domingo, 6 de junho de 2021

A Ciência Pode Explicar Tudo?


LENNOX, John. A Ciência Pode Explicar Tudo? São Paulo: Vida Nova, 2021.

O veinho John Lennox é um Matemático e Filósofo da universidade de Oxford, que vem se destacando nos últimos anos no Brasil, com os seus argumentos em favor do teísmo, através de livros, vídeos e por cauda do seu conhecido debate com o seu colega de Oxford, o Biólogo Richard Dawkins, onde fica notório que o Lennox se saiu bem melhor na exposição das ideias. Li dois de seus livros, dentre eles Porque a Ciência Não Consegue Enterrar Deus, que achei bastante persuasivo. Li também Cristianismo: Ópio do Povo?, livro mais simples, em coautoria com o seu amigo David Gooding. Agora, li este. Livro pequeno, simples, mas não menos interessante e persuasivo em muitos momentos.

Lennox é um teísta cristão desde muito jovem, entrando na academia universitária como cristão e permanecendo inabalável e irredutível nesta posição até hoje. Mas ele relata que logo nos primeiros anos, foi pressionado a abandonar suas convicções teístas, visto que se assim não fizesse, não progrediria no meio acadêmico. A história mostrou que o seu interlocutor estava redondamente enganado. Lennox é um respeitado acadêmico em sua área de atuação (Filosofia da Ciência e Matemática), e coleciona uma série de debates com estudiosos que estão na elite do pensamento ateu, como o já mencionado Richard Dawkins, como também o Eticista Peter Singer, o Jornalista Christopher Hitchens, ao qual Lennox o chama de pensador cuidadoso e ponderado, dentre outras personalidades do ceticismo ateu.  

“[Há] um lado sombrio da academia. Há alguns cientistas que se apresentam com ideias preconcebidas, e que não querem realmente debater as evidências e parecem determinados a não buscar a verdade. Eles estão interessados em propagar as noções de que a ciência e Deus são incompatíveis e de que as pessoas que acreditam em Deus são simplesmente ignorantes. Isso, obviamente, não é verdade.” P. 24-25.

A propaganda de que Ciência e Religião estão em pé de guerra não para na boca dos ignorantes em história. No entanto, Colin A. Russel, Ph.D em História e Filosofia da Ciência na Universidade de Londres, é citado dizendo estas palavras:

“A crença comum de que [...] o verdadeiro relacionamento entre religião e ciência nos últimos séculos tem sido marcado por hostilidade profunda e duradoura [...] não apenas é historicamente incorreta, mas, na verdade, trata-se de uma caricatura tão grotesca que o que realmente precisa ser explicado é como ela pode ter alcançado qualquer grau de respeitabilidade.” P. 34.

Quem não conhece a célebre frase de Carl Sagan e repetida pelo seu substituto Neil DeGrasse Tyson na série Cosmos?

“No início de sua conhecida série da televisão, Cosmos, o astrônomo e cosmólogo americano Carl Sagan afirmou: ‘O cosmo é tudo o que existe, já existiu e sempre existirá’. Essa não é uma afirmação da ciência; não deve ser colocada na mesma categoria, por exemplo, da afirmação científica de que a gravidade obedece à lei do inverso do quadrado. A afirmação de Sagan é simplesmente uma expressão de sua crença ateísta. O problema é que muitas pessoas dão a todas as afirmações de cientistas a autoridade devida apropriadamente à ciência, simplesmente porque foram feitas por um cientista.” P. 35-36.

Esse tipo de idolatria deve acontecer muito com o falecido e renomado Físico Stephen Hawking, que em seu último livro, escreveu que o universo surgiu do nada. Lennox não deixa passar essa contradição. 

“Stephen Hawking afirmava que Deus não é necessário para explicar por que o universo existe, em primeiro lugar – por que existe algo em vez de nada. Ele acreditava que a ciência poderia fornecer a reposta. Escreve assim: ‘Uma vez que há uma lei a da gravidade, o universo pode criar-se e se criará a partir do nada.’

Essa afirmação parece científica, e certamente foi escrita por um cientista. Contudo, além de não ser científica, não é nem mesmo racional, como um pouco de lógica rudimentar demonstrará.

A afirmação de Hawking é autocontraditória: ‘Uma vez que há uma lei como a da gravidade’ – ou seja, visto que há alguma coisa – ‘o universo [...] se criará a partir do nada’. Hawking assume que a lei da gravidade existe. Ela não pode ser considerada nada, logo, ele é culpado dessa contradição flagrante.

Observe cuidadosamente o que Hawking afirma: ‘Uma vez que há uma lei como a da gravidade...’. Quando li isso pela primeira vez, pensei: ‘Com certeza ele quis dizer: ‘Uma vez que há a gravidade...’ Pois, o que uma lei da gravidade significaria se não houvesse gravidade para ela descrever? Além disso, não é só os cientistas que não criaram o universo; a ciência e as leis da física matemática também não o fizeram. Ainda assim, Hawking parece pensar que poderiam, muito bem, tê-lo feito.

