domingo, 11 de outubro de 2015

Pierre Fatumbi Verger: Um Mensageiro Entre Dois Mundos


Pierre Fatumbi Verger foi um Escritor, Fotográfo, Antropólogo e Etnólogo francês que pesquisou exaustivamente a mitologia dos orixás, trazidos pelos africanos, quando estes foram coagidos a virem para o Brasil para trabalharem como escravos por aqui.

Verger antes de chegar à cidade de Salvador, viajou o mundo inteiro, pesquisando e fotografando as diversas culturas do Oriente ao Ocidente. Em 1946 finalmente chega à Bahia, lugar que o encantou logo de cara. Para ele, Salvador possuía um mistério e um encanto que os outros lugares pelos quais tinha passado e conhecido não tinham.

E foi com a ritualística do candomblé que ele se identificou e mergulhou profundamente nos seus mitos e histórias/estórias, iniciando a sua vivência e “conversão” a religião, pela ialorixá mãe Senhora, umas das mães de santo mais conhecidas e respeitadas de Salvador, tanto é, que mãe Stella de oxóssi, talvez a mãe de santo mais prestigiada da Bahia atualmente, foi discípula e substituta dela.

A “conversão” de Verger foi tão intensa que a pedido de mãe Senhora, ele teve que ir a fonte da religiosidade do candomblé, na África, mais precisamente no Benin, onde antigamente era o reino do Daomé. Ele passou 17 anos vivenciando no dia a dia a vida e a mística daqueles que dizem guardar todos os mistérios do mundo de xangô e dos outros orixás. Verger cumpriu todos os rituais humildemente, o que lhe rendeu praticamente todas, ou quase todas as honrarias possíveis que o culto aos orixás, voduns, eguns podem oferecer a uma pessoa.

Fotografou, escreveu, pesquisou de forma despretensiosa tudo que viu, deixando-nos um rico acervo histórico-antropológico sobre a transcedentalidade e imanência dos deuses africanos. Muitos livros foram escritos e que hoje são referência obrigatória a quem deseja estudar a religiosidade africana tanto aqui, no Brasil, como em sua origem, na África. Uma riqueza literária sem igual.

Até aí, tudo bem, uma história interessante de um branco europeu que deixa a sua cultura francesa judaico-cristã, imersa no racionalismo iluminista, para abraçar com o coração e alma as raízes religiosas africanas tão discriminadas e oprimidas pelo povo do velho continente.

No entanto, o documentário nos brinda com uma IRONIA inesperada! Deitado confortavelmente em minha cama, dei um pinote e uma gargalha demoníaca, voltando o vídeo alguns segundos, pois precisava ver e ouvir de novo, para ter certeza de que não tinha entendido errado.

O Verger apesar de ter devotado toda a sua vida ao candomblé, desde que chegou a Salvador, em entrevista ao Gilberto Gil, diz CLARAMENTE que não ACREDITA na REALIDADE ontológica dos orixás! Que belo BANHO DE ÁGUA FRIA nos candomblecistas!

Um dos Antropólogos entrevistado diz:

“O Verger tinha a relação ritual com o Candomblé, ele cumpria todas aquelas coisas: as obrigações, os gestos e etc. Mas uma crença em última análise, não.

Até mesmo, mãe Stella, substituta de mãe Senhora, que foi a sacerdotisa espiritual dele, numa resposta confusa, diz ao Gil, que o Verger acreditava em partes no orixá.

E para que não fique dúvidas quanto a incredulidade do Verger, deixemos que ele mesmo fale.

Gilberto Gil pergunta:

"E o transe, a incorporação do orixá?"

Resposta do Verger:

"Para mim não é incorporação. Para mim é uma manifestação da verdadeira natureza da gente. Uma possibilidade de esquecer todas as coisas, que não tem nada que ver com você. [...] sou um idiota de francês racionalista. A mim não me contam histórias, eu não sou um idiota que acredita nessas coisas. [nesse momento, risadas do Gil]. É uma coisa “despoetizante” horrível. Eu sofri muito, gostaria muito de me deixar ir."

Que bomba para os fieis do Candomblé que tanto lhe admiram! Visto que por mais que ele ame e tenha dirigido praticamente toda a sua vida ao culto dessas divindades africanas, não crê na realidade espiritual dos transes que ocorrem nos terreiros. Não é que ele não acredita na veracidade do transe. Este realmente existe, mas para o Verger, tomando emprestada as palavras do Gothchalk "essas manifestações de aparência estranha não obedecem ‘a forças do além, mas do aquém’." [1]

Seu racionalismo francês não lhes deixa ser tão crédulo assim. O seu ceticismo despoja/desnuda/desmente, ou seja, despoetiza a poesia/realidade da religião africana. E isso, num certo sentido é horrível para ele, que sofreu muito, pois gostaria muito de se deixar ir, como seus irmãos brasileiros e africanos. Contudo, sua consciência está presa a “idiotice” do racionalismo, pois como mesmo diz: "eu não sou um idiota que acredita nessas coisas."

