quarta-feira, 20 de julho de 2016

Escravidão, Reforma e Imperialismo


GRAHAM, Richard. Escravidão, Reforma e Imperialismo. São Paulo: Perspectiva, 1979.

Richard Graham (Professor Emérito de História na Universidade do Texas, EUA) traz nesse livro, uma coletânea de oito textos de sua autoria escritos nas décadas 1950-1970, sobre o sistema escravagista e a subserviência do Brasil a Inglaterra, no século XIX. A princípio pode-se pensar que seus textos sejam chatos e arcaicos, por terem sido escritos há tanto tempo, porém, a leitura se mostrou muito agradável em todos os capítulos.

No primeiro capítulo, publicado em 1970, ele faz uma recapitulação dos principais estudos feitos até então sobre a escravidão brasileira. Nomes como Fernando Henrique Cardoso (na época ainda não era bandido), Emília Viotti, Florestan Fernandes, Octávio Ianni e Paula Belguelman. Na verdade, esses autores foram estudiosos pioneiros nos estudos acadêmicos sobre o escravismo.

Graham num certo momento pergunta:

"'Brasil, a terra da harmonia racial', não será esta frase um meio para encobrir profundas divisões raciais no país?" P. 15.

Não tenho dúvidas, de que muitas pessoas que falam isso, fingem pensar que estamos vivendo numa sociedade igualitária. O que não é o caso. O Brasil tanto na década em que o texto do Graham foi escrito, como hoje, quase 50 anos depois, ainda sofre as consequências do escravismo.

A Emília Viotti (Ph.D em História na USP) e
screve:

“A idealização da escravatura, a idéia romântica da suavidade e brandura da escravatura do Brasil, a descrição do escravo leal e do senhor benevolente, amigo do escravo – interpretação que acabaram prevalecendo em nossa literatura e em nossa história – foram alguns dos mitos forjados por uma sociedade escrava para defender um sistema considerado essencial.” P. 15.

O pior é que ainda existem leigos que tentam atenuar o sistema da escravidão. São os “seguidores” de Gilberto Freire, mesmo nem sabendo de sua obra Casa Grande e Senzala. Muitas vezes fica implícito em suas falas, que a escravidão praticada pelos europeus apesar de ser errada, não foi tão “cruel" assim, visto que na África também existia o ignominioso escravismo entre as diversas nações ali presentes. Como se um erro fosse justificativa para se cometer esse mesmo erro, agora perpetrado por outros povos. Não falo de todos, pois seria um equívoco de minha parte, entretanto, muitos dos que argumentam por essa via, são racistas sim. Nem tudo é racismo, é verdade, mas não podemos deixar que o mito tão bem explanado pela Viotti continue deixando o seu rastro de inverdades.  

“O fato de no Brasil de hoje o pobre ser predominantemente negro e a maioria da gente de cor ser pobre é a moderna herança de um passado alienante e desumanizante, uma alienação e desumanização que constituem uma parte excessivamente grande no Brasil atual.” P. 40.

Basta lembrar que apenas 2,6% dos pretinhos têm diploma universitário e somente 1,9% são empregadores. Diante desse quadro de desigualdade evidente e gritante, como podemos dizer que as consequências do passado odioso da escravidão terminaram? Quem ousaria abrir a boca e dizer que os de cor são mais preguiçosos, menos inteligentes e, que por isso, estão na base da sociedade brasileira? Se depois de quase 130 anos que a servidão forçada acabou, o negro contra a sua vontade, permanece nos trabalhos menos valorizados, é porque algo está muito errado no sistema social, econômico, político e cultural de nosso país.

Quanto à mobilidade dos escravos na sociedade escravista, Graham nos diz:

"[...] o escravo [no Brasil] não era um cidadão, e era-lhe negado o direito de carregar armas, de arrendar ou possuir propriedades, de vestir certas roupas, andar de bonde, ficar fora de casa à noite, reunir-se, e ter todas as pequenas liberdades que definem a vida de um homem livre. O mesmo crime seria punido mais asperamente no escravo do que nos outros. E os escravos fugitivos eram caçados impiedosamente." P. 32-31.

Esse livro foi escrito há algumas décadas, talvez algumas dessas características, não se encaixem nos escravos de ganho (cativos urbanos, que dispunham de uma ínfima liberdade). Pelo que lembro, pesquisas posteriores evidenciaram uma maior mobilidade dos cativos. De todo jeito, os negros eram pessoas de segunda categoria; inferiores; não civilizados, segundo a ótica da população branca, seja portuguesa ou nascida no Brasil.

Em 1888 veio a tão sonhada liberdade, depois de mais de três séculos, a escravidão extinguiu-se. Mas o negro ficou abandonado, não houve compensação alguma pelos maus tratos e humilhações sofridas. Até comemorações houve nas cidades, mas não passaram de meras frivolidades, diante da nova dura realidade que estava esperando os recém-libertos.

