quinta-feira, 17 de maio de 2018

Sobre a Tirania: Vinte Lições do Século XX Para o Presente



SNYDER, Timothy. Sobre a Tirania: Vinte Lições do Século XX Para o Presente. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. (PDF).

“A história tem o poder de familiarizar e também de advertir”. P. 06.

Timothy Snyder (Professor de História na Universidade de Yale), temendo o avanço de forças antidemocráticas em seu país (EUA), escreveu este livro, para alertar seus leitores contra a tirania política, que sempre está à espreita, sorrateiramente pronta a tomar conta das instituições sociais, políticas e econômicas. Como diz Snyder: “A não história não se repete, mas ensina”. P. 06. Ele faz uso dos três exemplos clássicos do século XXI (comunismo, fascismo e nazismo), conclamando a todos a detectarem certas características destes regimes tirânicos, totalitários e desumanos, que estão aí, sendo apologeticamente defendidos por muitos indivíduos, partidos políticos, instituições paramilitares e etc. Devemos contestar, refutar e lutar contra ideias e conceitos que firam o processo democrático, pois as carcaças moribundas da tríade diabólica do século passado ainda querem causar mais destruição.

"A história europeia do século XX nos mostra que as sociedades podem ruir, que as democracias podem entrar em colapso, que a ética pode ser aniquilada e que os homens comuns podem se ver diante de valas comuns com armas nas mãos". P. 07.

A URSS querendo pôr os seus planos em funcionamento, jogou a população camponesa mais pobre contra a que tinha mais terras, resultando na plena submissão e destruição de ambas.

"Na União Soviética governada por Ióssif Stálin, fazendeiros prósperos eram representados em cartazes de propaganda como porcos — uma desumanização que, num ambiente rural, sugere claramente o assassinato. Era o começo da década de 1930, quando o Estado soviético procurava dominar o campo e arrancar da zona rural o capital necessário para uma rápida industrialização. Os camponeses que eram donos de mais terras ou animais que outros foram os primeiros a perder o que tinham. Um vizinho retratado como um porco é uma pessoa de cuja terra você pode se apossar. No entanto, aqueles que obedeciam à lógica simbólica também se tornaram vítimas. Depois de fazer com que os camponeses mais pobres se voltassem contra os mais ricos, o poder soviético apoderou-se da terra de todos para criar novas fazendas coletivas. Uma vez completada, a coletivização levou grande parte do campesinato soviético a passar fome. Entre 1930 e 1933, milhões de pessoas na Ucrânia soviética, no Cazaquistão soviético e na Rússia soviética morreram de maneira horrível e humilhante. Antes que o processo de coletivização chegasse ao fim, os cidadãos soviéticos se alimentavam de cadáveres." P. 17.

Na oitava lição dada por Snyder, devemos nos destacar, e não sermos passivos diante do mal que se aproxima. Churchill é o seu exemplo:

“Adolf Hitler não demonstrava nenhuma animosidade especial em relação à Grã-Bretanha ou ao seu império, e na verdade imaginava uma divisão do mundo em esferas de interesses. Esperava que Churchill aceitasse uma composição depois da queda da França. Não foi o que Churchill fez. Ele disse aos franceses: ‘não importa o que vocês fizerem, vamos lutar sempre e para sempre’. [...] Na verdade, foi o próprio primeiro-ministro que ajudou os britânicos a se definirem como um povo altivo que resistiria com tranquilidade ao mal. Outros políticos teriam buscado o apoio da opinião pública britânica para pôr fim à guerra. Em vez disso, Churchill resistiu, inspirou e venceu.” P. 26.

Leiamos mais livros (bons), nos cerquemos de boas informações e conhecimento, nos afastemos das frivolidades da TV e a da internet.

“Há mais de meio século, os romances clássicos sobre o totalitarismo advertiram quanto à dominação das telas, à supressão dos livros, ao estreitamento do vocabulário e às dificuldades subsequentes de pensar. [...] Olhar para telas talvez possa ser inevitável, mas o mundo bidimensional faz pouco sentido, a menos que possamos recorrer a um arsenal mental formado em outro lugar. Quando repetimos as mesmas palavras e frases que aparecem nos meios de comunicação diários, aceitamos a ausência de um quadro referencial maior. Dispor desse quadro referencial exige mais conceitos, e ter mais conceitos exige leitura. Por isso, afaste as telas de sua vida e cerque-se de livros”. P. 30.

Sempre é um alento ler Historiadores não mancomunados com o relativismo pós-moderno:

"Abandonar os fatos é abandonar a liberdade. Se nada for verdadeiro, ninguém poderá criticar o poder, porque não haverá uma base para fazê-lo. Se nada for verdadeiro, tudo é espetáculo. A carteira mais recheada garante a pirotecnia mais ofuscante." P. 32.

“'O que é a verdade, afinal?' Às vezes as pessoas fazem essa pergunta porque não querem fazer nada. Aderindo ao cinismo genérico nos sentimos descolados e alternativos, mesmo quando afundamos com nossos concidadãos num atoleiro de indiferença. É a sua capacidade de discernir fatos que faz de você um indivíduo, da mesma forma que é a nossa confiança coletiva num conhecimento comum que faz de nós uma sociedade." P. 36.

Nesses tempos de tanta tensão política por todos lados, não é difícil vermos pessoas cegas pela ideologia que professam, e por políticos e figuras públicas que endeusam. É um antigo defeito humano, que Snyder exemplifica bem:

“Renunciar à diferença entre o que se quer ouvir e o que de fato é verdadeiro é uma maneira de se submeter à tirania. Essa recusa à realidade pode parecer natural e agradável, mas o resultado é o seu fim como indivíduo — e, assim, o colapso de qualquer sistema político que dependa do individualismo. [...] Doze anos mais tarde, após todas as atrocidades e no fim de uma guerra que a Alemanha tinha claramente perdido, um soldado amputado disse a Klemperer [Professor alemão] que Hitler ‘nunca disse uma só mentira. Eu acredito em Hitler’. [...] Depois que a verdade se [torna] oracular, em vez de factual, as evidências [são] irrelevantes. No fim da guerra, um trabalhador declarou a Klemperer que ‘compreender é inútil, é preciso ter fé. Eu acredito no Führer’.” P. 33.

Ah, o nosso mundo facebookiano...

“Na eleição presidencial de 2016, o mundo bidimensional da internet foi mais importante que o mundo tridimensional do contato humano. Pessoas que iam de porta em porta para fazer pesquisas de opinião ou angariar votos eram recebidas por cidadãos americanos espantados, que se davam conta de que teriam de falar de política com um ser humano de carne e osso, em vez de ver suas opiniões validadas por postagens no Facebook. No mundo bidimensional da internet, surgiram novas coletividades, invisíveis à luz do dia — tribos com diferentes visões do mundo, entregues a manipulações. (E, sim, há uma conspiração que se pode encontrar on-line: a conspiração para mantê-lo conectado, à procura de conspirações). P. 36.