em outros lugares em outras terras islâmicas - e não podiam construir novas
igrejas ou sinagogas nem restaurar as antigas. Segregados em quartos especiais,
eles tiveram que usar roupas discriminatórias. Sujeito a pesados impostos, o
campesinato cristão formou uma classe servil ligada aos domínios árabes; muitos
abandonaram suas terras e fugiram para as cidades. As duras represálias com
mutilações e crucificações sancionariam os pedidos de ajuda dos reis cristãos
aos moçárabes (dhimmis cristãos). Além disso, se um dhimmi prejudicasse um
muçulmano, toda a comunidade perderia seu status de proteção, deixando-a aberta
à pilhagem, escravidão e assassinato arbitrário.
[...]
A condição humilhante imposta aos
dhimmis e o confisco de suas terras provocaram muitas revoltas, punidas com
massacres, como em Toledo (761, 784-86, 797). Depois de outra revolta toledana
em 806, setecentos habitantes foram executados. As insurreições eclodiram em
Saragoça de 781 a 881, Córdoba (805), Mérida (805-813, 828 e no ano seguinte, e
mais tarde em 868), e novamente em Toledo (811-819); os insurgentes foram
crucificados, conforme prescrito no Alcorão 5: 33.
A revolta em Córdoba de 818 foi
esmagada por três dias de massacres e pilhagem, com 300 notáveis crucificados e
20 000 famílias expulsas. O feuding era endêmico nas cidades andaluzas entre os
diferentes setores da população: colonizadores árabes e berberes, convertidos
muçulmanos ibéricos (Muwalladun) e dhimmis cristãos (moçárabes). Raramente
houve períodos de paz no Amirato de Córdoba (756-912), nem depois.
Al-Andalus representou a terra da
jihad por excelência. Todos os anos, às vezes duas vezes por ano, expedições de
invasão eram enviadas para devastar os reinos cristãos espanhóis ao norte, as
regiões bascas ou a França e o vale do Ródano, trazendo despojos e escravos. Os
corsários andaluzes atacaram e invadiram ao longo das costas da Sicília e da
Itália, até mesmo nas ilhas do Egeu, saqueando e queimando pelo caminho.
Milhares de pessoas foram deportadas para a escravidão na Andaluzia, onde o
califa mantinha uma milícia de dezenas de milhares de escravos cristãos
trazidos de todas as partes da Europa cristã (os Saqaliba) e um harém cheio de
mulheres cristãs capturadas. A sociedade foi fortemente dividida em linhas
étnicas e religiosas, com as tribos árabes no topo da hierarquia, seguidas
pelos berberes que nunca foram reconhecidos como iguais, apesar de sua
islamização; mais abaixo na escala vinham os convertidos mullawadun e, na parte
inferior, os cristãos e judeus dhimmi.
[...]
[...] bibliotecas inteiras de judeus
e cristãos foram saqueados e destruídos. Outro proeminente jurista andaluz, Ibn
Hazm de Córdoba (falecido em 1064), escreveu que Alá estabeleceu a propriedade
dos infiéis de suas propriedades apenas para fornecer butim aos muçulmanos.
Em Granada, os vizires judeus Samuel
Ibn Naghrela e seu filho Joseph, que protegiam a comunidade judaica, foram
assassinados entre 1056 e 1066, seguidos pela aniquilação da população judaica
pelos muçulmanos locais. Estima-se que cerca de cinco mil judeus morreram no
pogrom de muçulmanos que acompanhou o assassinato de 1.066. Esse número é igual
ou superior ao número de judeus supostamente mortos pelos cruzados durante a
pilhagem da Renânia, cerca de trinta anos depois, no início da Primeira
Cruzada.
O pogrom de Granada provavelmente
foi incitado, em parte, pela amarga ode antijudaica de Abu Ishaq, um conhecido
jurista e poeta muçulmano da época, que escreveu: 'Coloque-os de volta
onde pertencem e reduza-os ao mais baixo dos mais baixos ... volte seus olhos
para outros países [muçulmanos] e você descobrirá que os judeus são cães
proscritos ... Não considere uma violação da fé matá-los ... Eles violaram
nosso pacto com eles, então como você pode ser considerado culpado contra os
violadores?'