“No dia 13 de maio de 1888, a princesa regente assinou a Lei abolindo a escravidão no Brasil sem compensação. Durante um mês realizaram-se festas em quase todas as cidades do Brasil com fogos, discursos e desfiles. No interior, contudo, pequeno foi o júbilo. Os próprios escravos estavam desorientados sem saber o que fazer com a liberdade. Muitos andavam em bandos nas cidades à procura de seus companheiros que anteriormente haviam fugido das fazendas.” P. 77.

Uma boa parte do livro se volta para tensa relação entre Brasil e Inglaterra, principalmente com o representante inglês, William Dougal Christie. O Brasil se via submisso à maior potência mundial. Os produtos ingleses tinham grandes privilégios na importação brasileira.

“Ao mesmo tempo, as mercadorias inglesas inundaram o mercado brasileiro, e a importação tornou-se a maior preocupação dos ingleses no Brasil.” P. 131.

O controle comercial da Inglaterra era hegemônico, nada escapava das mãos dos ingleses. Controlavam a navegação, eram superiores na tecnologia e indústria.

“Dominavam de tal forma o comércio brasileiro desse tempo que até as cotações do mercado no Jornal do Comércio do Rio eram dadas em português e em inglês. [...] O controle inglês sobre o comércio brasileiro foi resumido pelo ministro brasileiro em Londres que escreveu em 1854: ‘O comércio entre os dois países é feito com capitais ingleses, em navios ingleses, por companhias inglesas. Os lucros... os juros, sobre o capital... os pagamentos de seguros, as comissões, e os dividendos dos negócios, tudo vai para os bolsos de ingleses’.” P. 132.

O Brasil tinha deixado de ser colônia de Portugal, mas passava a ser colônia, digamos, não oficial dos britânicos durante todo o século XIX. A própria Inglaterra se achava uma nação superior. Os ingleses que aqui se estabeleceram tinham fórum privilegiado.

A relação anglo-brasileira constantemente estava sob muita tensão, devido ao tráfico de escravos, que ainda acontecia por aqui. Como o Brasil não estava cumprindo o acordo de não traficar mais cativos da África, os britânicos sempre estavam apresando os seus navios. Às vezes os navios nem transportavam escravos, mas mesmo assim, os ingleses os apreendiam.

“Navios que não conduziam escravos, ainda que carregando equipamento para o tráfico de escravos, eram apreendidos ilegalmente sem indenização posterior; algumas vezes eram concedidas indenizações, mas elas não eram pagas, e outras vezes o pagamento posterior pelo prejuízo causado nos navios apresados era pequeno e injusto.” P. 82.

Graham em dois capítulos discute dois casos específicos que quase colocam o Brasil numa situação extremamente séria diante da Inglaterra.  O primeiro foi o naufrágio do navio britânico Prince of Wales, no atual Estado do Rio Grande do Sul, que causou um grande estresse a ambos os países. Christie, representante da Inglaterra, exigia indenização por parte do governo imperial. O segundo impasse foi sobre os oficiais ingleses do Forte, que foram presos, acusados de fazerem badernas. A importância da diplomacia do Barão de Mauá junto aos ingleses também recebe uma atenção especial.

Depois Graham volta-se mais uma vez para a escravidão, historiando o movimento abolicionista e seus principais proponentes, sua política e modo de operar junto à sociedade, escravos e senhores; e sobre a aceitação do sistema republicano dos ex-senhores de escravos.

Pronto. Mais um resumo bem desorganizado de um livro.

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Caminhos da Reportagem: Ecos da Escravidão


Caminhos da Reportagem é um dos poucos programas da TV aberta do Brasil, que nos transmite assuntos/temas interessantes e relevantes. Como não é novidade nesse blog, mais uma postagem resumindo algo sobre a escravidão no Brasil.

O Estado brasileiro durante séculos, vergonhosamente praticou a escravidão, independente de ela ferir a dignidade de milhões de seres humanos. Pode-se dizer que o Estado do Brasil foi fundado tendo o trabalho escravo como o seu principal alicerce. Nas palavras do Historiador Marcus Carvalho (Ph.D em História pela Universidade de Illinois, EUA):

“A escravidão marcou de uma forma muito maligna a história do Brasil.”

E não só do Brasil, mas de toda a América Latina e América do Norte. Seja o negro, seja o indígena, no continente americano os europeus se acharam no pleno direito de determinar como vidas humanas deveriam lhes render exorbitantes lucros. Não importava se para isso, elas fossem arrancadas de suas terras e cultura, ou fossem mortas. Como diz Merced Guimarães, do Instituto de Pesquisa Memória de Pretos Novos – RJ:

“Eu vejo uma história de um crime contra a humanidade.”

