sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Filmes Vistos (11)



Logo após o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), soldados soviéticos estupram as freiras de um convento na Polônia. Muitas engravidam. O que fazer agora? Como lidar com tal tragédia? Como confiar na proteção divina em face desse mal? 

Filme muito bom, sobretudo, quando em várias cenas, as noviças entoam seus cânticos a Deus, num lindo coral de vozes em latim. 


A Netflix está se saindo cada vez mais como uma mega produtora de filmes estupdendos, não devendo em nada aos grandes estúdios consagrados. Esse, lançado recentemente, traz a comovente história de três irmãos sobreviventes do Khmer Vermelho no Camboja, quando este se apossou do país em 1975, forçando a população a seguir o comunismo. Os comunistas mataram, escravizaram e torturaram.


Ótimo filme sobre uma das mais polêmicas artistas. Frida Kahlo foi uma pintora mexicana do surrealismo, na primeira metade XX. A danadinha até teve umas trocas de carícias com Leon Trotsky, uma das principais mentes do comunismo, quando ele se exilou no México, fugindo das garras sanguinárias de Stalin. Frida foi uma mulher de personalidade mui forte. Paradoxalmente, aguentou durante muitos anos as infidelidades de seu marido Diego Rivera (barrigudinho), não obstante, ter acordado com ele, que não "ligaria" para as puladas de cerca que ele faria. O mesmo dizia que seria "leal" a ela, mas "fiel" não. Interessante forma de acordar um casamento. Infelizmente o acidente que ela sofreu quando muito jovem, lhe cobrou um preço muito alto durante toda a sua vida. Talvez ela teria produzido muito mais quadros, caso não tivesse as limitações impostas a sua coluna. A atriz que faz o seu papel, Salma Hayek, está perfeita em sua atuação.


Ah, o amor cristão...

No século XVI, ai daquele que ousasse questionar ou renegar os mais caros dogmas cristãos e falasse mal da igreja. O cabra se torava todinho. Tinha boquinha não. A inquisição católica colocava o rebelde na parede, e fazia ele confessar na marra, em meio a muita tortura física, suas “blasfêmias” e “sacrilégios”. Foi assim com Giordano Bruno, um Filósofo que ousou ir longe demais em suas críticas a cristandade. O destino dele foi a fogueira. Um clássico da década de 1970.


Produção colombiana, que traz o costumeiro tema do tráfico de drogas nesse país. História triste. Rapazes da periferia, sem opções de emprego, de ter uma vida decente, acabam transportando cocaína pelo mar. De vítimas tornam-se vilões. É um ciclo horroroso que não acaba nunca. Bom filme.

Filmes Vistos (10)


Muito louco! Muito massa!

O final é indefinido.

Só sei que vários elementos estão presentes, como a crítica de como a Psiquiatria lidou/lida com os seus pacientes internados nos hospitais, manicômios, hospícios. 

Durante o século XX, diante da total ignorância no tratamento de pessoas com distúrbios psicóticos, muitas experiências horripilantes foram feitas com eles, causando mais dor e sofrimento do que já sofriam em seu mundo mental particular. 

Os avanços vieram, mas não as custas de muitos experimentos indignos. A falta de conhecimento médico-científico abalizado e preciso, ainda é gigante. Apenas sabemos "domar" um pouco mais, quem sofre com as doenças psiquiátricas. Os Psiquiatras vão fazendo seus testes, aí, quem sabe, um ou outro remédio conseguem fazer o efeito desejado. 

Difícil! 

Conforme ia assistindo, me vinham as lembranças do livro e documentário O Holocausto Brasileiro, da Jornalista Daniela Arbex, que trata do Hospício de Barbacena, em Minas Gerais, que durante décadas fez uma verdadeira chacina diante de todos, e nada foi feito pelo governo brasileiro, nem para melhorar as condições ali presentes, e muito menos para punir os responsáveis. 

Ótimo Filme.


A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e suas infinitas histórias. Irmãos judeus que protegeram nas florestas, durante quatro anos, milhares judeus perseguidos pelo regime nazista.

História fantástica.



