segunda-feira, 14 de novembro de 2016
Foucault em 90 Minutos
sábado, 12 de novembro de 2016
Em Favor da Dúvida
BERGER, Peter L.; ZIJDERVELD, Anton. Em Favor da Dúvida. Rio de Janeiro: Campus, 2012. (PDF).
"Se não tivéssemos as dúvidas, onde, então, haveria uma certeza jubilante?" P. 04. - Johann Wolfgang von Goethe (importante literato alemão dos séculos XVI-XVII)
Peter Berger (Ph.D em Sociologia, ex-Professor nas Universidades Rutgers, de Boston, da Geórgia e da Carolina do Norte.) e Anton Zijderveld (Ph.D em Filosofia na Universidade Erasmus de Rotterdam), fazem um inteligente apelo a favor da moderação em questões religiosas, políticas e morais.
Religião, seitas, tradicionalismo, ceticismo, moralidade, fundamentalismo, relativismo, marxismo, Estado, democracia, instituições civis, secularização...
Disparam suas críticas com muita agudeza contra o marxismo, fundamentalismo e relativismo.
Incentivam a dúvida SINCERA, e rejeitam a dúvida pela DÚVIDA. A dúvida SINCERA nos conduz a convicções fundamentadas. A dúvida pela DÚVIDA paralisa.
"Tanto a incerteza extrema quanto a certeza extrema são perigosas. [...] Segue-se a isso que é necessário buscar ocupar um posicionamento moderado, equidistante do relativismo e do fundamentalismo". P. 67.
Os autores entram brevemente no campo moral, fazendo críticas tanto aos que são contra, quanto aos que são a favor do aborto, mostrando as falhas argumentativas de ambos os lados.
Berger e Zijderveld posicionam-se totalmente contrários a tortura, perpetradas por alguns governos, para arrancar confissões de criminosos, alegando que tal prática fere a dignidade humana, por mais que o torturado seja realmente culpado.
E também são veementemente contra a pena de morte, enfatizando que nesse caso, a Europa é moralmente superior a América, nesse quesito, por tê-la eliminado há muitos anos.
Quanto a esses três pontos mencionados (aborto, tortura e pena de morte), não sou contra nenhum, dependendo do contexto em que eles estão inseridos, é claro.
Aborto: não consigo me alinhar aos que o igualam a assassinato, pelo menos quando ocorre nas primeiras semanas de gravidez, e estupro. Mas não consigo compactuar com muitos do grupo pró-escolha, que defendem o aborto até os últimos estágios da gravidez.
Tortura: criminoso hediondo tem que ser torturado mesmo, caso sua confissão possa levar as autoridades a prender os bandidos. Se possível, arrancando as unhas, os dedos, levando choques... Tem que sofrer mesmo.
Pena de Morte: que seja aplicada a pessoas que de fato foram provadas culpadas por crimes horrendos.
Alguns trechos:
“Os protestantes continuaram a executar hereges e queimar bruxas em fogueiras com o mesmo entusiasmo que seus adversários católicos”. P. 08.
Um típico exemplo de fanatismo que não foi exclusividade do catolicismo, mesmo que em menor grau, suponho.
“O que ocorre em condições de autêntica pluralidade [de ideias, visões de mundo, religiões] pode ser incluído em uma categoria utilizada na sociologia do conhecimento: "contaminação cognitiva". Isso se baseia em uma característica básica humana: se as pessoas dialogam umas com as outras, com o tempo começam a influenciar o modo de pensar uma das outras. À medida que tal "contaminação" vai ocorrendo, as pessoas têm cada vez mais dificuldade de caracterizar as crenças e os valores alheios como perversos, insanos ou nocivos. Lenta, porém inevitavelmente, dissemina-se o pensamento de que talvez os outros tenham razão. Com esse modo de pensar, a visão de realidade antes aceita sem questionamento é abalada”. P. 14.
Viva a “contaminação cognitiva”. Isso é ótimo.