Os muçulmanos berberes almóadas na
Espanha e no norte da África (1130-1232) causaram enorme destruição tanto na
população judaica quanto na cristã. Essa devastação - massacre, cativeiro e
conversão forçada - foi descrita pelo cronista judeu Abraham Ibn Daud e pelo
poeta Abraham Ibn Ezra. Suspeitando da sinceridade dos judeus convertidos ao
islamismo, os “inquisidores” muçulmanos (isto é, anteriores a seus colegas
cristãos espanhóis em três séculos) removeram as crianças dessas famílias,
colocando-as aos cuidados de educadores muçulmanos. Maimônides, o renomado filósofo
e médico, experimentou as perseguições almóada e teve que fugir de Córdoba com
toda a família em 1148.
De fato, embora Maimônides seja
freqüentemente referido como um modelo de realização judaica facilitado pelo
governo esclarecido da Andaluzia, suas próprias palavras desmentem essa visão
utópica do tratamento islâmico dos judeus: ‘... os árabes nos perseguiram
severamente e passaram a ser nocivos e legislação discriminatória contra nós
... Nunca uma nação nos molestou, degradou, rebaixou e nos odiou tanto quanto...’.
[...]
A história sócio-política da
Andaluzia foi caracterizada por uma dhimmitude particularmente opressiva que é
completamente incompatível com as noções modernas de igualdade entre os
indivíduos, independentemente da fé religiosa. No alvorecer do século 21,
devemos insistir que os muçulmanos no Ocidente adotem padrões sociais
pós-iluministas de igualdade, não ‘tolerância, abandonando para sempre sua
hagiografia dos padrões brutais e discriminatórios praticados pelos juristas
clássicos de Maliki dos ‘iluminados’ Andaluzia.”
Para se ufanarem ainda mais, os muçulmanos metidos
a apologistas não se restringem a questão da tolerância, mas também, nas
questões do intelecto e da ciência.
Em 2009, o então presidente Barack Obama, em um
discurso falou sobre a dita “idade de ouro”, afirmando que o islã levou a luz
do conhecimento para todo o mundo. Victor Davis Hanson, Ph.D em História
Clássica na Universidade de Stanford, não subscreve as falas entusiasmadas
dele:
“Em seu discurso na semana passada no Cairo, o
presidente Obama proclamou que era um 'estudante de história'. Mas, apesar da
imagem de Obama como intelectual formado pela Ivy League, ele carece de
competência histórica tanto em fatos quanto em interpretação. … Obama… afirmou
que 'o Islã... Carregou a luz do aprendizado por tantos séculos, abrindo
caminho para o Renascimento e o Iluminismo da Europa'. [Na verdade] a cultura
islâmica medieval ... teve pouco a ver com a redescoberta europeia dos valores
clássicos gregos e latinos. Europeus, chineses e hindus, não muçulmanos,
inventaram a maioria das descobertas que Obama atribuiu à inovação islâmica.
... Grande parte da Renascença, na verdade, foi mais baseada na fuga de séculos
de estudiosos bizantinos de língua grega de Constantinopla para a Europa
Ocidental para escapar da agressão dos turcos islâmicos.”
De acordo com Serge Trifkovic, Ph.D em História
Moderna na Universidade de Southampton, Reino Unido, esse papo de “idade de
ouro do islã” na área do conhecimento é um exagero.
“Para ser justo, o mito da idade de ouro do Islã
tem um ponto de partida parcialmente válido: houve momentos no passado em que
as sociedades muçulmanas atingiram níveis mais altos de civilização e cultura
do que em outros momentos. Houve momentos em que algumas terras muçulmanas eram
adequadas para um homem cultivado morar. Bagdá sob Harun ar-Rashid (apesar de
suas bem documentadas probabilidades de matar cristãos e odiar judeus), ou
Cordova muito brevemente sob Abd ar-Rahman no século X. Esses episódios
isolados, nem longos nem típicos, são infinitamente invocados pelos apologistas
e admiradores ocidentais do Islã.
[...]
Essa era foi marcada por, entre outras coisas,
conquistas intelectuais. Vários pensadores e cientistas medievais que vivem sob
o domínio islâmico, de modo algum todos eles ‘muçulmanos’ nominalmente ou
substancialmente, desempenharam um papel útil de transmitir aos ocidentais
frutos gregos, hindus e outros frutos do conhecimento pré-islâmico. Eles
contribuíram para tornar Aristóteles conhecido na Europa cristã. Mas, ao fazer
isso, estavam transmitindo o que eles mesmos haviam recebido de fontes não
muçulmanas.