Stanley Milgram foi um Psicólogo Experimental, que na década de 1960 iniciou algumas pesquisas comportamentais na Universidade de Yale, que até hoje são motivos de controvérsias e debates. Sinceramente, achei bem triviais suas pesquisas. Revelaram apenas o óbvio. Filme razoável, que mostra a luta desse Psicólogo para colocar as suas teses em evidência nas Universidades.



Gênios são gênios. O Matemático Alan Turing, juntamente com seus parceiros de trabalho, encurtaram a Segunda Guerra Mundial em 2 anos, salvando mais 14 milhões de vidas. E o que ele ganhou do Estado inglês? Humilhação e castração química, poucos anos depois, por ser homossexual. Deus do céu! Quem nasce homossexual não vira heterossexual! Não existe terapia, orações, igreja ou exorcismo, que mude a constituição mental, hormonal, genética ou sei lá mais o quê, de uma pessoa assim. Faz parte do SER dela! Ponto final. As igrejas e a sociedade devem pedir perdão por tantas bobagens ditas.

Filmão!


Golpe de Estado no Congo, em 1961. Tropas da ONU são mandadas para o país. Soldados irlandeses, que nunca participaram de nenhuma guerra ou conflito, são mandados para a cidade de Jadotville. Não demora muito para serem atacados pelo exército de mercenários e soldados do presidente Tshomb. Bravamente, os soldados inexperientes sobrevivem, sem nenhuma baixa.

Filme espetacular. História real!


Filmes Vistos (09)


O SBT cansou de passar esse filme na década de 1990. A princípio eu não tinha interesse algum em vê-lo. Mas quando resolvi assisti-lo, putz, que filmaço. Um filme forte, real e triste. O racismo e discriminação ainda é muitíssimo forte em várias cidades e regiões dos EUA. É declaradamente aberto. Ressentimentos de negros com brancos, ressentimentos de brancos com negros. A raiva de ambos os lados só faz perpetuar a violência entre eles. É uma sociedade doente. Só está vivenciando os efeitos colaterais da escravidão e segregação dos negros. 

Pelo menos o filme mostra a história de um neonazista que se curou do racismo - porém, a um preço muito alto e doloroso. 

Nota 1000.


Brancos e negros vivem uma tensão racial intensa numa universidade norte-americana - o conflito assume ares (quase) extremos, quando os brancos resolvem fazer uma festa com temática racista (com a ajuda de uma negra). A complexidade da relação entre negros e brancos é muito bem trabalhada. 


Quatro negros escravos conseguem fugir de uma fazenda no sul dos EUA, e partem em direção a liberdade, no Canadá. Terão que percorrer milhares de quilômetros de território escravista, com a ajuda de abolicionistas cristãos, sendo cassados por capatazes, que foram muito bem pagos para trazê-los de volta ao seu "dono". Contrariamente a maioria dos cristãos da época, que eram escravagistas, esse filme apresenta cristãos comprometidos com a dignidade humana de todos, que não mediram esforços em prol da libertação dos escravos. Maravilhoso filme. 


Chato, poético, místico, estranho, apático. Filhas da Poeira nos leva a um grupo de afro-americanos, no início do século XX, 1902, vivendo em uma ilha isolada, na Carolina do Sul. Estão prontos para migrarem para o norte em busca de novos sonhos e conquistas. Vários diálogos, intrigas, lembranças dos tempos da escravidão, dão tônica deste filme. O governo americano o considera um dos filmes mais relevantes já feito.


Estado da Geórgia. Ano 1944. Uma negra, Lena Baker, em legítima defesa, mata um homem branco, que a mantinha em cárcere privado por três longos anos. Se não o matasse, ele a mataria. Mas numa sociedade que tinha ódio de negros, ela foi julgada e condenada a cadeira elétrica. Um julgamento fajuto de 4 horas, que culminou poucos meses depois numa execução de eternos 6 minutos sendo eletrocutada. Imagine o sofrimento que ela passou nessa maldita cadeira. História lamentavelmente triste. O mal e a injustiça venceram sob a capa do racismo.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Kant em 90 Minutos


STRATHERN, Paul. Kant em 90 Minutos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. (Versão em PDF).

