quinta-feira, 28 de junho de 2018

As Coisas São Assim: Pequeno Repertório Científico do Mundo que nos Cerca



BROCKMAN, John; MATSON, Katinka (Orgs). As Coisas São Assim: Pequeno Repertório Científico do Mundo que nos Cerca. São Paulo: Cia das Letras, 1997. (PDF).

Cada capítulo foi escrito por um Cientista eminente em sua área de atuação. Um pouco de tudo: Evolução, Big Bang, Natureza do Tempo, Acaso, Origem da Vida... Um livro antigo, de mais de 20 anos, mas bastante pertinente nas questões que traz em suas páginas.

Richard Dawkins (Zoólogo da Universidade de Oxford, Inglaterra) escreve o primeiro capítulo, e como é a sua habitual maneira de ser, atacando as concepções religiosas que aí estão. Ele escreve:

"As pessoas acreditam em coisas simplesmente porque outras pessoas acreditaram nessas mesmas coisas ao longo dos séculos. Isso é tradição. O problema com a tradição é que, independentemente de há quanto tempo a história tenha sido inventada, ela continua exatamente tão verdadeira ou falsa quanto a história original. Se você inventar uma história que não seja verdadeira, transmiti-la através de vários séculos não vai torná-la verdadeira!" P. 21.

Paul Davies (Professor de Filosofia Natural na Universidade de Adelaide, Austrália) dá sua contribuição, falando sobre o que diabos causou o Big Bang. Ele pergunta:
               
“Afinal de contas, o que é que aconteceu antes do big bang? [...] poderia o universo inteiro simplesmente ‘pipocar’, ganhando existência num passe de mágica, sem nenhuma razão específica? Essa pergunta simples, feita por tantas crianças, tem ocupado o intelecto de gerações de filósofos, cientistas e teólogos. Muitos a evitaram, considerando-a um mistério impenetrável. Outros tentaram afastá-la usando certas definições. A maioria deles, só de pensar no assunto, acabou ficando terrivelmente confusa. O problema, no fundo, é o seguinte: se nada acontece sem uma causa, então alguma coisa deve ter levado o universo a surgir. E assim enfrentamos a inevitável pergunta sobre o que causou essa alguma coisa. E assim por diante, numa regressão infinita”. P. 28.

Não faz sentido perguntar o que havia antes da grande explosão, visto que tudo começa a partir dela.

“Se o big bang foi o começo do próprio tempo, então nenhuma discussão sobre o que aconteceu antes do big bang ou o que o causou — no sentido habitual de causação física — faz sentido. Infelizmente, muitas crianças, e adultos também, consideram essa resposta um pouco desonesta. Deve haver algo mais do que isso, contestam.” P. 29.

As partículas subatômicas com as suas aparições espontâneas do nada parecem um indicativo de que o universo surgiu também espontaneamente, segundo Davis.  

“É claro que há um grande salto entre o aparecimento espontâneo e sem causa de uma partícula subatômica — fato rotineiramente observado em aceleradores de partículas — e o surgimento espontâneo e sem causa do universo. Mas o paralelo está aí. Se, como acreditam os astrônomos, o universo primitivo estava comprimido num tamanho muito pequeno, então efeitos quânticos devem ter sido importantes numa escala cósmica. Mesmo se não tivermos uma ideia precisa do que aconteceu no início, podemos pelo menos ver que a origem do universo a partir do nada não é necessariamente ilícita, não natural ou não científica. Em suma, não precisa ter sido um evento sobrenatural.” P. 30.

Existe um porquê de o nosso universo ter passado a existir?

“Mesmo com esses detalhes adicionais, muitas pessoas se sentem enganadas. Elas querem saber por que essas coisas estranhas aconteceram, por que há um universo e por que esse universo. Talvez a ciência não consiga responder essas perguntas. A ciência é boa para explicar os comos, mas não muito boa nos porquês. Talvez não exista um porquê. Perguntar ‘por que’ é muito humano, mas talvez não haja resposta, em termos humanos, para perguntas tão profundas sobre a existência.” P. 30.

Davis conclui:

“[...] o que aconteceu antes do big bang? A resposta é: nada.” P. 30-31.

Segundo Robert Shapiro (Ph.D em Química na Universidade de Harvard, EUA), para que a vida tenha dado o ar de sua graça, ao menos uma vez, ela deve ter vindo da não-vida – Abiogênese. E assim, iniciou-se o processo evolucionário. Deus está fora da jogada.

"Mas como é que a vida surgiu pela primeira vez, neste ou em qualquer outro lugar do universo onde possa existir? Muitas religiões e algumas filosofias se esquivam dessa questão ao supor que a vida, na forma de uma deidade ou de algum ser imortal, sempre existiu. A ciência, que procura respostas naturais ao invés de sobrenaturais, pode oferecer uma resposta alternativa: a vida surgiu da 'não-vida' pelo menos uma vez, em algum momento após a formação do universo." P. 37.

Stephen Jay Gold (Professor de Paleontologia da Universidade de Harvard, EUA) afirma que a Ciência não lida com o significado das coisas no universo. Isso fica a cargo da Teologia e Filosofia.

“[...] a evolução, assim como qualquer área de ciência, não é capaz de sondar a questão das origens fundamentais ou significados éticos. (A ciência, como um empreendimento, busca explicar fenômenos e regularidades do universo empírico, sob o pressuposto de que leis naturais são uniformes no espaço e no tempo. [...] Assim, a evolução não é o estudo da origem primordial da vida no universo ou do significado intrínseco da vida entre os objetos da natureza; essas questões são filosóficas (ou teológicas) e não fazem parte do domínio da ciência. (Também desconfio que não possuam respostas universalmente satisfatórias, mas isso é assunto para outro momento.) Esse aspecto é relevante pois fundamentalistas fervorosos, disfarçados de ‘criacionistas científicos’, afirmam que a criação deve ser equiparada à evolução e receber tempo proporcional nas escolas, uma vez que ambas são igualmente ‘religiosas’ ao lidar com mistérios primordiais. Entretanto, a evolução não trata desses assuntos de modo algum, e portanto permanece plenamente científica.” P. 62.