[...]

A ideia [...] de leis físicas trazendo o universo à existência poder parecer fascinante, mas, na realidade, não faz sentido algum. [...] a lei da gravidade de Newton não explica a gravidade. Além do mais, ela certamente não cria a gravidade. Na verdade, as leis da física não são apenas incapazes de criar qualquer coisa; elas também não podem ser a causa de qualquer coisa.” P. 49-50, 51.

Continuando...

“Por fim, a afirmação de Hawking de que ‘o universo pode criar-se e se criará a partir do nada’ não faz sentido. Se eu digo, que ‘X cria Y’, isso pressupõe à existência de X em um primeiro momento, para trazer Y à existência. Se eu digo que ‘X cria X’, pressuponho a existência de X para explicar a existência de X. Pressupor a existência do universo para explicar sua existência é logicamente incoerente.” P. 53.

Lennox toca num ponto, que sempre me chamou muita atenção: a incompatibilidade entre racionalidade e ateísmo, no sentido de que este diz que as nossas capacidades de raciocinar surgiram do caos irracional. O universo resulta da aleatoriedade/acaso/irracionalidade, segundo os ateus. Então como podemos confiar em nosso raciocínio? Que justificativas epistêmicas o ateu tem para poder dar credibilidade ao que ele pensa sobre o mundo? Se tudo foi gerado pela irracionalidade, porque o ateísmo seria superior aos demais pensamentos que ele julga serem irracionais, quando a sua própria cosmovisão recai na mesma categoria, visto que ela também foi gestada no mesmo mundo que é efeito da absurdidade e ilogicidade? Mas todos, crentes e descrentes, acreditam que podem apreender algo verdadeiro e confiável sobre o mundo que os cerca. Mas parece que o ateu não tem como justificar adequadamente isso.

“Meu professor de mecânica quântica em Cambridge, o catedrático Sir John Polkinghorne, escreveu: ‘A ciência não explica a inteligibilidade matemática do mundo físico, pois é parte da [observe o uso explícito da palavra] fundacional da ciência que isso seja assim...’ pelo simples motivo de que não podemos começar a nos envolver na física sem acreditar em sua inteligibilidade.

Sobre qual evidência, portanto, os cientistas baseiam sua fé fé na inteligibilidade racional do universo, que os permite fazer ciência? O primeiro ponto a ser observado é que a razão humana não criou o universo. Esse ponto é tão óbvio que, à primeira vista, pode parecer trivial; mas é, na realidade, de fundamental importância quando nos propomos a testar a validade de nossas capacidades cognitivas. Além de não termos criado o universo, não criamos nossa própria capacidade de raciocinar. Podemos desenvolver nossas faculdades racionais pelo uso, mas não as originamos. Como é possível, então, que o que se passa em nossa minúscula cabeça possa fornecer algo que se aproxime de uma verdadeira explicação da realidade? Como é possível que uma equação matemática desenvolvida na mente de um matemático possa corresponder ao funcionamento do universo?

[...]

Às vezes, em conversas com meus companheiros cientistas, pergunto a eles:

- Com o que você faz ciência?

- Com a minha mente – dizem alguns; e outros que sustentam a opinião de que a mente é o cérebro dizem:

- Com meu cérebro.

- Fale-me sobre seu cérebro. Como ele surgiu?

- Por meio de processos naturais, irracionais e não guiados.

 - Por que, então, você confia neles? – pergunto. Se você acreditasse que seu computador fosse o resultado final de processos irracionais e não guiados, você confiaria nele?

- Nem por um segundo – vem a resposta.

- Obviamente você tem um problema, então.” P. 61, 62.

John Gray, ateu e Professor de Filosofia na Universidade de Oxford, reconhece:

“O humanismo moderno é a fé de que pela ciência a humanidade pode conhecer a verdade – e assim ser livre. Porém, se a teoria da seleção natural de Darwin for verdadeira, isso se torna impossível. A mente humana está a serviço do êxito evolutivo, e não da verdade.” P. 63. [1]

Lennox nos seis últimos capítulos se volta mais especificamente para o Cristianismo, argumentando que a Bíblia é confiável, apelando para vários argumentos, como a defesa da ressurreição de Jesus, a confiabilidade histórica do Novo testamento, a preservação da sua mensagem original, apesar de dois mil anos de existência, etc.

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[1] Vários Cientistas e Filósofos creem que a teoria da evolução é compatível com a existência de Deus. Deus iniciando o processo evolutivo, este geraria não apenas a sobrevivência, mas uma racionalidade confiável. Se o processo evolutivo for apenas gestado pela cegueira do acaso, não há como justificar racionalidade alguma.