Quase cinco milhões (46% de todos os escravos trazidos paras as Américas) de africanos vieram a contragosto para o nosso país. Na vinda para cá, muitos acabavam morrendo, devido a situação completamente precária dos navios tumbeiros. Numa viagem extremamente difícil, estafante e humilhante, os africanos chegavam às terras brasileiras, para trabalharem que nem animais, nos canaviais, mineração, plantio de café e outras atividades. Um terço da população africana foi tirada de seu lugar de origem.

Os portugueses nem precisavam entrar no território africano, pois os cativos já estavam nos portos, prontos para serem levados para o outro lado do atlântico. Muitas guerras tribais eram o combustível para que o tráfico de escravos vingasse durantes durante quase quatro séculos. A escravidão já existia na África. Povos africanos também escravizavam seus pares. Cabo Verde era um dos principais postos de receptação dos escravos que vinham de outros países.

Na segunda metade do século XIX, a escravidão começou a dar os seus primeiros passos rumo à extinção. A pressão internacional vinda da Inglaterra e os abolicionistas travaram uma longa batalha para que a vergonha da servidão forçada acabasse. Joaquim Nabuco, José do Patrocínio, Machado de Assis e André Rebouças, são alguns dos intelectuais que despontaram na luta a favor da emancipação negra.

Em 1850, foi sancionada a Lei Eusébio de Queiroz, que extinguia o tráfico de escravos. Agora nenhum navio poderia trazer mais cativos do continente africano. Em 1871 foi aprovada a Lei do Ventre Livre, que dizia que a partir daquela data (dia em que a lei foi sancionada), os filhos das escravas seriam libertos. Porém, havia uma ironia macabra aí, visto que os rebentos ainda teriam que trabalhar no regime de escravidão até os seus 21 anos, para compensar a perda que o senhor de escravo estava sofrendo.

O fim da escravidão veio em 13 de maio de 1888. Entretanto os recém-libertos foram deixados à míngua pelo governo, que não lhes deu nenhuma terra, ou direitos plenos, pelos quais eles pudessem alcançar uma vida decente na sociedade brasileira. O resultado desse abandono e racismo, vemos até hoje.

Algumas medidas afirmativas estão sendo tomadas, tentando minimizar as consequências da escravidão, tais como as polêmicas cotas nas universidades. Pesquisas mostram que o desempenho dos alunos cotistas são iguais ou semelhantes aos alunos que não entraram pelo sistema de cotas. A maioria desses alunos negros são os primeiros membros da família a cursar um nível superior.

Apesar de todo antagonismo e argumentação contrária ao sistema de cotas, acho que elas são um paliativo viável no momento. Que o Brasil consiga superar a desigualdade racial, que infelizmente ainda é bastante forte e visível no nosso dia a dia. Não vivemos uma democracia racial. A pobreza do negro e o racismo que ele sofre são os “ecos da escravidão”, que teimam em persistir.

terça-feira, 12 de julho de 2016

Dementes: Edmund Kemp


“Ele cortou a cabeça da mãe e colocou o pênis na boca dela”.

Quando criança degolava as bonecas de suas duas irmãs. Sua mãe o trancava no porão na hora de dormirem, com receio de que ele atacasse sexualmente elas. Depois ele começou a maltratar animais (traço comum de psicopatas). Enterrou um gato vivo, depois de morto, o desenterrou para “brincar” com ele. Tentou morar com o pai, que tinha se separado de sua mãe, mas foi rejeitado por ele. Foi morar com os avós, mas matou os dois. Foi parar em um hospital psiquiátrico aos 15 anos de idade, enganou direitinho os médicos, sendo liberado aos 20 anos.

Na Califórnia recomeçou as suas matanças, assassinando jovens universitárias. Dava carona a elas, as matava e levava os corpos para o seu apartamento. Nele, mutilava as garotas, e fazia sexo com os corpos todos esquartejados. Chegava a fazer sexo oral com as cabeças decapitadas. Depois de satisfazer seus desejos demoníacos e mórbidos, jogava as partes dos corpos em vários lugares da cidade, dificultando assim, o trabalho da polícia em descobrir quem estava fazendo aquilo.

E depois de já ter matado seus avós e seis jovens universitárias, acabou assassinando a sangue frio a sua própria mãe, com um martelo, enquanto ela dormia. Fez sexo oral com a cabeça da mãe. Cortou as cordas vocais e as jogou no triturador. Era uma espécie de vingança, devido às várias broncas que levou da mãe durante toda a sua infância. Nesse momento, sua loucura atingiu o estágio máximo.