Pierre Fatumbi Verger foi realmente um mensageiro entre dois mundos, não apenas do Brasil & África, que é o sentido que o título do vídeo lhe atribui, mas também do mundo do misticismo e do racionalismo, que nega totalmente a realidade metafísica do primeiro. Em última análise, ele estava com o último. Ele passeou harmoniosamente entre esses dois mundos, encantando-se com a poesia e experiência "espiritual" do candomblé, sem deixar de lembrar que no final das contas, não há de fato, patavina nenhuma de orixás, que exista independente da mente daqueles que lhes atribuem importância e realidade. Somente um delírio confortante que os ajuda a viver e vencer as barreiras que a vida naturalmente impõe.

Não posso deixar de notar uma questão bem incômoda para os adeptos do Candomblé que tem a figura do Verger em tão alta estima. O cara simplesmente não acreditava que existia na realidade um panteão de orixás com nomes de xangô, exu, iemanjá... O que um adepto do Candomblé tem a dizer sobre isso? Seria a mesma coisa de um pastor ou um padre conhecido, íntegro e respeitado por todos os cristãos, dizer:

"Eu não acredito na bíblia e nem na ressurreição de Jesus. Até gosto dos rituais da igreja e os cumpro com muito amor e respeito, mas 'eu não sou um idiota que acredita nessas coisas'."

Estranho, não? O que os africanos do Benin, lugar onde ele se consagrou a babalaô, achariam se soubessem que aquele homem branco europeu que eles ajudaram a crescer no mundo mágico de seus orixás, na verdade vê tudo isso, apenas como uma manifestação psicológica produzida pelo cérebro e não como uma incorporação verdadeira vinda de fora, como eles tão devotamente creem? 

Até onde sei, até mesmo o Gilberto Gil, apresentador do documentário, o próprio Jorge Amado que é entrevistado, são céticos em relação à sobrenaturalidade das manifestações nos terreiros. Eles defendem e admiram a cultura religiosa africana, mas apenas por esta fazer parte da identidade de um povo e, não por sua correspondência verdadeira com um suposto mundo espiritual, até porque, se não me engano, eles são ateus. E talvez até o Verger também o seja.

Parabéns ao Gil, aos produtores e a mãe Stella por não omitirem essa informação polêmica e incômoda sobre ele. E é claro, ao próprio Verger. Um dia depois dessa entrevista, realizada em 1996, ele partiu - morreu. Será que foi para as terras de aruanda (na verdade, nem lembro o que o candomblé tem a dizer sobre o pós-morte)? Será que se encontrou com xangô, seu orixá? Com certeza não.

REFERÊNCIAS

GOTHCHALK, Carlos Humberto Mendes. Aprendendo a lidar com fenômenos incomuns. São Leopoldo: Sinodal, 2005. P. 39.

Debate: A Ciência Refuta Deus?


Um acalorado debate realizado em dezembro de 2012, sobre o poder da Ciência em refutar, ou tornar desnecessária a existência de Deus em explicar o Universo, a Vida, a Moralidade, o Sentido e Propósito de tudo que vemos ao nosso redor. 

Do lado afirmativo temos o Físico da Universidade do Arizona, Lawrence Kraus, e o Colunista da prestigiada revista Scientific American, Michael Shermer. Do lado negativo da proposta, temos o ex-Pesquisador do Hoover Institution na Universidade de Stanford, Dinesh D’ Souza, e o Professor de Ciências e Engenharia Nuclear do MIT, Ian Hutchinson.

Não achei o nível do debate muito bom. Ambos os lados não tiveram a perspicácia esperada. Por exemplo, Laurence kraus começa sua fala ridicularizando o lado oposto, como se isso fosse argumento. Ian Hutchinson carece da eloquência necessária para defender com inteligência o porquê da “Ciência [não] refutar Deus”, embora diga muitas coisas aproveitáveis e verossímeis. Michael Shermer vem com teorias inverificáveis de como a religião e crença nos deuses ou Deus surgiu, para assim, desqualificar as religiões. Dinesh D’ Souza foi o melhorzinho na argumentação, mas também senti que poderia ter sido mais mordaz em suas críticas ao cientificismo. 

O Filósofo Willian Lane Craig com todo o seu arsenal filosófico certeiro fez muita falta nesse debate. Poderia colocar também o Jornalista David Quinn, que deu uma surra de urtiga grande no Richard Dawkins. 

Mesmo que os teístas não tenham se saído tão bem, vejo o quanto é pobre a abordagem ateísta. Uma leitura de poucos livros pró-teísmo derruba fácil, fácil as proposições materialistas expostas nesse debate. Bem disse o Hutchinson num certo momento do debate:

Quer dizer, o que teve a Ciência moderna em primeiro lugar, foi à crença na fidelidade de Deus. De um Criador que fez uma criação racional. E um bom argumento que pode ser feito que a razão pela qual a Ciência como a conhecemos, a Ciência moderna, cresceu no ocidente, foi, em parte, porque o Cristianismo, em seus pontos de vista filosóficos e teológicos, incluindo a crença na fidelidade de Deus, serviu como uma espécie de ambiente hospitaleiro em que a Ciência pudesse crescer. Então na verdade, não é o caso em que os cientistas na história, tiveram de dizer a si mesmos: ‘Eu vou me tornar um ateu quando eu entrar no laboratório’. Muitos deles foram para o laboratório precisamente porque não eram ateus.