Immanuel Kant é de longe um dos Filósofos mais debatidos e aclamados da história. Ele fez história na Filosofia. Construiu um alicerce filosófico que impressiona qualquer mente inquiridora, que venha a investigar as suas densas obras. Todos são unânimes em dizer que sua obra magna Critica da Razão Pura são para poucos cérebros se debruçarem. Número reduzido de graduados em Filosofia têm condições de lê-la e entendê-la. Filósofos com mentes sofisticadas vêm se debruçando sobre o seu pensamento, que possui várias implicações epistemológicas que subvertem a nossa visão de mundo, seja na religião, Ciência e afins. Eu que passo muitíssimo longe de ser até mesmo um estudioso da Filosofia, arrisco-me apenas a ler, pequenas e introdutórias obras sobre ela. Por isso, aqui vai mais uma postagem da 90 Minutos, série de pequenos livros.

Paul Strathern (Professor de Filosofia e Matemática na Universidade de Kingston, Londres) não esconde o fascínio que nutre pelo castelo filosófico construído pelo seu biografado. Sem deixar de tecer críticas (e com razão) ao imperativo categórico do Filósofo, relativo ao que Kant pensava acerca da mentira ser sempre um erro moral.

Segundo o autor, Kant não foi ateu. Conservou durante toda a sua vida, uma moral, que muito deve a sua educação pietista protestante. Kant nunca foi à igreja quando adulto. Parece que sempre foi celibatário, reprimindo seus desejos sexuais, que alguns Psicólogos acreditam que a morte de sua mãe ainda em sua juventude possam ter desencadeado sentimentos de aversão ao sexo. Era anti-social, não querendo nem ter contato com as suas irmãs, mas nunca deixando de ajudá-las financeiramente. O Filósofo era baixinho, cerca de 1 metro e meio, e tinha um cabeção, que destoava de seu franzino corpo.

A originalidade filosófica de Kant veio bem tarde em sua jornada acadêmica, somente por volta dos 51 anos de idade. Ensinou os mais variados assuntos, como Astronomia, em que dizia que os planetas seriam um dia habitados, e que nos planetas mais distantes do sol, estariam as vidas mais evoluídas intelectualmente.

As conclusões empiristas do Filósofo David Hume o deixou assustado. Aquela historinha do empirismo de que TODO o nosso conhecimento e percepções vem SOMENTE pela experiência. Lei da Causalidade? Hume diz que não podemos prová-la. O máximo que podemos dizer é que um evento sucede o outro, sem, contudo, provar que um é o efeito acontecimento que o precedeu. A nossa percepção é só percepção mesmo, nunca experimentamos a causalidade, se é que ela existe. A causalidade é apenas um exemplo, dentre vários outros que não podemos vivenciar diretamente.

“O empirismo de Hume parecia incontestável, e de forma relutante ele chegou a se deixar convencer pelo seu ceticismo. Objetos, causa e efeito, continuidade, até mesmo o eu, todas essas noções pareciam falaciosas, permanecendo além do campo da nossa experiência, única fonte segura do nosso conhecimento. Kant aceitava isso porque lhe parecia intelectualmente irrefutável, mas não estava satisfeito com a esterilidade dessa situação.  Parecia não haver mais espaço para o prosseguimento da filosofia. Seria de fato o fim?” P. 10.

Por volta dos seus 57 anos, Kant lança sua obra prima, Crítica da Razão Pura, uma síntese de racionalismo e empirismo, numa tentativa de superar o empirismo rígido e desconcertante de Hume, que o havia acordado de seu “sono dogmático”. São mais de 800 páginas, numa linguagem rebuscada e prolixa. Para um amigo de Kant, lê-la era “cortejar a insanidade”. De acordo com Kant, a experiência deve corresponder ao conhecimento, ao contrário do que dizia Hume e os empiristas. Nossa subjetividade determina o espaço e o tempo. Percebemos apenas os fenômenos do mundo, e não a realidade em si. Está apenas faculta o surgimento dos fenômenos. 