Para que a melhor amiga de sua mãe não descobrisse, ele a convidou para ir a sua casa, e quando ela chegou, adivinha? Sim, isso mesmo. Ele tirou também a vida dela. Depois disso, fugiu. Num pequeno ato de sobriedade e sensatez, ele liga para a polícia, foragido no Estado do Colorado e conta o que fez.

Kemp tinha mais de 2 metros de altura, era sempre gentil com as pessoas. Vivia bebendo cerveja num bar muito frequentado por policiais. Estes gostavam de papear com ele. No entanto, sua relação com as mulheres, era bem diferente. Ele as tinha como inimigas. Sentia-se o todo poderoso quando tirava-lhes a vida. Como sofreu abusos emocionais fortíssimos de sua mãe, esse foi um dos fatores que o fizeram fazer o que fez.

O que me intriga nesse episódio, é em pensar na negligência, ingenuidade e incompetência do hospital psiquiátrico que pensou ERRONEAMENTE, que ele estava “curado”, ao ponto de deixá-lo viver livre, leve e solto, depois dele ter ASSASSINADO os seus avós, ainda na adolescência. Isso não é questionado, no vídeo. O resultado foi trágico. Pessoas que matam, mesmo sendo comprovado que tenham cometido o ato infrator, num momento de esquizofrenia aguda, não podem em hipótese nenhuma, ficarem livres. Isso vale para hoje, como já deveria valer na década de 1970, data em que ocorrem os eventos narrados.

Por aí nós vemos, que nem o sistema judicial e psiquiátrico norte-americano está imune de cometer erros grosseiros.   

Um dos entrevistados diz acertadamente, que vários fatores contribuíram para ele fazer tais atrocidades. Desde a genética, a fatores psicológicos e neurológicos, e também ao meio em que viveu de rejeição de ambos os pais.

Mas apesar de fatores alheios a vontade do Kemp, houve uma carga de responsabilidade muito grande da parte dele. Sem esse requisito básico, nenhuma pessoa (mesmo que não apresente distúrbio mental algum) pode ser criminalizada por nada. Visto que fazemos o que fazemos, devido às várias circunstâncias que não podemos controlar.  

Dementes: Harold Shipman


“Calcula-se que o doutor Harold Shipman tenha matado 2084 pessoas, num período de trinta anos, antes de levantar suspeitas.”

O maior serial killer da história! 
Local/locais onde ele assassinava?

Inglaterra, na pacata cidade de Hyde. A maioria dos assassinatos.

Suas vítimas?

As velhinhas.

Como as matava?

Aplicando doses cavalares de morfina.

Por que as velhinhas?

Quando Shipman era um adolescente, sua mãe precisava tomar morfina regularmente por causa de um terrível câncer, ele sempre estava presente, quando o médico vinha aplicar-lhes as injeções. Com isso mente, alguns especulam que em suas milhares de matanças, quisesse “recriar” a cena de sua mãe tomando a droga, com o mórbido detalhe, de que as injeções eram pra dar um fim a vida de suas pacientes.

Como foi pego?

Em 1998, quando tentou falsificar grosseiramente o testamento de sua última vítima, em seu favor. Vários corpos de idosas que foram suas pacientes foram exumados, e todos tinham uma alta concentração de morfina.

Ainda é vivo? Está preso?

O desgraçado cometeu suicídio em 2004, negando todos os seus crimes.

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Os Fatos Sobre Auto-Estima, Psicologia e o Movimento de Recuperação


ANKERBERG, John; WELDON, John. Os Fatos Sobre Auto-Estima, Psicologia e o Movimento de Recuperação. Porto Alegre: Obra Missionária Chamada da Meia Noite, 1999.

John Ankerberg (Mestrado em Divindade e Mestrado em História e Filosofia do Pensamento Cristão, no Trinity Evangelical Divinity School, Bacharel em Artes na Universidade de Illinois, Chicago) e John Weldon (Ph.D em Religiões Comparadas, na Pacific College of Graduate Studies, Austrália; Bacharel em Sociologia na Universidade Estadual da Califórnia) dirigem nesse pequeno livro críticas contundentes as várias escolas da Psicologia.  Eles como cristãos conservadores e fundamentalistas são muito céticos quanto às reivindicações das abordagens psicoterápicas modernas. Mas não fundamentam essa incredulidade baseados apenas em suas crenças religiosas, visto que fazem uso de um amplo número de estudiosos para corroborar suas críticas.

O que fica bem estabelecido no livro, a meu ver, é que independente dos autores serem fundamentalistas ou não, eles alicerçaram bem o seu ceticismo. A abundância de especialistas citados deixa o livro bem persuasivo ao que se propõe.