Gold vê a evolução como um fato consumado. Agora, os mecanismos pelos quais ela acontece é que são frutos de vários debates entre os Cientistas.

“O fato da evolução é tão bem documentado quanto qualquer coisa que conhecemos na ciência — tão seguro quanto nossa convicção de que a Terra gira ao redor do Sol, e não o contrário. Porém, o mecanismo da evolução permanece o centro de empolgantes controvérsias — e a ciência é mais animada e frutífera quando há importantes debates sobre as causas de fatos bem documentados. A seleção natural de Darwin foi confirmada por copiosos e elegantes estudos como um mecanismo poderoso, especialmente na evolução de características que tornam os organismos adaptados ao seu ambiente”. P. 64.

Milford H. Wolpoff (Ph.D em Antropologia na Universidade de Illinois, EUA) lamenta que a evolução tão bem atestada pelos estudos biológicos, seja vista com ceticismo por tanta gente.

“A evolução, o fato de que todas as formas vivas estão relacionadas entre si por descendência comum e que alterações genéticas levam à diversidade da vida na Terra, é um desses avanços revolucionários na organização de nosso conhecimento. E possivelmente o avanço revolucionário da biologia. E, no entanto, apesar do fato de a evolução ser uma explicação de nossa ancestralidade e nossa diversidade, ou talvez por causa disso, ela é largamente desacreditada. [...] O mais difícil de engolir é aquilo que toda criança aprende na escola, que ‘o homem veio dos macacos’.” P. 66.

A dúvida é a mola propulsora que faz a Ciência progredir, nos conta Steve Jones (Professor de Genética no University College, Londres).

“A certeza foi o que bloqueou a ciência por séculos. Os cientistas são, no mínimo, pessoas com incertezas. Suas ideias precisam ser constantemente testadas à luz de novos conhecimentos. Se falharem nessa prova, são rejeitadas.” P. 82.

Jones não considera os Biólogos criacionistas como verdadeiros Cientistas.
               
"Hoje, nenhum biólogo acredita que os seres humanos foram criados num ato milagroso. Todos estão convencidos de que eles evoluíram a partir de formas de vida anteriores. Apesar de as provas da ocorrência da evolução serem fortíssimas, ainda há muito espaço para as controvérsias sobre como ela ocorreu". P. 82.

Grandes símios são os nossos parentes na cadeia evolutiva:

“Chimpanzés e gorilas parecem ser nossos parentes, com base em seu plano corporal. Seus genes sugerem a mesma coisa. De fato, cada um partilha 98% de seu DNA conosco, mostrando que nos separamos recentemente. O relógio sugere que a separação se deu há cerca de 6 milhões de anos. Tanto o chimpanzé quanto o gorila têm pele negra. Isso também sugere que os primeiros humanos eram negros e que a pele branca evoluiu posteriormente.” P. 84.

Hao Wang (Ph.D em Filosofia na Universidade de Harvard, EUA) escreve:

"É claro que um preconceito não é necessariamente falso. E, sim, uma crença fortemente aceita e não garantida pelas evidências disponíveis, sendo a intensidade da convicção desproporcional em relação às evidências que a sustentam". P. 102.

É aqui a única vez que dou um pitacozinho de nada neste “resumo”: No ponto. Todos nós temos ideias e visões de mundo preconcebidas, e elas não são necessariamente falsas por serem assim. Mas claro, geralmente conceituamos o preconceito como uma ideia compulsoriamente falsa. Mas estamos equivocados em ver ele apenas dessa forma. Muitos dos preconceitos que temos são até saudáveis. Não podemos escrutinar (e por que deveríamos?) todas as nossas crenças.

Wang não olha o mental como o equivalente do cérebro. Neste sentido, ele destoa do paradigma vigente. Olhemos sua opinião:

“Os cientistas e filósofos da atualidade em geral entendem que mente e cérebro se equivalem, que há uma correspondência integral entre os estados mental e físico do cérebro de alguém. [...] Mas as evidências disponíveis estão longe de provar que todo estado mental corresponde a um único estado físico do cérebro. Pelo que sabemos, certas mudanças súbitas na mente podem não corresponder a nenhuma alteração física no cérebro. [...] Parece que fomos capazes de observar mais diferenças mentais do que diferenças físicas no cérebro.” P. 102.

Não importa as limitações e deficiências que a Ciência tem, Pascal Boyer (Professor da Universidade de Cambridge, Inglaterra) alega que ela explica o universo melhor que qualquer outra coisa:
               
"[...] a ciência tem sido o empreendimento intelectual mais bem-sucedido de todos até o momento. Explicou mais sobre o mundo do que qualquer outra forma de pensamento". P. 120-121.

Steven Rose (Professor de Biologia e Neurobiologia na Open University) argumenta que cérebro e mente são a "mesma coisa". 
               
“Em primeiro lugar, existe apenas um mundo, uma unidade material ontológica. A alegação de que existem dois tipos de coisas incomensuráveis no mundo, o material e o mental, induz todo tipo de paradoxo e é insustentável. Sem entrar em longos debates filosóficos, a simples observação de que manipular a bioquímica cerebral (com drogas psicoativas, por exemplo) altera as percepções mentais ou de que o sistema de imagem tomográfica indica que regiões específicas do cérebro usam mais oxigênio e glicose quando uma pessoa está concentrada, tentando resolver um problema matemático ‘mentalmente’, mostra que, enquanto a personalidade é mais do que uma simples questão de fosfato, os processos que denominamos mentais e cerebrais devem estar ligados de alguma forma. Portanto o monismo dita as regras, e não o dualismo”. P. 139.

