SNYDER, Timothy. Sobre
a Tirania: Vinte Lições do Século XX Para o Presente. São Paulo: Companhia das
Letras, 2017. (PDF).
“A história tem o poder de familiarizar e também de
advertir”. P. 06.
Timothy Snyder (Professor
de História na Universidade de Yale), temendo o avanço de forças
antidemocráticas em seu país (EUA), escreveu este livro, para alertar seus
leitores contra a tirania política, que sempre está à espreita, sorrateiramente
pronta a tomar conta das instituições sociais, políticas e econômicas. Como diz
Snyder: “A não
história não se repete, mas ensina”. P. 06. Ele faz uso dos três
exemplos clássicos do século XXI (comunismo, fascismo e nazismo), conclamando a
todos a detectarem certas características destes regimes tirânicos,
totalitários e desumanos, que estão aí, sendo apologeticamente defendidos por
muitos indivíduos, partidos políticos, instituições paramilitares e etc.
Devemos contestar, refutar e lutar contra ideias e conceitos que firam o
processo democrático, pois as carcaças moribundas da tríade diabólica do século
passado ainda querem causar mais destruição.
"A história europeia do século XX nos mostra
que as sociedades podem ruir, que as democracias podem entrar em colapso, que a
ética pode ser aniquilada e que os homens comuns podem se ver diante de valas
comuns com armas nas mãos". P. 07.
A URSS querendo pôr os
seus planos em funcionamento, jogou a população camponesa mais pobre contra a
que tinha mais terras, resultando na plena submissão e destruição de ambas.
"Na União Soviética governada por Ióssif
Stálin, fazendeiros prósperos eram representados em cartazes de propaganda como
porcos — uma desumanização que, num ambiente rural, sugere claramente o assassinato.
Era o começo da década de 1930, quando o Estado soviético procurava dominar o
campo e arrancar da zona rural o capital necessário para uma rápida
industrialização. Os camponeses que eram donos de mais terras ou animais que
outros foram os primeiros a perder o que tinham. Um vizinho retratado como um
porco é uma pessoa de cuja terra você pode se apossar. No entanto, aqueles que
obedeciam à lógica simbólica também se tornaram vítimas. Depois de fazer com
que os camponeses mais pobres se voltassem contra os mais ricos, o poder
soviético apoderou-se da terra de todos para criar novas fazendas coletivas.
Uma vez completada, a coletivização levou grande parte do campesinato soviético
a passar fome. Entre 1930 e 1933, milhões de pessoas na Ucrânia soviética, no
Cazaquistão soviético e na Rússia soviética morreram de maneira horrível e
humilhante. Antes que o processo de coletivização chegasse ao fim, os cidadãos
soviéticos se alimentavam de cadáveres." P. 17.
Na oitava lição dada
por Snyder, devemos nos destacar, e não sermos passivos diante do mal que se
aproxima. Churchill é o seu exemplo:
“Adolf Hitler não demonstrava nenhuma animosidade especial
em relação à Grã-Bretanha ou ao seu império, e na verdade imaginava uma divisão
do mundo em esferas de interesses. Esperava que Churchill aceitasse uma
composição depois da queda da França. Não foi o que Churchill fez. Ele disse
aos franceses: ‘não importa o que vocês fizerem, vamos lutar sempre e para
sempre’. [...] Na verdade, foi o próprio primeiro-ministro que ajudou os
britânicos a se definirem como um povo altivo que resistiria com tranquilidade
ao mal. Outros políticos teriam buscado o apoio da opinião pública britânica
para pôr fim à guerra. Em vez disso, Churchill resistiu, inspirou e venceu.” P. 26.
Leiamos mais livros
(bons), nos cerquemos de boas informações e conhecimento, nos afastemos das frivolidades da TV e a da internet.
“Há mais de meio século, os romances clássicos
sobre o totalitarismo advertiram quanto à dominação das telas, à supressão dos
livros, ao estreitamento do vocabulário e às dificuldades subsequentes de
pensar. [...] Olhar para telas talvez possa ser inevitável, mas o mundo
bidimensional faz pouco sentido, a menos que possamos recorrer a um arsenal
mental formado em outro lugar. Quando repetimos as mesmas palavras e frases que
aparecem nos meios de comunicação diários, aceitamos a ausência de um quadro
referencial maior. Dispor desse quadro referencial exige mais conceitos, e ter
mais conceitos exige leitura. Por isso, afaste as telas de sua vida e cerque-se
de livros”. P. 30.
Sempre é um alento ler
Historiadores não mancomunados com o relativismo pós-moderno:
"Abandonar os fatos é abandonar a liberdade.
Se nada for verdadeiro, ninguém poderá criticar o poder, porque não haverá uma
base para fazê-lo. Se nada for verdadeiro, tudo é espetáculo. A carteira mais
recheada garante a pirotecnia mais ofuscante." P. 32.
“'O que é a verdade, afinal?' Às vezes as pessoas
fazem essa pergunta porque não querem fazer nada. Aderindo ao cinismo genérico
nos sentimos descolados e alternativos, mesmo quando afundamos com nossos
concidadãos num atoleiro de indiferença. É a sua capacidade de discernir fatos
que faz de você um indivíduo, da mesma forma que é a nossa confiança coletiva
num conhecimento comum que faz de nós uma sociedade." P. 36.
Nesses tempos de tanta
tensão política por todos lados, não é difícil vermos pessoas cegas pela
ideologia que professam, e por políticos e figuras públicas que endeusam. É um antigo
defeito humano, que Snyder exemplifica bem:
“Renunciar à diferença entre o que se quer ouvir e
o que de fato é verdadeiro é uma maneira de se submeter à tirania. Essa recusa
à realidade pode parecer natural e agradável, mas o resultado é o seu fim como
indivíduo — e, assim, o colapso de qualquer sistema político que dependa do
individualismo. [...] Doze anos mais tarde, após todas as atrocidades e no fim
de uma guerra que a Alemanha tinha claramente perdido, um soldado amputado
disse a Klemperer [Professor alemão] que Hitler ‘nunca disse uma só mentira. Eu
acredito em Hitler’. [...] Depois que a verdade se [torna] oracular, em vez de
factual, as evidências [são] irrelevantes. No fim da guerra, um trabalhador
declarou a Klemperer que ‘compreender é inútil, é preciso ter fé. Eu acredito
no Führer’.” P. 33.
Ah, o nosso mundo
facebookiano...
“Na eleição presidencial de 2016, o mundo
bidimensional da internet foi mais importante que o mundo tridimensional do
contato humano. Pessoas que iam de porta em porta para fazer pesquisas de
opinião ou angariar votos eram recebidas por cidadãos americanos espantados,
que se davam conta de que teriam de falar de política com um ser humano de
carne e osso, em vez de ver suas opiniões validadas por postagens no Facebook.
No mundo bidimensional da internet, surgiram novas coletividades, invisíveis à
luz do dia — tribos com diferentes visões do mundo, entregues a manipulações.
(E, sim, há uma conspiração que se pode encontrar on-line: a conspiração para
mantê-lo conectado, à procura de conspirações). P. 36.