“A noção de contaminação cognitiva, antes mencionada, tem raízes no seguinte fato básico: na qualidade de seres sociais, somos continuamente influenciados pelas pessoas com as quais dialogamos. Esse diálogo, mais ou menos inevitavelmente, alterará nossa visão da realidade. É um fato, portanto, que, se quisermos evitar essa mudança, precisaremos escolher com muito cuidadoas pessoas com quem conversamos. O psicólogo Leon Festinger cunhou o conceito extremamente útil de "dissonância cognitiva" - significando informações que contradizem visões previamente mantidas - ou, mais precisamente, visões previamente mantidas nas quais temos algo a perder.
[...]
O que Festinger descobriu não deveria nos surpreender: as pessoas tentam evitar a dissonância cognitiva. A única maneira de evitá-la, contudo, é evitar os 'portadores' da dissonância. [...] Portanto, os indivíduos que sustentam a posição política X evitarão ler jornais que tendem a apoiar a posição Y. De forma similar, esses indivíduos evitarão conversar com Y-istas e buscarão conversar com X-istas. Quando as pessoas têm grande interesse pessoal em determinada definição da realidade, como uma posição religiosa ou política profundamente arraigada ou convicções que se relacionam diretamente a seu estilo de vida [...], farão de tudo para criar defesas tanto comportamentais quanto cognitivas." P. 29.
Todos fazemos isso em maior ou menor grau. Melhor manter nossas "verdades" intocadas, né não?! Muitas certezas e verdades foram gravadas a ferro e fogo em nossas mentes! Quem são os outros para destruir "verdades" tão preciosas e fundamentadas na realidade?! Mesmo que essas "verdades" sejam mentiras, melhor permanecer nelas. Primeiramente, compromisso com nosso conforto emocional-cognitivo! Lasque-se a Verdade.
“[...] em todo relativista há um fanático esperando para se manifestar no derradeiro absoluto e, em cada fanático, há um relativista esperando para ser liberado de quaisquer e todos os absolutos”. P. 40.
Nas universidades, muitos Professores relativistas são os mais convictos. Na prática negam o que falam em seus discursos rebuscados e enganosos.
Algumas refutações ao relativismo:
“Todas as formas de relativismo contradizem a experiência da vida comum, fundamentada no bom-senso. [...] O bom-senso está ciente de uma realidade externa que resiste aos nossos desejos e que pode ser objetivamente acessada por procedimentos razoáveis. Até um teórico pós-modernista vive no dia a dia com base nessa premissa. Suponha que um pós-modernista procure o médico para uma consulta. Ele quer saber se um tumor é benigno ou maligno. Ele espera que o médico lhe dê uma resposta com base em métodos objetivos de diagnóstico e que o faça independentemente de sentimentos pessoais em relação ao paciente. Ou suponha que um estudante tenha submetido um trabalho escolar. Ele espera que o instrutor lhe dê uma nota "justa" - isto é, que o faça objetiva e independentemente de quaisquer sentimentos pessoais. [...] Há algo de errado com uma teoria que contradiz a experiência que se evidencia com clareza na vida cotidiana. O propósito de uma teoria é elucidar a experiência, e não negá-la.” P. 52-53.
"O fato de a verdade ser passível de refutação não significa que não exista uma verdade 'indubitável'. Temos, para começar, as regras básicas matemáticas, que ninguém, em sã consciência, sujeitaria à dúvida ou à refutação. [...] Basta dizer que há proposições básicas na lógica, como o silogismo, que, em geral, são consideradas indubitáveis - isto é, absolutamente verdadeiras. 'Os seres humanos são mortais; Sócrates é um ser humano; logo, Sócrates é mortal.' Esse é um exemplo do silogismo mais básico, contendo uma verdade indubitável". P. 68, 69.
Eles admitem que esse tipo de proposição, apesar de se mostrar verdadeira em quaisquer circunstâncias, ainda sim, não "diz respeito à verdade e à certeza pelas quais ansiamos na vida cotidiana". P. 69. Isso procede, mas mesmo assim, é sempre bom ver Sociólogos de peso, que não se curvaram diante dos contra-sensos do pós-modernismo. A busca pelas verdades mais elevadas, se é que podemos dizer assim, continuam. E não será o preguiçoso modo de pensar dos pós-modernos, que irá refutar a existência das Verdades Objetivas, Absolutas, ou Universais.