Vários outros Cientistas participaram na composição deste livro, mas ficamos por aqui.

quarta-feira, 27 de junho de 2018

O Impasse Sobre a Origem da vida


A origem da vida ainda continua sendo um mistério insondável para as mentes científicas mais eminentes do nosso tempo, que não conseguem uma explicação passível de provas de que ela surgiu assim ou assado. Apesar das animosidades entre Cientistas materialistas (que são a maioria) e Cientistas teístas, há uma concordância geral, de que ainda estamos muito longe de desvendar, se é que vamos, esse enigma de como de um momento para o outro a vida passou a existir. Teorias aos montes foram propostas ao longo dos últimos sessenta anos, mas elas não passaram pelo escrutínio da Ciência.

Vejamos o que alguns Cientistas teístas têm a dizer:

George T. Javor (Ph.D. pela Columbia University) leciona Bioquímica na Loma Linda University, Loma Linda, Califórnia, EUA.

“Cinqüenta anos de pesquisa bioquímica demonstraram inequivocamente que, a despeito de quais sejam as condições, a abiogênese é uma impossibilidade. É apenas uma questão de tempo antes que o edifício chamado ‘evolução química’ imploda sob o peso dos fatos.”


Urias Takatohi, tem Licenciatura pela Universidade São Carlos e Bacharelado, Mestrado e  Doutorado em Física pela USP.

“Nenhuma teoria [naturalista] adequada sobre a origem da vida foi desenvolvida até agora, e os livros didáticos de biologia ainda citam as hipóteses do bioquímico russo Oparin (c. 1930), e os experimentos de Stanley Miller, da Universidade de Chicago (1952), como progressos nessa direção.”


Werner Gitt, especialista em Teoria da Informação e Diretor do Instituto Federal de Tecnologia em Brunsvique, Alemanha.

“Stanley Miller (1930-2007), cuja experiência com a ‘sopa pré-biótica’ (1953) é mencionada em todo livro de Biologia, admitiu depois de 40 anos que nenhuma das atuais hipóteses sobre a origem da vida consegue ser convincente. Ele classificou todas elas de ‘bobagens’, de ‘gestações mentais químicas’”.


Ariel A. Roth, Ph.D em Biologia pela Universidade de Michigan, membro da Sociedade Americana de Geologia e membro da Sociedade de Geologia Sedimentar.

O fracasso da evolução química para apresentar um modelo plausível, junto com a persistência dos cientistas em tentar criá-lo, provoca uma séria questão sobre a prática atual da ciência. Por que tantos cientistas têm fé em modelos da origem da vida que seguem uma multidão de proposições essencialmente impossíveis, mas não consideram a fé em um idealizador? Existe uma atitude preconceituosa contra Deus no atual ambiente científico? Estaria essa atitude impedindo que a ciência encontre toda a verdade? Algo parece estranho.”

ROTH, Ariel. A Ciência descobre Deus. São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 2010. P. 102.

Cláudia Aparecida Alves, Bacharel em Química/USP, Mestre em Ciência e Química Analítica/USP e Doutora em Biotecnologia Molecular Estrutural/USP.

“Stanley Miller ficou famoso ao publicar, em 1953, os resultados de sua experiência, realizada sob as condições da suposta atmosfera primitiva. A atmosfera primitiva, proposta no experimento de Miller, era composta por vapor d'água, metano, amônia e hidrogênio, na total ausência de oxigênio livre, pois ele sabia que o oxigênio impediria a formação das grandes moléculas orgânicas. Sob estas condições, Miller relatou que obteve formação de alguns aminoácidos. Entretanto, não existem provas de que a atmosfera primitiva fosse isenta de oxigênio livre.

O conhecimento científico chegou a um impasse sobre a origem da vida e que algumas pessoas começam a reconhecer que as respostas podem estar no âmbito da teologia.”


John Briant, Ph.D em Bioquímica na Universidade de Cambridge, com Pós-Doutorado na Universidade de East Anglia. Professor emérito de Biologia Celular e Molecular na universidade Exeter.

“A ciência nos diz também que há coisas que não sabemos e que talvez não conseguiremos saber, o que nos mantém humildes. Não acredito, por exemplo, que um dia saberemos como a vida começou. Podemos conceber um mecanismo viável, mas isso não nos diz o que aconteceu realmente, pois não sabemos repetir o experimento.”

BANCEWICZ. Ruth (Org). O Teste da Fé. Viçosa. Minas Gerais: Ultimato, 2013. P.72.

James Tour, Cientista Infinitesimal, com Ph.D em Química Orgânica pela Universidade Purdue e Pós-Doutorado na Universidade Stanford e na Universidade de Wisconsin. Professor do Departamento de Química e do Centro de Ciência e Tecnologia em Escala Infinitesimal da Universidade Rice. 

“Vou contar-lhe que como cientista e químico sintético”, [...] se alguém devia entender a evolução, seria eu, porque faço moléculas para ganhar a vida, e não apenas compro um kit, e misturo isso e mais isso e obtenho aquilo. Quer dizer, ab initio, eu faço moléculas. Eu entendo o quão difícil é fazer moléculas.

Eu não entendo a evolução, e vou confessar para você. [...] Para mim está tudo bem dizer que ‘eu não entendo isso’? Está tudo bem? Eu sei que há um monte de pessoas lá fora que não entende nada de síntese orgânica, mas entendem de evolução. Eu entendo um monte sobre fazer moléculas; eu não entendo a evolução.

Deixe-me dizer a você o que acontece nos bastidores da ciência – com os membros da Academia Nacional, com vencedores de prêmios Nobel. [...] Eu me assentei com eles, e quando estávamos sós, não em público – porque é uma coisa apavorante, se você diz o que eu acabei de dizer –, eu disse: ‘Você entende tudo isso, de onde tudo isso veio e como aconteceu [a origem da vida]?’ [...] Não.

Toda vez que eu me assento com químicos sintéticos, que entendem isso, eles dizem ‘Ah-hã. Não’. [...] E se eles estão com medo, e querem dizer ‘sim’, então não dizem nada. Eles apenas olham pra mim, porque eles não podem sinceramente fazer isso.


Stephen Grocott, Ph.D em Química na Universidade da Austrália Ocidental. Membro do Instituto Real de Química da Austrália.

“Se alguém acredita na evolução, então é preciso também explicar a origem da vida, o primeiro passo. Sem isso, toda a questão da evolução paira sobre nada.

Agora este é um assunto sobre o qual eu li muito. E o peso das evidências contra a origem espontânea da vida na Terra é, na minha opinião, esmagadora.”

ASHTON, John F. Em Seis Dias: Por Que 50 Cientistas Decidiram Aceitar a Criação. Master Books, 2001. P. 144.

Francis Collins, renomado Geneticista e Diretor do Projeto Genoma Humano, responsável pelo mapeamento do DNA humano, em 2001.

“Para começar, como surgiram esses organismos que se auto-reproduzem? É justo afirmar que simplesmente não sabemos. Nenhuma hipótese atual se aproxima de uma boa explicação acerca de como, num espaço de meros 150 milhões de anos, o ambiente pré-biótico que existia sobre o planeta Terra gerou vida.

Há cinquenta anos, os famosos experimentos de Stanley Miller e Harold Urey recriaram uma mistura de água e compostos orgânicos que poderia ter representado as circunstâncias primordiais na Terra. Aplicando uma descarga elétrica, esses pesquisadores puderam formar pequenas quantidades de importantes blocos de construção biológica, como os aminoácidos.

Além desse ponto, porém, os detalhes tornam-se bastante incompletos. Como poderia uma molécula que se auto-reproduz, portando informações, montar-se espontaneamente a partir desses componentes? Parece totalmente improvável que uma molécula como o RNA, com sua estrutura de açúcar-fosfato e bases orgânicas dispostas de forma complexa, empilhadas umas sobre as outras e emparelhadas em cada degrau de uma hélice dupla e retorcida, tenha 'apenas acontecido' – especialmente uma vez que o DNA aparenta não ter, em sua essência, nenhum modo de copiar a si mesmo.”

COLLINS, Francis. A Linguagem de Deus. São Paulo: Gente, 2007. P. 96-97.

A maioria dos citados acima são criacionistas clássicos, aquele pequenino grupo de Cientistas que elaboram as mais inusitadas teorias para negar os bilhões de anos do universo, e que creem piamente que a origem da vida surgiu abruptamente já formada, conforme o Gênesis. Não levando em conta tal crença, eles têm razão quanto a ignorância ainda existente sobre como a vida surgiu. Alegam que as teorias materialistas fracassaram rotineiramente em explicar como a vida apareceu.

É frequente vermos apelarem para a Lei da Biogênese: vida só pode surgir de vida. Mas este é um problema para eles! Tal lei diz que vida material (seres unicelulares, bactérias, vírus, animais, seres humanos) só pode vir de vida material, e não de uma vida invisível, inacessível, misteriosa, inalcançável e incompreensível, que é exatamente o Deus que postulam. Estão a misturar Filosofia e Teologia com Ciência? Parece que sim. Para que tal argumento funcione, precisam inserir doses cavalares de Filosofia e Teologia no meio disso tudo. 

O primeiro citado, George T. Javor escreve: “[...] a abiogênese é uma impossibilidade”. Por ora, digamos que sim. No entanto, a Biogênese parece tornar a visão do que você defende uma impossibilidade, conforme já expliquei.

O segundo citado, Urias Takatohi diz: “Nenhuma teoria [naturalista] adequada sobre a origem da vida foi desenvolvida até agora”. Você está certo, Takatohi. Mas retruco-lhe: “Nenhuma teoria adequada baseada na sua interpretação da Bíblia sobre a origem da vida foi desenvolvida até agora”.

O terceiro citado, Werner Gitt arrebata: “Stanley Miller [...] admitiu [...] que nenhuma das atuais hipóteses sobre a origem da vida consegue ser convincente. Ele classificou todas elas de ‘bobagens’, de ‘gestações mentais químicas’”. Você está correto, Gitt. E é bom lembrares que Miller têm um conceito muito pior sobre as teorias criacionistas da vida.

...

Como pode-se ver, há sempre um contraponto adequado para cada asserção dos criacionistas. 

Estamos diante de um impasse científico sobre como a vida se originou, conforme diz a Cláudia Aparecida Alves - e é aí, que os criacionistas falham, visto que só sabem apontar os defeitos nas teorias naturalistas, sem proporem um modelo adequadamente científico para explicar todo esse mistério.

PS: Não sou ateu. Apenas lançando um olhar mais crítico sobre aqueles que adoram ver defeitos no quintal alheio. 

terça-feira, 26 de junho de 2018

A História Está Errada



DANIKEN, Erick Von. A História Está Errada. São Paulo: Idea, 2010.

Daniken é figura conhecida, quando se fala em Ufologia, viajantes espaciais de outros planetas, construção das pirâmides e de outros monumentos, por civilizações avançadas de outros planetas, aos quais os antigos habitantes da Terra, chamaram de deuses. Daniken a despeito de ser bastante criticado por outros estudiosos, continua a sua saga de provar que fomos visitados por seres tecnologicamente mais evoluídos, e que eles nos ensinaram a construir grandes e intrincados monumentos, e que até prometeram que irão voltar.

