GONZÁLEZ. Justo. Desafios do século 21 para o
pensamento cristão: esboços teológicos. São Paulo: Hagnos, 2014.
Justo Gonzáles, Ph.D e Mestre em Teologia Histórica pela Universidade de Yale, continua sendo um dos Teólogos e Historiadores do
Cristianismo, que mais admiro e prezo. Na presente obra, temos alguns esboços
de temas de suma importância não apenas para a igreja, mas para a sociedade
global. González se destaca pela facilidade com que passeia pela história, para
adentrar nos assuntos propriamente ditos.
Qual a postura que a igreja
cristã deve tomar frente aos problemas que acometem o nosso conturbado século
XXI? Quais atitudes ela deve ter perante as questões ecológicas, econômicas,
culturais e etc.? Olhando para os seus primórdios e extraindo das escrituras
princípios que possam nortear a conduta da mesma.
No desafio imposto pela ecologia,
dois fatos curiosos nos são trazidos. Devido à influência do platonismo na
igreja, a partir do século II, houve durante vários séculos da história do
cristianismo, um certo desprezo pelas coisas terrenas. O olhar sobre o mundo
era sempre com as lentes platônicas. O espiritual era tido como mais importante
que as coisas sensíveis. Estas podiam ser relegadas a segundo ou terceiro
plano. Dois Teólogos proeminentes da igreja destacam-se pelo desdém ao mundo
natural.
“[...] o próprio
Agostinho mostra-se muito dolorido e arrependido porque em certa ocasião se
ativera por uns minutos a observar a conduta de uma lagartixa, quando na
realidade deveria ter se ocupado das verdades eternas. Séculos mais tarde,
Anselmo de Canterbury declarou que, porquanto o ser humano foi feito para
contemplação de Deus, se por apenas um instante afasta sua vista do Eterno, a
fim de contemplar em seu lugar o mais formoso dos astros, não poderá em toda a
eternidade pagar por tal pecado.” P. 26-27.
Parece piada isso, não é? Esses
dois foram muito inteligentes em várias abstrações filosóficas, mas só uma
pessoa com o parafuso solto levaria a sério hoje em dia, esse tipo de conduta
que ambos pareciam levar. Com esse tipo de pensamento, nenhuma sociedade
avançaria na técnica e na ciência. O cara virar cristão para depois ficar com o
peso na consciência por observar os movimentos de uma lagartixa, é de lascar.
Se bem que Agostinho era meio lélé da cuca mesmo. Anselmo também não fica atrás
na paranoia.
González propõe uma volta ao
livro de Gênesis para a fundamentação de uma teologia ecológica. O primeiro
livro da Bíblia fala-nos sobre a criação do homem/mulher e do restante da
criação. Nada melhor do que extrair dos primeiros capítulos de Gênesis, uma práxis
ecológica não baseada na exploração descarada da natureza, mas de respeito pela
mesma. Ele reconhece que os cristãos em muitos momentos não tiveram o devido respeito
pelo mundo natural, explorando-o sem responsabilidade, ou fazendo vista grossa
aos desmandos contra a natureza. Portanto, cabe a igreja arrepender-se.
Na relação entre pensamento
cristão e economia, González defende no capítulo 2, que a comunhão de bens da
igreja primitiva não foram os casos isolados registrados no livro de Atos 2 e
4. Usando documentos cristãos dos séculos II e III, as evidências nos indicam
que os primeiros cristãos, pelo menos em teoria estavam dispostos a ajudar
aqueles que estavam necessitados entre as suas diversas comunidades de fieis.
É enfatizado que as contribuições
eram voluntárias, o que está muito longe de ser o que é praticado há muitos
anos nas mais variadas igrejas, onde a coerção psicológica e espiritual
acompanham os pedidos de dinheiro de forma descarada e sem pudor algum.
“Se avançarmos ao final
do século 2 e início do século 3, veremos Tertuliano [um dos líderes da igreja]
declarando que as ofertas dos cristãos são voluntárias: ‘Em certo dia do mês,
se assim o desejar, cada um faz uma pequena doação, mas somente se desejar e se
puder, porque não há obrigação, mas tudo é voluntário’.” P. 79.
Há uma ressalva aí: os ricos
tinham obrigação de ajudar aos irmãos pobres. Mas o que ocorre nos dias
hodiernos é a cobrança indevida de dinheiro dos mais lascados financeiramente.
No capítulo 3 é abordada a catolicidade
da igreja. González conhecido por seu ecumenismo conclama as várias as
comunidades e tradições cristãs a não olharem para as suas perspectivas
teológicas e espirituais, como as únicas dignas de crédito e de fidelidade ao
evangelho. Assim como as escrituras possuem 4 evangelhos distintos e de
múltiplas visões sobre os acontecimentos sobre a vida de Jesus Cristo, mas
mesmo assim, eles se complementam e se enriquecem mutuamente. De modo
semelhante, as inúmeras igrejas devem ter um olhar de humildade e reconhecer
nas outras comunidades de fé, que estas também representam o evangelho de
Jesus. Não proceder assim é ser sectário e herege.
No próximo capítulo o foco é a
relação entre as várias culturas (“povos, nações e línguas”, tomando
emprestadas as palavras de João no Apocalipse), lembrando que nenhuma cultura
ou povo é superior a outro, e, que o ocidente (cristão) provou-se não mais
cristão que as outras regiões do planeta.
“Hoje sabemos,
principalmente depois de duas bombas atômicas e uma longa história de
exploração e opressão, que a cultura ocidental não é necessariamente mais
cristã que as demais”.
P. 135.
Todas as culturas têm o seu lado
positivo, não deixando de lado os seus aspectos negativos. O pensamento cristão
deve ser multicultural; que a igreja não caia no erro de impor os seus costumes
culturais aos povos aos quais pretende levar a mensagem de Jesus. Chegamos mais
uma vez, na catolicidade do pensamento cristão, onde o etnocentrismo não tem
lugar, visto que nenhuma cultura expressa melhor que a outra a vontade de Deus.
O livro possui mais três
capítulos... Neles entra em cena o González pastor/pregador/evangelista; o
homem de fé, que apesar de toda a sua erudição, acredita piamente que todos os
problemas que assolam o nosso mundo um dia irão acabar, visto que Deus em
Cristo na consumação de todas as coisas, a tudo restaurará.
Outro livro do González resumido, pode ser visto nesse aqui: