TUCKER, Ruth. Fé e Descrença: O Drama da Dúvida na
Vida de Quem Crê. São Paulo: Mundo Cristão, 2008.
“Em minha própria peregrinação espiritual, que
começou na infância, a dúvida e a fé têm coexistido. Não é uma condição que
escolhei para mim, e não é algo que eu possa eliminar – nem necessariamente o
desejaria”.
Que livro! Que livro! Que livro!
Ruth Tucker (Ph.D em História pela Northern
Illinois University) brinda os leitores com essa obra diferenciada que analisa
o papel da descrença na vida de quem crê. Revelando que a dúvida pode ser (e
tem sido) uma parceira constante na caminhada de quem afirma acreditar em Deus
(tendo em mente o deus judaico-cristão). Ela não alivia a sua própria
peregrinação de fé, admitindo que a crença e a descrença andam lado a lado em
suas caminhada, e que continuará assim. Vários místicos são trazidos a baila,
demonstrado que os mesmos também tiveram as suas “noites escuras da alma”.
Onde Deus está?
"Onde está Deus na vastidão do universo? Onde está Deus entre os
bilhões de estrela e bilhões de anos-luz e bilhões de pessoas deste planeta?
Respostas fáceis soam vazias. A fé serena, infantil de anos passados parece
insuficiente em face das descobertas científicas que com demasiada facilidade
atiram Deus num buraco negro. Quando contemplo o céu noturno, às vezes me
pergunto se minha fé não é uma ficção de minha imaginação". P. 15.
Parece que a fé não é de todos.
“Não há respostas
fáceis para a pergunta de por que para uns acreditar é algo tão natural como
respirar e para outros é uma luta emocional e intelectual que no fim não vale a
pena”. P. 30.
São desonestos os ex-crentes?
“Dizer que as
pessoas que lutam com dúvidas ou abandonam a fé são rebeldes ou desonestas
simplesmente não está de acordo com os testemunhos”. P. 30.
A maior questão de todas:
"Quem é Deus? Essa é a pergunta fundamental relacionada à crença e a
não-crença. Quem é Deus? Onde está Deus? Que afinidade Deus tem com os seres
humanos? Essas perguntas e questões desafiam teólogos, filósofos, sociólogos,
psicólogos e uma multidão de outros especialistas". P. 59.
A "noite escura da alma":
“Há um tipo especial de dúvida sobre a qual eu nada sei – a não ser por
meio de minhas leituras, é a dúvida e escuridão que muitas vezes acometem os
místicos e os que se entregam à meditação, aqueles que dedicam à vida à busca
de Deus e que, no processo desse empreendimento, vão muito fundo ou atingem
grandes alturas e acabam chegando a um lugar onde encontram o vazio e a
escuridão. Há também aqueles cristãos que atingem uma escuridão espiritual
acompanhada de depressão psicológica. Essas experiências muitas vezes são
descritas como a noite escura ou simplesmente a escuridão da alma”. P. 69.
Até João Batista, precursor de Jesus teve dúvidas.
“Sempre que minha fé está fraca e
eu duvido da verdade da mensagem do evangelho, conforta-me saber que não estou
só. Encontro companhia mesmo entre os ‘gigantes’ da Bíblia, inclusive João
Batista.” P. 86.
Eis um caso extremamente intrigante. João Batista que teve dúvidas
acerca da messianidade de Jesus, mandou que seus seguidores perguntassem a ele,
se de fato ele era o Cristo. Jesus obviamente respondeu que sim – ele era o
Cristo de Deus, enviado para salvar o mundo. Em vez de Jesus criticá-lo por
isso, Jesus não o viu com olhos condenatórios. Pelo contrário, os maiores
elogios que Jesus fez a uma pessoa, foram dirigidos a João, logo após esse
ocorrido. Em Mateus 11. 7-11 está escrito:
“Enquanto saíam os discípulos de João, Jesus
começou a falar à multidão a respeito de João: "O que vocês foram ver no
deserto? Um caniço agitado pelo vento?
Ou, o que foram ver? Um homem vestido de roupas finas? Ora, os que usam roupas finas estão nos palácios reais.