Ele gasta muitas páginas de seu livro falando sobre o misterioso e indecifrável manuscrito Voynich, que encontra-se atualmente na Universidade de Yale, e que ninguém conseguiu dizer sem sérias contestações, qual o significado de suas palavras e ilustrações. Não surpreende que Daniken atribua as gravuras e palavras ali contidas como sendo uma mensagem velada dos extraterrestres, que em breve serão finalmente descobertas. Semelhante aos religiosos que creem que ao final, as suas verdades absolutas serão expostas a todos, Daniken também nutre esse tipo de esperança.

“As conseqüências poderiam ser altamente inquietantes, pois a existência de extraterrestres, deixada de lado há milhares de anos atrás, geralmente nos força a tirar conclusões que arrebentam nossa visão atual das coisas. [...] Estamos marchando em linha reta diretamente para a era das maravilhas e do despertar.” P. 68.

Como nos seus outros livros, muita atenção é dada a Enoch, aquele obscuro personagem bíblico, que foi levado aos céus – não passou pela morte – mas que ao contrário da interpretação tradicional, o autor analisa tal história com os olhos modernos, ou seja, ele inverte a prática hermenêutica, vendo no livro de Enoch, não anjos, seres celestiais, ou Deus, mas naves tripuladas por alienígenas, que os antigos de maneira equivocada interpretaram como deuses. A tripulação que levou Enoch, voltará em breve, diz Daniken.

“Como você irá se comportar, quando os amigos alienígenas de Enoch realmente voltarem? E que eles irão voltar é tão certo quanto a noite segue o dia.” P. 87.

“Se ETs realmente visitaram nosso planeta há milênios atrás e passaram seu conhecimento para alguém, como Enoch, há muito o que fazer agora. Apenas pense, meu querido leitor, sobre o impacto na religião, as conseqüências filosóficas, as possibilidades para a tecnologia de vôo espacial, que pode atravessar anos-luz. Ou pense ainda na antiga promessa de uma segunda vinda, que aparece em praticamente em todas as religiões até o dia de hoje.” P. 75.

O que seriam encontros com anjos, seres enviados por Deus, para guiarem e ajudarem certas pessoas, na verdade, foram extraterrestres. Na verdade a Bíblia, por exemplo, é uma grande prova das visitações extraterrestres. Um dos encontros ufológicos mais emblemáticos encontra-se no livro de Ezequiel.

“As descrições altamente precisas feitas pelo profeta Ezequiel, na Bíblia, foram transformadas em ‘visões, sonhos, inspirações’ e outras mistificações semelhantes, embora ele claramente esteja falando sobre um ônibus espacial.” P. 80-81.

Não é surpresa, para quem lê literatura ufológica, tal modo de ver os textos bíblicos. Lembro-me que a primeira vez que li sobre isso, foi em 2003, numa edição da revista UFO, que trazia em sua capa a pergunta se Jesus era um extraterrestre. Os Ufológos, pelo menos grande parte deles, assim o creem. Nada mais natural, seguindo a linha interpretativa que eles têm sobre a história e os textos sagrados do passado.

A maneira correta de vermos as coisas, se aproxima. Nada modesto, Daniken vê a si  mesmo como parte crucial nesse processo.

“Alguém como eu, que tende a olhar um pouco mais para trás, nas brumas do tempo, poderia ajudar na aceleração ao longo deste tempo de despertar. Uma grande mudança está chegando e por mais que políticos, cientistas que se dão muita importância, e líderes religiosos, fervorosamente vociferantes, possam querer, nunca serão capazes de impedir. Não há vacina contra o pensamento. Idéias não conhecem fronteiras nem censura. E mais: idéias têm uma tendência perigosa de se alastrarem como o fogo.” P. 84-85.

Daniken reconhece que já cometeu equívocos interpretativos, que já errou, avaliando erradamente os dados, e que isto é combustível para os seus críticos descartarem tudo que ele já escreveu. Mas ele tem um recado a quem pensa assim:

“Errar é humano, como dizem, e admitir o erro não fere. Nas quase 9.000 páginas que escrevi, é inevitável que eu tenha cometido um ou outro erro, ou que ao longo do tempo revelou-se que o ‘outro lado’ estava certo, depois de tudo, e eu estava errado. [...] Agora, há algumas pessoas que agem como se um erro provado em uma teoria é suficiente para anular a idéia inteira. ‘Se uma peça de evidencia em seu livro não está certa’ - ouço isso freqüentemente – ‘então, tenho de assumir que toda outra evidência é falsa’. Segundo esta lógica absurda, teríamos de jogar fora praticamente todos os livros escolares, os livros didáticos, ou livros científicos por todo o planeta, porque o tempo nos mostra que muitas coisas que foram alguma vez consideradas como verdades inabaláveis são agora tidas como erradas.” P. 110-111.

Boa parte de A História Está Errada é uma defesa do próprio caráter e carreira do Daniken. Sua imagem ficou muito prejudicada devido aos seus problemas com Juan Moricz, um carinha que diz ter explorado um conglomerado de cavernas no Equador, que estavam (estão) cheias de placas de metais, que na visão de Daniken têm a ver com os livros ditados por extraterrestres a Enoch, milênios atrás, que foram trazidos para América, pelos jareditas, povo hebreu – história está contada pelo livro de Mórmon. Sim!, numa intricada e nada convincente argumentação, Daniken bota fé que o livro de Mórmon tem o seu quinhão de credibilidade, com o mesmo erro que a Bíblia, de atribuir a Deus, o que na verdade foram encontros com extraterrestres. Os metais presentes nesta caverna têm importância salutar para o futuro da humanidade. Esses escritos entregues a Enoch, em breve serão revelados a todos. Os Ets estão voltando. Que o diga o famoso Chico Xavier, para quem a Data Limite é 20 de julho de 2019.