[...] o padrão que vemos repetidas vezes: os
melhores muçulmanos, julgados por realizações intelectuais ou políticas, são
geralmente os menos muçulmanos.
[...] Mas quando os pensadores foram longe demais
em sua livre investigação sobre os segredos da natureza, prestando pouca
atenção à autoridade do Alcorão, despertaram suspeitas dos governantes no norte
da África e na Espanha, bem como no Oriente. Perseguição, exílio.
[...] Do
outro lado do Império, na Espanha, Averroës exerceu muita influência sobre
pensadores judeus e cristãos com suas interpretações de Aristóteles. Embora
fielmente fiel ao método de Aristóteles, ele encontrou o ‘principal motor’
aristotélico em Allah, a Primeira Causa universal. Seus escritos o levaram a
desfavor político, e ele foi banido até pouco antes de sua morte, enquanto
muitas de suas obras em lógica e metafísica haviam sido entregues às chamas.
[...] O problema de transformar essa lista de
realizações intelectuais em uma era de ouro ‘islâmica’ convincente é que, o que
quer que tenha florescido, o fez não por causa do Islã, mas apesar do Islã. Os
muçulmanos invadiram as sociedades (persas, gregas, egípcias, bizantinas,
sírias e judias) que possuíam sofisticação intelectual por direito próprio e
falharam em destruir completamente suas culturas. Dar o crédito pelo que os
remanescentes dessas culturas alcançaram é como creditar o Exército Vermelho
pela sobrevivência de Chopin em Varsóvia em 1970! O Islã em si nunca encorajou
a ciência, no sentido de uma investigação desinteressada, porque o único
conhecimento que ele aceita é o conhecimento religioso.
Como Bernard Lewis explica em seu livro O que deu
errado? o império muçulmano herdou ‘o conhecimento e as habilidades do antigo
Oriente Médio, da Grécia e da Pérsia; acrescentou-lhes inovações novas e
importantes de fora, como a fabricação de papel da China e a numeração
posicional decimal da Índia’. Os números decimais foram assim transmitidos para
o Ocidente, onde ainda são erroneamente conhecidos como números 'árabes',
honrando não seus inventores, mas seus transmissores.
Além disso, as realizações intelectuais da ‘era de
ouro’ do Islã eram de valor limitado. Havia muita especulação e pouca
aplicação, seja em tecnologia ou política.”
Régine Pernoud, Historiadora e Ph.D em Letras na
Ècole Nationale des Chartes, que trabalhou durante décadas como arquivista,
chafurdando antigos documentos empoeirados da idade medieval, atesta o
seguinte:
“Esquecemos frequentemente estes pormenores quando
se trata das traduções de Aristóteles, que os filósofos árabes fizeram, em
seguida, na Espanha; jamais teriam podido empreender semelhante empreendimento
em Sevilha, como houvessem encontrado aí as bibliotecas que haviam conservado
as obras de Aristóteles, e isto bem antes da invasão, ou seja, para a Espanha,
antes do século VIII. A ciência e o pensamento árabes não fizeram mais do que
aprofundar-se nas fontes preexistentes, a dos manuscritos que permitiram este
conhecimento de Aristóteles e de outros escritores antigos. Seria um verdadeiro
absurdo supor o contrário, como, aliás, se fez. A culpa é dos nossos livros
escolares que mencionam Avicena e Averróis, mas passam completamente por cima
de Isidoro de Sevilha. Jacques Fontaine chamou atenção sobre o fato de que, em
arquitetura, o arco otomano, que se atribui geralmente aos árabes, existia há
mais de cem anos antes de sua eclosão nesta Espanha ‘visigótica’, que ele tão bem
estudou.” P.
50.
PERNOUD, Régine. Idade Média: O Que Não Nos Ensinaram. São Paulo: Linotipo Digital, 2016. (PDF).
Houve realizações importantes de fato, nas antigas
cidades islâmicas do medievo, mas elas ficaram para trás. Os países muçulmanos
atuais estão em péssimas condições no quesito educação, tecnologia e ciência.
Os países ricos e modernos dos Emirados Árabes e a própria Arábia Saudita
dependem quase que exclusivamente da importação de tecnologia e ciência do
“satânico” ocidente judaico-cristão.