Afinal, o que foram ver? Um profeta? Sim, eu lhes digo, e mais que profeta.
Este é aquele a respeito de quem está escrito: ‘Enviarei o meu mensageiro à tua frente; ele preparará o teu caminho diante de ti’.
Digo-lhes a verdade: Entre os nascidos de mulher não surgiu ninguém maior do que João Batista; todavia, o menor no Reino dos céus é maior do que ele.”
A Ciência e a Filosofia, a dupla destruidora da fé:
"Mais talvez do que qualquer outra área de especialização
acadêmica, a ciência e a filosofia têm o potencial de abalar as próprias
fundações da fé. Vemos isso como um fato histórico observando como cientistas e
filósofos, um após o outro, abandonaram a fé em que foram criados". P.
101.
O persistente problema do mal:
“Questões relativas à natureza e bondade de Deus e o problema do mal (teodicéia) estão entre as razões mais frequentemente citadas para abandonar a fé. Por exemplo, como é possível que um Deus bom – um Deus todo-poderoso – deixe Hitler exterminar milhões de judeus, ou que um terremoto mate dezenas de milhares de pessoas na Turquia, ou que terroristas assassinem milhares de pessoas nos atentados de 11 de setembro de 2001?” P. 122.
O mal praticado pelos seres humanos, me deixa muito mais de cabelo em pé, do que o mal natural, como os maremotos, doenças e etc.
A incerteza da existência de Deus:
“A questão principal que me
atormenta consciente e inconscientemente ao longo de toda a vida: a existência
de Deus.” P. 140.
Vários são os motivos que aparecem para manter as pessoas descrentes ou crentes, eis alguns:
"Perder a fé é um modo de reagir ao silêncio de Deus diante da dor
e do sofrimento. Outros buscam aceitar o que teológica e filosoficamente está
além da compreensão humana. Outros há que cerram os punhos contra Deus,
consumidos mais pela raiva do que pela descrença. E, por mais incrível que
pareça, alguns sentem a presença de Deus numa medida ainda maior durante
períodos de grande perda e dor - quando Deus
pareceria calar-se a respeito de sua dor. Para outros ainda, o aparente
silêncio de Deus provoca uma paralisante incerteza acompanhada de uma
determinação de manter-se na fé." P. 159.
Para uns (a maioria, na verdade), apesar de tudo, crer em Deus é algo compulsivo:
“Quando observo este gigantesco mundo intricado,
não posso acreditar que ele aconteceu por acaso. Não quero dizer que tenho
alguns bons argumentos a favor de sua criação e que acredito neles. Quero dizer
que essa convicção surge de dentro de mim de modo irresistível quando contemplo
o mundo. A tentativa de eliminá-lo não funciona. Quando ergo os olhos para os
céus, não consigo crer que eles não declaram a glória de Deus. Quando olho para
a terra, não consigo levar a bom termo a tentativa de crer que ela não mostra a
obra das mãos dele.” P. 161. - Nicholas Wolterstorff, Ph.D em Filosofia na
Universidade de Harvard.
Mais uma vez o problema do mal:
“O problema da dor e do mal é o terreno de todas as
batalhas pela crença. Quer o mal seja percebido como uma ocorrência aleatória, quer
seja perpetrado por Hitler ou por um evangelizador da televisão, é simplesmente
natural que alguém se pergunte por que Deus não o impede. A única pergunta que
realmente vale a pena fazer é ‘Que diacho está acontecendo aqui?’. Nenhum
ponderado filósofo ou teólogo tem a resposta. A melhor reação é não dar
resposta alguma.” P. 171.
É um livro infinitamente rico. Os trechos aqui
citados são só a ponta iceberg. Só lendo toda a obra para ter noção da
extensão de tudo que ela trata em suas páginas.
Uma sinceridade que falta em 99% dos escritores
religiosos. Tucker não tem pudor em revelar a sua vulnerabilidade. Pena que é
um livro que saiu do catálogo da editora Mundo Cristão. Enquanto que muitas
porcarias continuam sendo publicadas por ela.
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