Daniken teve sérios problemas, depois de ter publicado fotos dessas supostas cavernas, fornecidas Juan Moricz. Décadas depois do acontecido, Daniken retoma toda essa confusão, dando a sua versão dos fatos, declarando-se inocente.

Daniken é um homem que acredita só em ets, ou também acredita em Deus? Sim. Ele crer num Ser Todo Poderoso. Eis o que ele diz:

“Como um homem religioso, que ainda reza diariamente, minha fé começa com a criação do universo. MINHA idéia de Deus é a de um ser eterno, onipresente, atemporal e todo-poderoso, que nunca sentiu a necessidade de viajar ao redor da Terra, em qualquer tipo de veículo que levanta areia, faz muito barulho, irradia luz resplandecente e, o que é mais, é extremamente perigoso para qualquer humano nas vizinhanças.” P. 196.

E é exatamente por ser assim, ele não pode jamais ser o deus das religiões que conhecemos.

“O Deus verdadeiro, o Grande Espírito da Criação, não é responsável pela grande confusão de dogmas e religiões terrestres.” P. 208.

“[...] eu creio - que os alienígenas visitaram a Terra milhares de anos atrás. Isso leva ao nascimento das religiões de hoje e das sagradas escrituras. Como sabemos, cada religião neste hospício terrestre afirma que SUAS escrituras sagradas são as únicas verdadeiras. Em quem - pelo amor de Deus! - devemos acreditar? E NO QUE devemos acreditar? A maioria das religiões prediz algum tipo de julgamento final. Há religiões que anunciam que os infiéis serão cozidos vivos, afogados, espancados, esfaqueados, envenenados (com "água amarga"). Felizmente isso se aplica só aos infiéis - mas, espere! QUAIS infiéis? Aqueles que não acreditam no dogma católico? Aqueles que tiveram a infelicidade de não nascerem na Arábia ou terras asiáticas e nunca terem ouvido os ensinamentos do Islã ou da fé hindu? Aqueles que tiveram suficiente azar de crescer em uma seita cristã ou qualquer outra? Aqueles que são membros da religião xintoísta, no Japão, ou aqueles que não acreditam no Livro de Mórmon ou nos ensinamentos da Cientologia?

“Mesmo o cérebro mais modestamente inteligente precisa certamente começar a ver o problema. [...] Como dificilmente poderemos sustentar que o criador do universo é o responsável pela pletora de escritos sagrados existente em nosso planeta, então devemos olhar para outra fonte, para descobrir uma solução aceitável para o caos existente.” P. 208-209.

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Contra a perfeição: Ética na Era da Engenharia Genética




SANDEL, Michael J. Contra a perfeição: Ética na Era da Engenharia Genética. 1. ed. - Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.

Michael Sandel, Ph.D em Filosofia Política na Universidade de Oxford, em mais um livro extraordinário, explica o porquê de ser “contra a perfeição” - ser contra o aperfeiçoamento genético, alegando que isso seria uma nova forma de eugenia. Alguns pontos de sua defesa podem ser discutidos e questionados, mas no geral suas argumentações são bastante plausíveis. As consequências de uma sociedade modificada geneticamente não parecem ser muito boas.

Sandel posiciona-se a favor das pesquisas com células tronco embrionárias, o que logicamente matará essas vidas humanas. Ele não acredita que o embrião (blastócito) tenha os mesmos direitos, o mesmo status, que nós, seres humanos nascidos, temos. Neste ponto, também estou com ele.  

Vamos ao livro.

Há muito tempo, os pais já tinham a preocupação na escolha do sexo de seus descendentes.

“Há séculos os pais tentam escolher o sexo dos filhos. Aristóteles aconselhava que os homens que desejavam um menino amarrassem o testículo esquerdo antes da relação sexual. O Talmude ensina que os homens que se contêm e permitem que as mulheres cheguem primeiramente ao orgasmo serão abençoados com um garoto. Outros métodos recomendados envolviam combinar o momento da relação sexual com a época da concepção ou as fases da lua.” P. 20.

Geralmente a escolha de meninos tem precedência, acarretando em vários abortos, na Índia.

“[...] em sociedades nas quais existe uma preferência cultural profunda por meninos, o aborto de meninas depois da determinação do sexo por meio dos exames de ultrassom tornou-se uma prática comum. Na Índia, o número de meninas a cada mil meninos caiu de 962 para 927 nas últimas duas décadas. A Índia proibiu o uso de exames de ultrassom para verificação do sexo de bebês, mas a lei raramente é cumprida. Radiologistas itinerantes com máquinas de ultrassom portáteis vão de cidadezinha em cidadezinha apregoando seus serviços. Uma clínica de Mumbai reportou que, de 8 mil abortos feitos ali, apenas um não o foi por motivos relacionados à escolha do sexo.” P. 21.

O aumento de drogas farmacêuticas ingeridas por crianças tiveram um aumento absurdo, devido as novas obrigações destinadas aos pequenos.

“Há quem atribua o enorme aumento nos diagnósticos de transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) às novas demandas impostas às crianças. O dr. Lawrence Diller, pediatra e autor de Running on Ritalin (À base de ritalina), estima que de 5% a 6% das crianças americanas com menos de 18 anos (entre 4 e 5 milhões de jovens) são atualmente medicadas com ritalina e outros estimulantes para tratar o TDAH. (Os estimulantes combatem a hiperatividade, facilitando que as crianças mantenham o foco e a atenção e impedindo que elas se desviem de uma coisa para outra.) Ao longo dos últimos 15 anos, a produção legal de ritalina aumentou 1.700%, e a produção da anfetamina Adderall, também usada para tratar o TDAH, aumentou 3.000%. Para as empresas farmacêuticas, o mercado americano da ritalina e de outros medicamentos relacionados é uma mina de ouro: rende US$ 1 bilhão por ano.” P. 45.