“[...] o argumento de Kant de que não podemos jamais conhecer o mundo real tem peso considerável. Todas as coisas que percebemos são apenas fenômenos. A coisa em si (o númeno) que sustenta ou propicia o aparecimento desses fenômenos permanece para sempre incognoscível. E não há razão por que ela deveria assemelhar-se de qualquer maneira a nossas percepções. Os fenômenos são percebidos por meio de nossas categorias, que não têm absolutamente nada a ver com a coisa em si, que permanece além da qualidade, quantidade, relação e similares.” P. 12.

Strathern parece endossar o mundo dos fenômenos de Kant (agnosticismo filosófico). Mas cabe aqui uma pergunta: A conclusão de que não podemos conhecer o mundo real, ou pelo menos parte dele, já não trás em si, um certo conhecimento (por mínimo que seja) desse mundo? Não se pressupõe aí, um conhecimento sobre a realidade? Não estaria no pensamento kantiano o germe do relativismo pós-moderno, apesar deste abominar as dimensões apriorísticas do conhecimento, algo tão caro ao pensamento de Kant? Espero não estar fazendo indagações bestas.

Kant escreveu também a Crítica da Razão Prática, onde procurou as bases metafísicas da moralidade. A lei fundamental na qual todos nós devemos guiar nossas ações. Kant não estava preocupado com o conteúdo das ações morais, mas com o seu fundamento. O resultado de sua Filosofia Moral é o Imperativo Categórico que diz: “Aja somente de acordo com um princípio que desejaria que fosse ao mesmo tempo uma lei universal.” O sistema moral de Kant, pelo que pude perceber noutro lugar, é muito bem construído, entretanto, quando Kant o aplica no dia a dia, suas conseqüências são nefastas (e Kant não vê isso como um problema). Talvez o caso mais emblemático seja a mentira. Para o Filósofo não devemos mentir em hipótese nenhuma. Mentiu, mesmo que seja para salvar uma mãe, amigo, etc., está sob o peso do erro moral.

“O sistema ético de Kant também levou-o a acreditar que não deveríamos jamais mentir, apesar das consequências que pudessem advir desse fato. Estava bastante consciente das implicações desse ponto de vista, mas, apesar disso, manteve-o. ‘Dizer uma mentira a um assassino à procura de um amigo seu, refugiado na sua casa, seria um crime.’ Devemos acreditar que Kant teria sido capaz de entregar um amigo judeu aos nazistas? Não: tudo que sabemos a seu respeito me deixa convencido de que ele teria seguido nessas circunstâncias os preceitos do dever. Sua mente tão vivaz descobriria rapidamente alguma norma que o proibisse de entregar o amigo. No entanto, essa questão de nunca mentir expõe uma falha evidente no sistema de Kant. A fim de não cometer nenhum erro, ele considerou o tema com excessiva seriedade. Chegou a gastar tempo se torturando sobre a licitude de se concluir uma carta com a saudação costumeira da época ‘Seu humilde servo’. Seria mentira? Kant insistiu que não era escravo de ninguém e que não tinha qualquer intenção de prestar obediência a seus correspondentes, mas finalmente parece ter cedido em relação a esse ponto.” P. 13-14.

Muitas coisas curiosas sobre a vida de Kant são reveladas por Strathern. Há um posfácio que analisa novamente a metafísica kantiana, com as suas categorias a priori e seu Imperativo Categórico. No final do livro, ele ainda traz algumas citações compreensíveis da Crítica da Razão Pura. 

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Justiça: o que é fazer a coisa certa


SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.

Livro bom? Bom não. Excelente.

Michael Sandel (Ph.D em Filosofia Política na Universidade de Oxford) presenteia os seus leitores com as principais controvérsias éticas, políticas e sociais, que versam a vida moderna. O seu curso de Filosofia é simplesmente o mais procurado na Universidade de Harvard, devido a sua acurácia e facilidade em expor teorias político-filosóficas complexas, numa linguagem acessível a todos.  Tudo é problematizado, e o autor tenta de todas as formas ser imparcial em suas análises, sempre colocando o leitor a par das objeções e fraquezas das visões apresentadas. Sandel mostra-se favorável a certas visões de mundo. A visão aristotélica do que seja a “vida boa” é um exemplo. As cotas raciais também são palatáveis, segundo Sandel.