"A verdade é perpetuamente obscurecida pela dúvida e pela insegurança. Só o 'verdadeiro crente', que adotou fervorosamente um ou outro 'ismo' religioso ou filosófico, conseguirá abafar aos gritos as vozes da dúvida". P. 70.
"Darwin é, para muitos ateus, uma espécie de profeta semirreligioso, o fundador de uma doutrina chamada darwinismo". P. 80.
Ah, isso ele é mesmo. Muitos ateus se ancoram no barbudin da era vitoriana, para legitimar seu desdém pela divindade.
“Os verdadeiros crentes fundamentam sua existência sobre a suposta rocha de uma verdade indubitável que oferece inúmeras ‘verificações’ - isto é, provas de sua verdade indubitável. No entanto, os que duvidam - aqueles que têm uma vida de dúvida sincera e coerente – buscam ‘refutações’ - isto é, casos e situações duvidáveis. Mais cedo ou mais tarde, em um lento processo evolucionário, um indivíduo pode aproximar-se de algo semelhante à verdade - ou, por assim dizer, à verossimilhança (literalmente, ‘algo que se assemelha à verdade’).” P. 83.
Espero estar no segundo grupo. Entre "aqueles que têm uma vida de dúvida sincera e coerente".
Outra contestação ao pós-modernismo:
“Se [como diz o relativismo] "vale tudo", tanto cognitiva quanto moralmente, um posicionamento desse tipo se torna basicamente irrelevante: se não existe verdade, o próprio posicionamento do indivíduo passa a ser uma escolha completamente arbitrária. Se o relativismo for cognitivamente aplicado, a teoria do mundo plano deve receber o mesmo status epistemológico que a astronomia moderna - ou, para um exemplo mais atual, o criacionismo e a evolução precisariam receber a mesma importância em um currículo escolar. O relativismo também tem consequências normativas: ele argumentaria que a "narrativa" do estuprador não é menos válida que a 'narrativa' de sua vítima.” P. 86.
Um dos melhores livros do ano. Disso não tenho dúvida.
quarta-feira, 9 de novembro de 2016
Guia Politicamente Incorreto do Sexo
Programa Roda Viva: Luiz Felipe Pondé
Um dos assuntos que mais me chamou a atenção foi sobre sua visão sobre a natureza humana. Para ele:
"O ser humano é fraco, medroso, precário, mentiroso sobre suas próprias angústias. Inclusive por razões sociais – não dá pra você sair por aí falando de tudo que você tem medo. [...] A hipocrisia é parte da base da moral pública”.
“Opero no debate público assumindo os riscos do niilismo, e sou muitas vezes acusado de niilista. [...] Sou basicamente pessimista, cético, descrente, quase na fronteira da melancolia. Mas tenho sorte sem merecê-la. Percebo uma certa beleza, uma certa misericórdia no mundo, que não consigo deduzir a partir dos seres humanos, tampouco de mim mesmo. Tenho a clara sensação de que às vezes acontecem milagres. Só encontro isso na tradição teológica.”
Filosofia para Corajosos
Link do livro para baixar:
http://lelivros.top/book/baixar-livro-filosofia-para-corajosos-luiz-felipe-ponde-em-pdf-epub-e-mobi-ou-ler-online/
Apesar do sensacionalismo do título dessa obra, Pondé é um cara que gosto de ouvir! Sempre gostei de suas palestras e entrevistas! E agora, acabo de terminar um segundo livro de sua autoria.
Com Ph.D em Filosofia na USP, e Pós-Doutorado na Universidade de Tel Aviv, nesse seu recente livro, ele dispara todo o seu veneno contra a sociedade contemporânea, que segundo ele, é a sociedade mais hipócrita, doente e retardada da história.
É um Pondé abusado, chato, marrento, birrento, pessimista e, digo até, contraditório e marqueteiro, ou sendo mais compreensível com ele (como se ele se importasse com isso): paradoxal.
Livro bom! Livro recomendado!
Alguns trechos que julguei interessantes:
"Pensar para onde vamos depois da morte ou como nos sentimos quando sabemos que vamos morrer levanta, de cara, uma questão, entre tantas outras: por que o susto em saber que vamos morrer quando sabemos o tempo todo que vamos morrer um dia?" P. 15.