Sandel mostra a incoerência daqueles que não se posicionam contra a FIV, mas são contra as pesquisas com células embrionárias.

“Se é imoral produzir e sacrificar embriões com o intuito de curar ou tratar doenças terríveis, por que não seria igualmente censurável produzir e descartar embriões excedentes em tratamentos de infertilidade? Ou, olhando o argumento de trás para a frente: se produzir e sacrificar embriões vindos de FIV [Fertilização in Vitro] é moralmente aceitável, por que produzir e sacrificar embriões para pesquisas com células-tronco não o seria? Afinal, as duas práticas servem a fins valorosos, e curar doenças como o mal de Parkinson e o diabetes é no mínimo tão importante quanto tratar a infertilidade.” P. 73.

Os embriões congelados aos milhares, deveriam ser usados para pesquisas médicas, visto que qualquer jeito serão descartados.

“[...] o fato é que a FIV, como é praticada nos Estados Unidos, produz dezenas de milhares de embriões excedentes destinados à destruição. (Um estudo recente revelou que cerca de 400 mil embriões congelados estão definhando em clínicas de fertilidade americanas, contra 52 mil no Reino Unido e 71 mil na Austrália.) É verdade que, uma vez que esses embriões condenados existem, ‘não haveria nada a perder’ se fossem utilizados em pesquisas.” P. 74.

Sandel argumenta que o embrião não é pessoa humana.

“A dificuldade de especificar o início exato da pessoalidade no curso do desenvolvimento humano não significa, entretanto, que os blastocistos sejam pessoas. Considere a seguinte analogia: suponha que alguém lhe pergunte quantos grãos de trigo constituem uma pilha. Um único não constitui, nem dois, nem três. O fato de não haver nenhum ponto não arbitrário que estabeleça quando a adição de mais um grão fará um punhado virar uma pilha não significa que inexista diferença entre um grão e uma pilha. Nem nos dá, tampouco, motivos para concluir que um grão deve ser uma pilha.

Esse enigma de especificar pontos em um continuum, conhecido pelos filósofos como ‘paradoxo sorites’, remonta aos antigos gregos. (‘Sorites’ vem de soros, a palavra grega para ‘pilha’, ou ‘monte’.) Os sofistas usavam argumentos do tipo sorites para tentar convencer seus ouvintes de que duas qualidades distintas ligadas por um continuum eram na verdade a mesma, ainda que a intuição e o senso comum sugerissem o contrário. A calvície é um exemplo clássico. Todos concordariam que um homem com um único fio de cabelo na cabeça é careca. Que quantidade de fios marca a transição entre ser careca ou não? Embora não haja resposta determinada a essa pergunta, não se depreende com isso que não exista diferença entre ser careca e ter uma cabeça cheia de cabelos. O mesmo vale para a condição de pessoa. O fato de haver um desenvolvimento contínuo que transforma o blastocisto em embrião implantado, este em feto e, finalmente, em recém-nascido não determina que um bebê e um blastocisto sejam, no sentido moral, equivalentes.” P. 78.

Entre salvar uma criança ou vinte embriões, quem nós salvaríamos?

“Considere a seguinte situação hipotética (sugerida pela primeira vez, até onde sei, por George Annas): suponha que houvesse um incêndio em uma clínica de fertilidade e que você só tivesse tempo para salvar uma menina de 5 anos ou uma bandeja com vinte embriões congelados. Seria errado salvar a menina? Ainda preciso encontrar um defensor do status moral equivalente que diga que escolheria salvar a bandeja de embriões. Mas, se você realmente acreditasse que aqueles embriões são seres humanos, e todos os demais fatores fossem idênticos (isto é, se você não tivesse nenhuma relação pessoal nem com a menina nem com os embriões), sob que bases você poderia justificar salvar a menina?” P. 80.

Por mais que façam barulho, nem os “pró-vida” agem como se os embriões tivessem o mesmo valor de uma pessoa nascida.

“Porém o modo como reagimos à perda natural de embriões sugere que não consideramos esse acontecimento equivalente à morte de uma criança, nem do ponto de vista moral nem do ponto de vista religioso. Até mesmo as tradições religiosas que mais respeitam a vida humana incipiente não pregam que se façam os mesmos rituais funerários para a perda de um embrião e a morte de uma criança”. P. 81.

Qual a concepção filosófica que dá sustentação a convicção de que o embrião é uma pessoa?

“A convicção de que o embrião é uma pessoa deriva não apenas de certas doutrinas religiosas como também da alegação kantiana de que o universo moral se divide em termos binários: tudo ou é pessoa, digna de respeito, ou coisa, sujeita ao uso.” P. 82.

Não tratei da argumentação dele, contra o aperfeiçoamento genético. Para quem quer saber, basta ler o livro.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

O Livro Ilustrado dos Maus Argumentos



Almossawi, Ali. O Livro Ilustrado dos Maus Argumentos. Rio de Janeiro: Sextante, 2017. (PDF).

"Este livro trata fundamentalmente do que não se deve fazer em uma argumentação. [...] Logo ficou evidente para mim que formalizar o raciocínio traz benefícios como clareza de pensamento e expressão, aumento de objetividade e autoconfiança. A capacidade de analisar os argumentos dos outros também ajuda a perceber o momento certo de se retirar de discussões infrutíferas. A lógica não gera novas verdades, mas permite que se verifiquem a consistência e a coerência das cadeias de pensamento existentes. Exatamente por isso é uma ferramenta eficaz para a análise e a comunicação de ideias e argumentos." P. 08-09.