"A vida em sociedades democráticas é cheia de divergências entre o certo e o errado, entre justiça e injustiça. Algumas pessoas defendem o direito ao aborto, outras o consideram um crime. Algumas acreditam que a justiça requer que o rico seja taxado para ajudar o pobre, enquanto outras acham que não é justo cobrar taxas sobre o dinheiro recebido por alguém como resultado do próprio esforço. Algumas defendem o sistema de cotas na admissão ao ensino superior como uma forma de remediar erros do passado, enquanto outras consideram esse sistema uma forma injusta de discriminação invertida contra as pessoas que merecem ser admitidas pelos próprios méritos. Algumas rejeitam a tortura de suspeitos de terrorismo por a considerarem um ato moralmente abominável e indigno de uma sociedade livre, enquanto outras a defendem como um recurso extremo para evitar futuros ataques." P. 31.

Esses e mais uma dezena de temas explosivos vão sendo um a um comentados e escrutinados por Sandel. Por vezes ele dá o seu parecer. Mas nos primeiros temas levantados, ele apenas explica o que os diferentes teóricos têm a dizer.

Sobre a crise financeira de 2008, Sandel conta uma história de embrulhar o estômago de qualquer um:

“Em outubro de 2008, o presidente George W. Bush pediu 700 bilhões de dólares ao Congresso para socorrer os maiores bancos e instituições financeiras do país. A muitos não pareceu justo que Wall Street tivesse usufruído de enormes lucros nos bons tempos e agora, quando a situação estava ruim, pedisse aos contribuintes que assumissem a conta. Mas parecia não haver alternativa. Os bancos e as financeiras tinham crescido tanto e estavam de tal forma envolvidos com cada aspecto da economia que seu colapso poderia provocar a quebra de todo o sistema financeiro. Eles eram ‘grandes demais para falir’.

[...]

Vieram então as benesses. Pouco depois que o dinheiro do socorro financeiro (bailout) começou a circular, novas informações revelaram que algumas das companhias, agora com o auxílio de recursos públicos, estavam agraciando seus executivos com milhões de dólares em bônus. O caso mais ultrajante envolveu o American International Group (AIG), um gigante dentre as companhias de seguros levado à ruína pelos investimentos de risco feitos por sua unidade de produtos financeiros. Apesar de ter sido resgatada com vultosas injeções de fundos governamentais (totalizando 173 bilhões de dólares), a companhia pagou 165 milhões de dólares em bônus a executivos da própria divisão que havia precipitado a crise; 73 funcionários receberam bônus de 1 milhão de dólares ou mais.” P. 18, 19. 

Outra de dá nojo é como o conhecido Economista Milton Friedman concebe a liberdade individual:

"[De acordo Friedman], o governo também viola a liberdade individual quando cria leis contra a discriminação no mercado de trabalho. Se os empregadores quiserem discriminar com base em raça, religião ou qualquer outro fator, o Estado não tem o direito de impedir que eles ajam assim. Na opinião de Friedman, 'tal legislação envolve claramente a interferência na liberdade dos indivíduos de assinar contratos voluntários entre si'." P. 69.

O que me assusta de verdade é saber que existem pessoas, que pensam exatamente igual, ou semelhante a ele.

Sandel explicita a teoria moral de Kant, que não é um Filósofo fácil de ser entender. O Imperativo Categórico é um dos pilares da Filosofia Moral. Aquela historinha de que as pessoas devem ser tratadas como um fim e não como um meio. Os seres humanos, como seres sencientes, capazes de perceberem a si mesmos e o mundo ao redor, merecem ser tratados fins em si mesmos. Kant era diametralmente oposto ao Utilitarismo de Jeremy Benthan e John Stuart Mill, Filósofos que também foram trabalhados por Sandel. Mas para Kant o aumento da felicidade da maioria não é a finalidade da moral, idéia defendida pelos utilitaristas. 

“[...] tentar tomar como base para os princípios morais os desejos que porventura tivermos, é uma maneira errada de abordar a moral. Só porque uma coisa proporciona prazer a muitas pessoas, isso não significa que possa ser considerada correta. O simples fato de a maioria, por maior que seja, concordar com uma determinada lei, ainda que com convicção, não faz com que ela seja uma lei justa.” P. 119.