Quem é que não se caga de medo, por esse iminente dia?! Eu me cago todinho.
"E se não existir vida após a morte, tudo é permitido? E senão existir Deus, tudo é permitido? [...] Essa pergunta é muito importante porque implica o seguinte: se morro e viro pó e ninguém descobre os absurdos que fiz na vida, e não existe alguém ou algo que me faça pagar pelo que fiz nesta vida 'no outro mundo', isso significa que tudo bem matar. Será que a vergonha de fazer algo errado basta para limitar meu comportamento? Acho que não. E você? Mas o fato de, talvez, precisarmos de um 'Deus' para garantir a moral e o bem não implica a sua existência, certo? O mais legal da filosofia é você aprender a pensar sem medo das respostas.Talvez Deus não exista e ainda assim continuemos a precisar que Ele exista. Enfim, questões sem fim." P. 16.
Até vale. Mas até quando raramente fazemos algum ato de “caridade”, gostamos que os outros notem a nossa “bondade”. Eu sou assim. Quem sabe, não posso adquirir alguma vantagem disso no futuro, não é mesmo?!
"Essa ideia de que ser religioso implica alguma forma de carência cognitiva é comum entre pessoas que se julgam mais cultas. Tenho dúvidas de que isso seja uma verdade evidente. [...] O século XX foi mortífero não em nome de Deus, mas em nome da política. Esse é um fato que, muitas vezes, escapa aos nossos péssimos professores de história que ensinam bobagens para nossos alunos". P. 44.
Esse mito de que gente religiosa é (sempre) mais fraca intelectual e emocionalmente, ainda perdura em alguns círculos.
Pondé continua:
"Na minha experiência pessoal, acadêmica ou na mídia, não me parece que pessoas não religiosas sejam mais sábias do que pessoas religiosas. Muita gente para de crer em Deus ou deuses e passa a crer em si mesma [...], o que acho uma bobagem ainda maior se levarmos em conta a fragilidade de nossos pequenos 'eus'." P. 44.
Independente de termos crenças religiosas ou não, somos frágeis, carentes, dependentes, egoístas, angustiados, perdidos, aflitos... Diante disso, como ter fé em nós mesmos?
“A ideia mais comum de sobrenatural é que ele seja o mundo dos mortos que se relacionam com os vivos. [...] A questão essencial aqui é: por que esses mortos 'precisam de nós, meros vivos?'. Porque não existem e são criações humanas. Esses espíritos nunca sabem além do que sabemos: precisamos amar uns aos outros, fazer menos guerra, ter menos poluição e combater o apego material. Quem precisa de espíritos do além para saber que estamos num atoleiro moral neste mundo dos vivos?" P. 57-58.
[...]
"Resta nos perguntarmos a razão de, depois de tanto conhecimento científico acumulado, tanta gente ainda se sentir atormentada e atraída por esse tipo de coisa. A primeira conclusão é que permanecemos, em alguma medida, na pré-história, amedrontados pela escuridão do mundo e de nós mesmos." P. 58.
[...]
"Acho que argumentos que tentam provar a existência de Deus são inúteis. Muita gente tenta provar a existência de Deus dizendo que o universo 'necessita' de um princípio ordenador de tudo, o que eu julgo infantil como argumento. Tudo isto aqui pode ser fruto de um grande acaso num espaço de tempo inimaginável no qual os elementos se arrumam e desarrumam, e no meio deles nós surgimos e desaparecemos. Deus existe? Eu nunca fui crente. Mas isso não me impede de julgar Deus uma hipótese elegante para a existência das coisas, uma vez que um ser como Ele me parece misterioso e interessante de conhecermos, ainda mais se for uma 'pessoa'". P. 61.
Discordo dele. A questão da existência de Deus é um ponto crucial na Filosofia. E também não acho que os argumentos pró e contra sejam (sempre) inúteis.
E terminando as citações:
“Os alunos chegam à universidade sabendo nada, lendo nada, tendo uma opinião sobre tudo. Todos vão mudar o mundo para melhor, e os outros não querem saber de muita coisa. Claro, existem as exceções". P. 92.
Hahaha. E num é não?! Mas nem os Professores muitas vezes não sabem nem o que estão ensinando.