“Hoje, com as redes sociais, há cada vez maior participação no debate público sobre fatos do dia, política, liberdades civis. Mas há uma notável falta de raciocínio lógico e fundamentação em boa parte desse discurso”. P. 08.

Livro de importância salutar para identificar as falácias (erros de raciocínio) que brotam por todos os lados. Como parte de nossas vidas está no mundo virtual, o que mais vemos, são pessoas opinando sobre os mais diversos assuntos, com argumentos paupérrimos, sem fundamentação alguma. Falta-lhes raciocínio lógico; falta-lhes validez, solidez e consistência, no que dizem. As conclusões muitas vezes podem até ser verdadeiras, mas falham na construção das premissas para prová-las, ou mostrar a sua razoabilidade. E não quero me eximir: também cometo tais erros.

O mais assustador é que as pessoas que a princípio não deveriam incorrer corriqueiramente em falácias tão simples, são tão suscetíveis quanto os adolescentes imaturos de 15, 16 anos, a caírem nos laços dos erros de raciocínio. Professores, bacharéis, acadêmicos, autodidatas... Quantas vezes já não me deparei com Professores universitários lançando mão de argumentos infantis, para defenderei suas ideologias. Hoje em dia com a polarização ideológica tão acentuada, parece que os mais “estudados” são os mais falaciosos em seus discursos. Os alunos destes, estão seguindo em suas trilhas do erro.

É mais que imprescindível que estejamos treinados em identificar os erros de lógica nos discursos e apologias alheias, e não esquecendo de detectar e admitir os nossos.

Não é fácil olharmos para nossas ideias e visões, e dizer: estou/estava errado. Nosso ego é um inimigo com quem devemos lutar diariamente, colocando-o debaixo de nossos pés. Podemos estar errados em nossas convicções mais caras.

Vamos a algumas falácias que o livro apresenta.

Falácia a Partir das Consequências:

O argumento a partir das consequências consiste em defender ou refutar a veracidade de uma declaração apelando às consequências que ela teria se fosse verdadeira (ou falsa). Mas o fato de uma proposição levar a um resultado desfavorável não significa que ela seja falsa. Da mesma forma, o simples fato de ter consequências positivas não torna a afirmação automaticamente verídica. [...] Vamos analisar a citação de Dostoievski: ‘Se Deus não existe, então tudo é permitido.’ Deixando de lado as discussões morais, o apelo às consequências sombrias de um mundo puramente materialista não prova nada sobre a existência ou não de Deus. [...] A falácia do argumento a partir das consequências pode ser reconhecida como uma pista falsa ou manobra de distração, porque sutilmente desvia a discussão da proposição original – neste caso, em direção ao resultado e não ao mérito da proposta em si”. P. 12.


Falácia do Espantalho:


“A falácia do espantalho consiste em apresentar de forma caricata o argumento da outra pessoa, com o objetivo de atacar essa falsa ideia em vez do argumento em si. Deturpar, citar de maneira incorreta, desconstruir e simplificar demais o ponto de vista do adversário são formas de cometer essa falácia. [...] Além disso, acaba levando o oponente a perder tempo defendendo-se da interpretação ridícula de seu argumento, em vez de sustentar sua posição original.


Por exemplo, um cético em relação à teoria de Darwin poderia dizer: ‘Meu oponente está tentando convencer você de que nós evoluímos dos macacos que se balançavam em árvores; uma afirmação realmente grotesca.’ Essa é uma deturpação do que a biologia evolutiva afirma de fato, que é a ideia de que humanos e chimpanzés compartilharam um ancestral comum há milhões de anos. Deturpar a ideia é muito mais fácil do que refutar suas evidências.” P. 14.


Falácia de Apelo a Autoridades Irrelevantes:


"Um tipo comum de apelo a autoridades irrelevantes é o apelo à sabedoria antiga, onde uma ideia é presumida como verdadeira somente porque foi originada num passado distante." P. 15.


Falácia do Falso Dilema:


“O falso dilema é um argumento que apresenta apenas duas categorias possíveis e parte do princípio de que tudo no âmbito da discussão deva pertencer somente a uma ou a outra destas possibilidades opostas. Assim, ao rejeitar uma das opções, a pessoa não teria alternativa a não ser aceitar a outra. Por exemplo: ‘Na guerra ao fanatismo, não há neutralidade: ou você está do nosso lado, ou está com os extremistas.’ Na realidade, há uma terceira opção, a de estar neutro; e uma quarta, de ser contra os dois lados; e ainda uma quinta opção, de concordar com razões de ambos”. P. 18.


Falácia da Causa Questionável:


“Também conhecida como causa falsa, esta falácia define como causa de um evento, sem provas, uma ocorrência anterior ou simultânea àquele evento. A correlação entre os dois eventos pode ser pura coincidência ou resultado de algum outro fator. Mas sem evidências não é possível concluir que um evento causou o outro. [...] Em várias disciplinas, especialmente pesquisas científicas, esse erro é conhecido como confundir correlação com causalidade.” P. 20.


Falácia de Apelo à Ignorância


“Este tipo de argumento tenta convencer que algo é verdadeiro simplesmente porque não foi comprovado como falso. Assim, a ausência de prova é transformada em prova por ausência. Uma forma específica de apelo à ignorância é o argumento da incredulidade pessoal, onde a incapacidade de entender ou imaginar algo leva a pessoa a acreditar que aquilo é falso. Por exemplo: ‘É impossível imaginar que o homem realmente pisou na Lua, portanto, isso nunca aconteceu.’” P. 26.


Livro muitíssimo bom, e de fácil leitura para todos.