De acordo com Sandel, Kant negava que a Ciência teria qualquer prerrogativa de dizer algo de substancial sobre a nossa capacidade como agentes livres, visto que ela lida com o mundo natural, e na com as abstrações filosóficas, tais como a livre agência humana. 

“[...] a ciência pode investigar a natureza e indagar sobre o mundo empírico, mas não pode responder a questões morais ou negar o livre-arbítrio, porque a moralidade e a liberdade não são conceitos empíricos. Não podemos provar que elas existem, mas também não podemos explicar nossa vida moral sem partir do pressuposto de que elas existem.” P. 140.

O Imperativo Categórico é muito bonitinho e bem concatenado, conforme vai sendo explicado, mas se mostra um verdadeiro absurdo, quando não podemos nem mentir para um assassino, sob a pecha de sempre falarmos a verdade. Para Kant, não podemos mentir em hipótese alguma. Não importa as consequências ruins que dizer a verdade possa gerar.

“Kant é muito rigoroso quanto à mentira. Em Fundamentação, a mentira é o principal exemplo do comportamento imoral. Mas suponhamos que uma amiga esteja escondido em sua casa e um assassino bata à sua porta procurando por ela. Não seria certo mentir para o assassino? Kant diz que não. O dever de dizer a verdade deve prevalecer, independentemente das consequências.” P. 143.

Difícil de engolir essa. Sandel até tenta amenizar o lado de Kant, nas páginas seguintes, mas ele não é bem sucedido. As artimanhas kantianas não são convincentes. Há maneiras de enganar o ladrão, falsificando a informação, sem cair em erro moral. Depende da definição que temos do que seja uma “mentira”. Temos a obrigação de dizer a verdade a um assassino? Não, não temos. Pensando assim, vejo que no exemplo citado, podemos dizer ao assassino, que a nossa amiga definitivamente não está em nossa casa, sem incorrermos num erro moral. 

Sandel cita um caso, que definitivamente não se configura como um valor moral:

“[...] há alguns anos, a Universidade de Maryland tentou combater um problema generalizado de cola e pediu aos alunos que assinassem termos de compromisso comprometendo-se a não colar. Como incentivo, aqueles que assinaram o termo receberam um cupom de desconto de 10% a 25% para utilizar no comércio local. Não se sabe quantos alunos prometeram não colar de olho no desconto na pizzaria. Mas a maioria de nós concordaria que a honestidade comprada não tem valor moral.” P. 124.

Um dos Filósofos amplamente trabalhados é John Rawls, apesar dele ser um liberal, sua teoria da justiça, difere do conceito em voga de meritocracia. Para ele, se temos essa ou aquela qualidade, não é porque a conquistamos com nossos esforços, destreza e habilidades. Foi sorte.

"Como [Rawls] nos lembra, 'ninguém merece ter maior capacidade natural ou ocupar um ponto de partida privilegiado na sociedade'. Tampouco é mérito nosso o fato de vivermos em uma sociedade que por acaso valorize nossas qualidades particulares. Isso é fruto da nossa sorte, e não da nossa virtude." P. 191.

Surpreendentemente, Sandel não acha que devemos deixar nossas crenças morais e baseadas em nossas religiões particulares fora da arena pública e política. Isso é um anátema para muitos secularistas, ávidos pelo laicismo nas discussões políticas. Sandel mostra que a coisa não é tão simples assim.

"Pedir aos cidadãos democráticos que abandonem suas convicções morais e religiosas ao entrar na esfera pública pode parecer uma forma de garantir a tolerância e o respeito mútuo. Na prática, entretanto, pode acontecer justamente o contrário. Decidir sobre importantes questões públicas fingindo uma neutralidade que não pode ser alcançada é uma receita para o retrocesso e o ressentimento. Uma política sem um comprometimento moral substancial resulta em uma vida cívica pobre. É também um convite aberto a moralismos limitados e intolerantes. Os fundamentalistas ocupam rapidamente os espaços que os liberais têm receio de explorar." P. 254.

