quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Consumidores da Fé


OLIVEIRA, Ivan de. Consumidores da fé. São Paulo: Reflexão, 2015.

Ivan de Oliveira (Ph.D e Mestre em Direito pela UNIMES/SP; Pós-Doutor em Direito na Universidade de Coimbra, em Portugal; Bacharel em Direito na UMC/SP; Mestre em Ciências da Religião e Bacharel em Filosofia e Teologia pela Universidade Mackenzie, São Paulo) nos traz a sua pesquisa sobre os “consumidores da fé” que perambulam que nem zumbis nas ditas igrejas neopentecas.

É sabido que neopentecostalismo (universal do reino de deus, internacional da graça de deus, renascer em cristo, mundial do poder de deus...) mostrou-se uma força religiosa e social muitíssimo poderosa em solo brasileiro nas três últimas décadas. Essas igrejas inseridas num contexto capitalista, onde o consumo é a bola da vez, não escaparam do que o autor chama de “Indústria Cultural”, termo que pegou emprestado das conceituações de alguns teóricos da Escola de Frankfurt, na Alemanha.

E já que mencionei a Escola de Frankfurt, o ponto negativo que vejo no livro, são as várias páginas escritas no início explicando e historiando a dita escola. O Oliveira menciona até quem foi os seus diretores ao longo dos anos. Precisava disso? Qual a relevância de enumerar cronologicamente a direção dessa instituição? Absolutamente nenhuma. Se autor tinha como aporte teórico as ideias dos pesquisadores dessa escola, poderia ser mais sucinto em sua exposição e ir direto ao seu objeto de pesquisa.

Separei alguns trechos que achei relevantes.

“No mercado de consumo não há circulação somente de coisas consideradas pelo critério de utilidade ou pelo custo da produção, mas o grande peso que se leva em conta na circulação de produtos e serviços são os símbolos agregados às coisas negociadas.” P. 72.

Esses “símbolos agregados às coisas negociadas” é o que pesa bastante no âmbito religioso neopenteca (e não somente nele, mas noutros seguimentos religiosos), visto que o valor agregado, agora é direcionando a um bem de consumo “sagrado/consagrado/ungido/de Deus”. O consumidor não está adquirindo algo deste “mundo”, contingente ou supérfluo, mas um produto que o “liga” ao próprio Criador e suas benesses.

Nesse contexto, muitos fiéis-consumidores podem cair em maus lençóis. A coerção psicológica de certos líderes religiosos mostra-se descaradamente cruel. “Há líderes que evocam para si a condição de plenipotenciários, detentores da verdade última, deslegitimando qualquer critica por parte dos fiéis”. (P. 91). Exemplos de fiéis-consumidores que colocaram essas igrejas no pau proliferam Brasil a fora. Em muitos casos, essas instituições foram obrigadas pela justiça a ressarcirem os “rebeldes” que lhes denunciaram.

“As expressões religiosas de massa assemelha-se, em muitos momentos, a um verdadeiro Shopping Center. Basta, nesse sentido, que o consumidor da fé, apresente suas intenções que, ao que parece, há um grupo [de] líderes religiosos prontos para atenderem a demanda.” P. 36.

Basta ver a proliferação de livros de autoajuda católicos, evangélicos e espíritas. Cada seguimento querendo o seu quinhão financeiro. Nesse quesito o catolicismo é perito desde a Idade Média, com a venda de lugares nos céus, santinhos, crucifixos, imagens e todo tipo de parafernália “sagrada”.

“Numa realidade social em que tudo pode ser alvo de consumo, os fieis não têm dificuldades de se transformarem em consumidores dos bens representativos do sagrado. Com essa avidez pelo consumo, os viciados em consumos de bens e serviços no mercado de consumo, não apresentam dificuldades em [consumir] bens simbólicos de religião, pois o próprio símbolo é conferido em ambientes mágico-religiosos.” P. 73.

A mentalidade consumista (do convertido) que antes consumia coisas “mundanas” e “sacrílegas”, tais como bebidas, cigarros e etc., agora dá lugar aos bens “sacros”, vindos do “céu”. Os exemplos pipocam: DVDs, CDs, livros... Fora os bens abstratos (esses são os piores), como a coerção para dar o dízimo/trízimo/oferta para obter a benção de deus nas finanças, saúde... Bens abstratos que se transformam em bens concretos, na cabecinha deles.

No meio neopentecostal, o rebanho em questão, acaba trocando um determinado tipo de vício e escravidão, quando era do “mundão”, por outro, que em não raras ocasiões é até bem pior. Tornam-se reféns de pastores que lhes incutem um terror psicológico bastante eficiente e difícil de erradicar. Visto que agora, se eles não acatarem os “ensinamentus di amor”, vindo desses “homis di deus”, estarão assinando o seu atestado de rebeldia contra o todo-poderoso. E aí, meu fí, prepare us coru.

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