“Este livro oferece uma argumentação diretamente contrária à psicologia moderna. E isto não se dá por sermos contra o aconselhamento em si; muitos em nossa sociedade contemporânea precisam de aconselhamento de alto nível. Nem somos contra a psicologia em si. O estudo da psique humana, ou da mente e personalidade é uma iniciativa de valor.” P. 8.

Mesmo afirmando que não são contra a Psicologia em si, para eles, grande parte das escolas de Psicologia modernas são puro embustes. O Psiquiatra Thomas Szasz(Professor Emérito de Psiquiatria da Universidade do Estado de Nova Iorque, membro da Associação Americana de Psiquiatria e da Associação Americana de Psicanálise) diz:

“[nem] todas as assim chamadas psicoterapias são coercivas, fraudulentas, ou de outra sorte más... [ainda assim] o que desejo salientar é que muitas, talvez até a maioria, das assim chamadas práticas psicoterápicas sejam daninhas para os chamados pacientes... e que todas essas intervenções e propostas deveriam, por isso ser tidas como maléficas até que se prove o contrário.” P. 11.

Para o estranhamento de muitos, a Psicologia parece não ser tão eficaz quanto se pensa, a despeito de tantas pessoas estarem fazendo terapias. William Kirk Kilpatrick (Ph.D em Psicologia na Universidade de Purdue, Mestrado em educação na Universidade de Harvard e Professor Associado de Psicologia Educacional da Faculdade de Boston) escreve:

“O fato de psicólogos estarem tentando ajudar as pessoas frequentemente nos inibe de perguntar se eles sabem fazê-lo... boa parcela de pesquisa sugere que a psicologia é ineficaz. E existe até evidência apontando para a conclusão de que a psicologia é, de fato, maléfica.” P. 11.

Dorothy Tennov (Ph.D em Psicologia na Universidade de Connecticut) diz sem pudor, que a psicoterapia é:

“[...] emocionalmente exaustiva, cara, demorada, potencialmente viciadora, e de alta periculosidade... a profissão não oferece ao consumidor qualquer segurança de proteção.” P. 12.

Martin L. Gross (Professor Associado Adjunto de Ciências Sociais da Universidade de Nova Iorque) dispara:

“[...] um argumento sério, e por vezes amargo, irrompe dentro da própria profissão. Especificamente, a questão é se a psicoterapia é uma ciência ou uma superstição enobrecida como disciplina.” P. 12.

A medida em que se vai lendo cada parágrafo, o ceticismo quanto a eficácia da Psicologia/Psicoterapia só aumentam. Para completar, nos é dito:

“Uma análise de aproximadamente 500 laudos psicoterápicos concluiu que ‘não estamos cientes de sequer uma demonstração convincente de que os benefícios da psicoterapia excedem aqueles de placebos para pacientes reais.” P. 12-13.

Para quem pensa em ver ainda a psicologia/psicoterapia como uma ciência coerente, o livro traz essa importante conclusão de um amplo estudo:

“Será que a psicologia e a psicoterapia são ciências coerentes? Para responder a essa importante questão, a Associação Psicológica Americana designou Sigmund Koch para dirigir um estudo a ser patrocinado pela Fundação Nacional da Ciência.

Aquele estudo foi efetuado por oitenta peritos eminentes que avaliaram os fatos, as teorias e os métodos de psicologia. Os resultados dessa extensa iniciativa foram publicados numa série de sete volumes intitulada [...] Psicologia: Um Estudo de uma Ciência. Após examinar os resultados, Koch conclui: ‘Eu penso que a esta altura está total e finalmente claro que a psicologia não pode ser uma ciência coerente’.” P. 19.

Ele continua:

“[...] a psicologia dificilmente lida com verdades ou fatos estabelecidos, mas com opiniões e interpretações subjetivas de observações não controladas. [...] Através da história da psicologia como ‘ciência’, o conhecimento propriamente dito que ela tem trazido tem sido uniformemente negativo.” P. 19.

O que dizer diante da conclusão desse exaustivo estudo publicado pela própria Associação Psicológica Americana? Fica difícil argumentar numa via contrária.

E parece que existe uma paranoia entre muitos Psicólogos em dizer que todo mundo precisa de terapia. Não importa o quanto à pessoa esteja saudável, sempre irão dizer que ela precisa de algumas sessões. Inventam crises existenciais, onde não tem. Quanto a isso, mais uma vez Szasz com a palavra:

“Em mais de 20 anos como psiquiatra, jamais conheci psicólogo clínico contar, com base em testes de projeção, que o paciente era ‘uma pessoa normal, mentalmente sadia’... Não há comportamento ou pessoa que um psiquiatra moderno [ele não quis dizer psicólogo?] não possa plausivelmente diagnosticar como anormal ou doentio.” P. 27.