Asad Q. Ahmed, Ph.D em História Islâmica na
Universidade de Princeton, nos revela a seguinte situação:
“[...] o estado da ciência e das disciplinas
racionalistas no mundo muçulmano contemporâneo é geralmente lamentável e que é
um desiderato da máxima urgência que a situação seja remediada.”
Bernard Lewis, Professor de História na
Universidade de Princeton, diz que:
“Na Arábia Saudita, as universidades surgiram mais
tarde, e em pequeno número. Atualmente, para uma população estimada em 21
milhões, há oito universidades – uma a mais que as sete instituições de ensino
superior criadas pelos palestinos desde a ocupação dos territórios por Israel
em 1967. ” P.
67.
"Segundo todos os indicadores das Nações
Unidas, do Banco Mundial e de outras autoridades, os países árabes – em
questões como geração de empregos, educação, tecnologia e produtividade –
estão ficando cada vez mais para trás do Ocidente." P. 110.
Na página 112, Lewis traz estes dados:
LEWIS, Bernard. A Crise do Islã: Guerra Santa e Terror
Profano. Rio
de Janeiro: Zahar, 2004.
Paul Balta, que dirigente do Centro de Estudos
Orientais Contemporâneos na Universidade de Sorbonne, na França,
reconhece:
"Um dos mais graves problemas que continuam a
se impor em grande parte dos países muçulmanos é o do ensino inspirado pelo
método corânico e fundamentado em sua aprendizagem decorada. Unicamente nos
países árabes, em 2005, cerca de 50% das mulheres e 30% dos homens eram
analfabetos. Um relatório da Organização da Liga Árabe para a Educação, Cultura
e Ciências (ALECSO), estabelecida no final da década de 1990, afirma que ‘os
programas educacionais, em vários casos, não correspondem nem às necessidades
da sociedade árabe, nem às exigências de seu desenvolvimento. De maneira
semelhante, não conduzem à formação do espírito crítico, científico e
democrático’.
A partir de então, a situação não melhorou em nada.
O segundo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)
sobre o mundo árabe toca as trombetas de alarme. Redigido por intelectuais
árabes e publicado em 2004, ele salienta a existência de ‘grandes deficiências’
e apresenta uma longa lista de atrasos, principalmente os seguintes: acumulação
de conhecimentos medíocres, fraqueza da capacidade de análise, falta de
espírito criativo e de abertura para o mundo, ausência de pesquisas
fundamentais. Recomenda, portanto, que se restabeleçam os liames com o espírito
da ‘idade de ouro’ [que não existiu] do islamismo para se reencontrar a
modernidade perdida.” P. 31-32.
BALTA, Paul. Islã: Uma Breve Introdução. Porto Alegre/RS: L&PM Editores, 2010. (PDF).
Gottfried Brakemeier, Ph.D em Teologia na
Universidade de Gotinga, Alemanha, que devota grande reconhecimento ao legado
islâmico, escreve que:
"[...] a ciência muçulmana
estagnou. Atualmente, a relação entre ciência e religião islâmica parece
carecer de nova definição. Há quem diga que ‘o islã e a ciência continuam a ser
zonas de discursos separados e não sobrepostos para a maioria dos muçulmanos,
mesmo para os cientistas muçulmanos”. P. 14.
BRAKEMEIER, Gottfried. Ciência ou Religião: Quem Vai Conduzir a
História? São
Leopoldo: Sinodal, 2006.
Muçulmanos mais sofisticados dizem que o mito é
criação dos orientalistas do século 18-19, para justificar o imperialismo
europeu, e que muitos muçulmanos compraram essa ideia errônea, visto que nunca
houve declínio algum da civilização islâmica.
Entretanto, há de convirmos que as sociedades
islâmicas dos últimos séculos estão muito longe do que elas foram na idade
medieval, que produziu escritos importantes e relevantes, mesmo que os seus
avanços tenham sido apesar do islã, e não por causa dele. E que tais avanços
por mais interessantes e pertinentes que fossem, passam longe de evidenciar uma
“idade de ouro”.
Não preciso nem falar da questão da tolerância religiosa, que no máximo aceitava a existência do outro, mas não a sua legitimidade, descambando muitas vezes em cruéis atos de perseguição e mortes. O que não era nada fora do padrão estabelecido por Maomé e seus primeiros seguidores.