Bernie Zilbergeld, (Ph.D em Psicologia na Universidade da Califórnia) revela:

“De 500 pessoas que compareceram para uma avaliação numa grande clínica nova-iorquina, recomendou-se que todas, exceto quatro, fossem submetidas a terapia. Imagine só a algazarra se fosse recomendada uma cirurgia para 99% dos pacientes que procurassem uma clínica médica.” P. 27.

Os autores complementam:

“Aliás, uma série de testes têm sido feita com indivíduos que estão absolutamente contentes com a vida que levam e que têm poucos problemas – se é que os têm. Quando tais pessoas foram enviadas aos diversos terapeutas e clínicas, a avaliação psicológica invariavelmente concluiu que elas precisavam de terapia” P. 27-28.

Os Psicólogos mais entusiastas talvez digam que eles possuem as ferramentas metodológicas e conceituais corretas para detectar a suposta mazela psicológica das pessoas. Todas precisam de terapia, apenas ainda não perceberam do quanto precisam da ajuda deles.

Donald Klein (Professor Pesquisador do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Nova Iorque) admite sua descrença quanto a eficácia da terapia:

“Eu creio que, no momento, a evidência científica quanto à eficácia da psicoterapia não pode justificar o uso de verbas públicas.” P. 31.

Jay Constatine (Chefe do Departamento de Profissionais da saúde) é mais um estudioso do tema citado, que diz:

“Não há, virtualmente, nenhum caso de estudos clínicos controlados, levados a efeito e avaliados de acordo com os princípios científicos normalmente aceitos, que confirme a eficácia, a segurança e a utilidade da psicoterapia, como vem sendo feita hoje em dia.” P. 31.

E não para por aí, Orval Hobart (Ex-Presidente da Associação Americana de Psicologia) é mais um incrédulo, que escreve:

“Mas, com o passar dos anos, eu venho me desencantando progressivamente com os resultados da psicoterapia e de sua teoria subjacente. [...] Estou convicto de que, no geral, a psicoterapia não faz maior bem a seus pacientes.” P. 32.

Michael Sheperd (Ph.D em Psiquiatria pela Universidade de Oxford e Pesquisador do Instituto de Psiquiatria de Londres) assinala:

“Uma imensa gama de estudos já concluídos que, em meio à sua imperfeição, deixaram claro que (1) qualquer vantagem resultante da psicoterapia é pequena, na melhor das hipóteses; (2) a diferença entre efeitos dos diferentes tipos de terapias é desprezível; e (3) intervenção psicoterápica tem possibilidade de causar danos.” P. 32.

O Psiquiatria Garth Wood (Universidade de Cambridge) é outro crítico que diz:

“[...] [foi] conclusivamente demonstrado, para a satisfação de todos – exceto dos extremistas da psicologia – que, em termos de resultados (mas de dinheiro), todas as formas de psicoterapia se equivalem. Cada psicoterapia funciona tão precariamente quanto as demais.” P. 32.

Diante de tudo que já foi dito, é muito mais sensato termos amigos verdadeiros que possam nos ouvir, e se possível nos ajudar. Nos poupará dinheiro e provavelmente terá um melhor efeito sobre nossa mente. É exatamente isso, que 42 estudos divulgados pela Universidade do Sul de Illinois conclui:

“Paraprofissionais atingiram resultados clínicos iguais ou significativamente melhores que aqueles obtidos por profissionais... Além do mais, instrução profissional formal, treinamento e experiência no campo da saúde mental não parecem ser pré-requisitos necessários para uma pessoa ser eficaz na ajuda aos outros.” P. 33.

Em confirmação, Gary Collins (Ph.D em Psicologia na Universidade de Purdue, EUA) aponta que:

“Há pouca evidência de que profissionais ‘obtém melhores resultados – com qualquer tipo de cliente ou problema – que aqueles com pouco ou nenhum estudo formal. Em outras palavras, a maioria das pessoas provavelmente poderá obter o mesmo tanto de ajuda de amigos, parentes, e outros’, inclusive de pastores.” P. 33-34.

Ou seja, melhor conversamos com amigos, familiares, padres e pastores confiáveis.

Agora vamos aos pontos fracos dos autores. Eles como Teólogos evangélicos fundamentalistas acabam cometendo algumas incoerências. Eles dizem:

“Se a psicologia fosse uma ciência verdadeiramente coerente, seria de se esperar que haveríamos de encontrar nela um montante considerável de concordância entre suas ramificações, como acontece na biologia ou na química. Em lugar disso, encontramos centenas de psicoterapias e milhares de técnicas terapêuticas, todas diferentes ou conflitantes, e ainda assim todas reivindicando realizarem a mesma façanha: curar as pessoas de seus problemas.” P. 18.

Estranho que isso venha de dois Teólogos, visto que a discordância na área deles, é talvez mais vasta que na área da Psicologia! Quantas interpretações sobre a Bíblia, sobre Deus, sobre Jesus, existem no meio protestante? Milhares! Ankerbeg e Weldon já escreveram vários livros contestando as posições doutrinárias de vários de seus pares. Eles irão rejeitar/abandonar a Teologia por causa da algazarra existente na área de estudo deles? Nunquinha! Modificando um pouco o que eles disseram, o enunciado ficaria assim:

“Se a Teologia Evangélica e a Bíblia fossem uma ciência (área de conhecimento) verdadeiramente coerente, seria de se esperar que haveríamos de encontrar nela um montante considerável de concordância entre suas ramificações, como acontece na biologia ou na química. Em lugar disso, encontramos centenas de teologias/igrejas/seitas/doutrinas e milhares de técnicas espirituais, todas diferentes ou conflitantes, e ainda assim todas reivindicando realizarem a mesma façanha: curar as pessoas de seus problemas e levá-las para mais perto de deus e para o paraíso.” 

Nas páginas finais, eles deixam claro que a anorexia e o alcoolismo não são doenças, mas sim, erros morais. Por que fazem isso? Como eles podem ignorar as pesquisas científicas que mostram que algumas pessoas já nascem propensas a ter essas doenças? Não será pelo motivo de serem evangélicos ultra-conservadores, que os impedem de ver aspectos da realidade que contradizem sua visão religiosa tão estrita? O que uma menina com anorexia iria sentir lendo que ela está na situação que está, porque está em "pecado"? 

sexta-feira, 1 de julho de 2016

O Escândalo do Comportamento Evangélico


SIDER, Ronald J. O Escândalo do Comportamento Evangélico. Viçosa, MG: Ultimato, 2006. 

Os evangélicos são conhecidos em apontar o “erro” da sociedade que não se identifica com os padrões de comportamento ensinado por eles. Sempre com o dedo em riste condenam o quanto a população precisa de Deus, alias, do seu deus. As pessoas estão em pecado, em rebeldia, em desobediência, em rebelião contra a divindade – e caso não venham o mais rápido para suas igrejas e comecem a comungar de seus valores, irão sofrer a ira divina. Colocam-se como os guardiões da Moralidade e da Ética. São os exemplos dos bons costumes e de como a sociedade deve se comportar. Mas a realidade é ironicamente bem diferente.

Não precisaríamos nem de um livro, nem de pesquisas ou artigos acadêmicos, para constatar algo tão abertamente patente aos nossos olhos. Não obstante, felizmente, muitos olhares de dentro do mundo protestante têm denunciado a hipocrisia reinante nesse ambiente. Ronald J. Sider (Ph.D em História na Universidade de Yale), que já lecionou nas Universidades de Yale, Harvard, Princeton e Oxford, traz nesse livro dados assustadores e realistas sobre a situação daqueles que se dizem “nascidos de novo”. É tão crítico o estado dos evangélicos, que George Barna (Sociólogo e Pesquisador evangélico) admite:

“O cristianismo norte-americano fracassou grandemente desde meados do século 20.” P. 15.

Apenas digo que o Barna ameniza a questão. O cristianismo nos EUA sempre fracassou, visto que nos séculos anteriores, a escravidão fez parte da dinâmica social e econômica desse país. Como um povo que diz seguir a lei do amor ao próximo, como ensinou Jesus, poderia aprovar um sistema tão desumano quanto este? E pior: quando a escravidão acabou, o racismo apenas aumentou. E com a diferença grotesca de que a discriminação foi e ainda é maior nos estados com a maior concentração de “nascidos de novo”. 

Os evangélicos são conhecidos por terem um discurso de valorização do casamento, rejeitando, portanto, o divórcio. Mas inúmeras pesquisas mostram que na prática o discurso não passa meramente de um palavreado vazio.

“Em agosto de 2001, uma nova pesquisa demonstrou que a taxa de divórcio era a mesma para os cristãos nascidos de novo e a população em geral.” P. 18.

Brad Wilcox (Ph.D em Sociologia na Universidade de Princeton), estudioso de temas ligados a família diz:

“Comparados ao resto da população, os protestantes conservadores têm mais propensão a se divorciar.” P. 19.

Com relação às contribuições na área social, Sider destaca que os cristãos protestantes têm contribuído muito pouco para erradicação da miséria.

“Observemos a agenda pública de movimentos políticos e coalizões evangélicas de destaque. Quase nunca a justiça em favor do pobre aparece como uma área de preocupação ou esforço significativo.” P. 21.

“Como evangélicos afirmamos ter a Bíblia como nossa autoridade final. Um dos temas mais recorrentes nas Escrituras é que Deus e seu povo têm uma preocupação especial para com o pobre. Então por que essa contradição gritante entre crença e prática?” P. 22.

Voltando a questão familiar, outro ponto muito enfatizado e “valorizado” pelos protestantes, é o casamento ser oficial; no papel; reconhecido no mínimo pelo Estado. Se não casou na igreja, que pelo menos só passe a viver como um casal depois de terem oficializado a união perante as autoridades competentes. Pois bem, nessa altura, já não sendo mais novidade, a realidade é bem outra.

“Uma reportagem no The New York Times relatou que, de acordo com dados do censo, em 1990 o número de casais não casados vivendo juntos aumentou muito mais no Cinturão da Bíblia (onde grande parte da população é evangélica) que nos Estados Unidos como um todo. No país o aumento foi de 72%. Mas em Oklahoma, ele foi de 97%; no Arkansas, de 125%; e no Tennesse, de 123%.” P. 23. 

Entre os jovens a taxa de sexo antes do casamento é bem alta. Não existe diferença significativa entre a juventude evangélica e a mundana. Meninos e meninas da igreja estão fazendo muito sexo.

“A juventude evangélica tem uma probabilidade apenas de 10% menor de fazer sexo antes do casamento que os não-evangélicos.” P. 23.

No tocante ao racismo, para os que pensam que a comunidade dos “seguidores” de Jesus não despreza as pessoas pretinhas, estão bem enganados. O racismo entranhado nos Estados Unidos não faz distinção entre os que estão na igreja protestante e os que não a frequentam. O crime da discriminação pela simples quantidade de melanina persiste com muita intensidade, com o agravante, de que os evangélicos são os mais racistas!

“Em 1989 George Gallup Jr. e James Castelli publicaram os resultados de uma pesquisa para determinar quais grupos nos Estados Unidos eram mais propensos a rejeitar vizinhos negros – um bom indicador de racismo. Católicos e cristãos não evangélicos foram classificados entre os menos propensos; 11% fizeram objeção ao contato entre negros e brancos. Os protestantes históricos chegaram próximo dos 16%. Com 17% batistas e evangélicos ficaram entre aqueles mais propensos a repudiar a possibilidade de ter vizinhos negros, e 20% dos batistas do sul rejeitaram a ideia de ter vizinhos negros.” P. 25.

E não para por aí, há algumas décadas, até os líderes da igreja...

“Durante o movimento de direitos civis, quando os protestantes históricos e os judeus se uniram aos afro-americanos em sua luta histórica por liberdade e igualdade, líderes evangélicos foram quase totalmente omissos. Alguns se opuseram ao movimento; outros não se pronunciaram. Quando Frank Gaebelein, então co-editor de Christianity Today, não apenas cobriu a marcha de Martin Luther King sobre Selma, como também endossou o movimento e a ele se juntou, experimentou oposição e hostilidade da parte de outros líderes evangélicos.” P. 25.

Sider mesmo sendo um evangélico não se esquiva da hipocrisia que reina absoluta no seio da igreja protestante. E ainda sobre o racismo, ele continua:

“Michael O. Emerson e Christian Smith escreveram um livro crucial [...] explorando as atitudes racistas presentes no mundo evangélico. Concluíram que ‘o evangelicalismo branco provavelmente faz mais para perpetuar a sociedade racista do que para reduzi-lá’. Os protestantes conservadores brancos têm mais que o dobro de propensão que os outros brancos de apontar falta de motivação entre os negros (e não a discriminação) como fator responsável pela desigualdade entre brancos e negros. Os protestantes conservadores são seis vezes mais propensos a citar a falta de motivação que o acesso desigual à educação.” P. 27.

Diante dessa trágica e demoníaca realidade, Sider tristemente pergunta:

“[...] como é possível que os evangélicos sejam as pessoas mais racistas e preconceituosas de nossa sociedade?” P. 47.

Eu também pergunto como é possível, que o povo que se julga o mais santo da face da terra, pode ter uma práxis tão destoante daquilo que diz seguir. Os evangélicos que são conhecidos em criticar os católicos são mais racistas que estes! Como conciliar a discrepância gritante em afirmar possuir ter o Espírito do Criador, com suas ações e práticas tão vergonhosas? O que fica claro é à distância quilométrica entre o que dizem e o que fazem de fato. Lógico que não são todos, e o Sider sabe muito bem disso. Mas os números são altos demais; é uma porcentagem elevada demais, o que descaracteriza o universo evangélico como o “sal da terra e luz do mundo”, como eles gostam de se ver.

Apesar de nos apresentar esses dados que diminuem drasticamente à credibilidade do universo evangélico, Sider não está totalmente desesperado, ele crê que existe esperança para a comunidade evangélica. Eu não tenho.

O Escândalo do Comportamento Evangélico é muito mais do que foi resumido aqui. Mas por ora, basta. 

Livro recomendado.