Sandel cita uma fala do Barack Obama (Presidente dos EUA 2009-2017) sobre esse tema:

"Os secularistas estão errados quando pedem aos crentes que deixem sua religião para trás antes de entrar na vida pública. Frederick Douglass, Abraham Lincoln, William Jennings Bryan, Dorothy Day, Martin Luther King — na verdade, a maioria dos grandes reformistas da história dos Estados Unidos — não somente eram movidos pela fé como frequentemente usavam a linguagem da religião para defender suas causas. Assim, dizer que homens e mulheres não deveriam levar sua 'moral pessoal' para os debates sobre políticas públicas é um absurdo. Nossa lei é, por definição, uma codificação da moralidade, grande parte dela fundamentada na tradição judaico-cristã." P. 265.

Sandel levanta várias perguntas, questionamentos, indagações; fornece várias respostas, e vários contrapontos a elas. Acho que ficam mais dúvidas do que certezas, diante do que ele expõe. Mas isso é bom. Direciona-nos a questionar e pesquisar mais a fundo as ideias que acreditamos e defendemos, seja para abandoná-la ou aprimorá-la.

Justiça: o que é fazer a coisa certa é um livro espetacular. O que citei ou falei nessas linhas não faz justiça a riqueza que ele traz em suas páginas. Merece até ser lido uma segunda vez, para que eu tenha uma percepção mais apurada da complexidade dos assuntos abordados por ele, que excedem em muito o que foi dito aqui. 

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Documentários Vistos (21)


El Salvador, Honduras, Guatemala, o que esses países têm a oferecer a sua população? Bosta nenhuma. Num ato de desespero, muitos arriscam as suas vidas, a irem para os Estados Unidos ilegalmente, para tentar uma vida menos sofrida, e mandar algum dinheiro para os seus familiares que ficaram. Mas a travessia para a terra das oportunidades não é nada fácil. É um verdadeiro inferno ter que passar pelo México, aonde os migrantes são espoliados, estuprados, mortos, postos a todo tipo de ameaças e sofrimentos. La Bestia é o que eles chamam os trens que os levam de cidade em cidade, numa viagem super perigosa, sem conforto algum, passando fome, frio, sede, sem poderem dormir direito, pois podem cair nos trilhos e serem dilacerados. É conhecido como o Trem da Morte. Na medida em que vão avançando o território mexicano, algumas almas caridosas lhes dão assistência de três dias nos albergues católicos, nas paradas dos trens, oferecendo cama, banho e comida. Depois de semanas nessa aventura desumana, alguns conseguem chegar a América do Norte, uns morrem durante a travessia no deserto do Texas, ou do Arizona, outros naturalmente são pegos pela polícia de imigração, e são deportados, sendo completamente em vão as suas viagens. Alguns são deportados tempos depois pelo governo norte-americano. É a mesma história que se repete há décadas. Histórias tristes. Uma dura realidade sem esperança em seus países de origem, que continuam imersos numa corrupção sem fim, tornando a vida um verdadeiro suplício para os seus cidadãos.


Um dos grandes temas atuais. Os refugiados. Fogem de seus países instáveis, afundados na guerra civil, miséria e fome, para países que porventura possam lhes dar asilo. As fotografias que registraram esses momentos carregados de muita dor, amargura e desgosto, dão o tom desse micro documentário. Refugiados na Grécia, Colômbia, EUA, Senegal, Leste Europeu e Myanmar. Esse mundo de meu Deus é um caos.


Uma família de surfistas viaja o mundo a procura do “grande peixe”. Praias, ilhas, cidades, povos, culturas, estradas... Quem capturar o “grande peixe” terá o espírito do oceano dentro de si. É uma metáfora incrível, poética. Toda essa extraordinária aventura é narrada por uma criança (Given), que vivencia todos esses momentos, o que torna tudo mais especial. 

“Há milhões de anos, o oceano se encheu durante uma chuva gigantesca. O peixe bebeu tanta água que salvou o mundo do afogamento. E se tornou tão grande que, sempre que nadava, fazia grandes ondas e mudava as marés. O grande peixe espera para que um oponente forte e valoroso liberte seu espírito inquieto. Quem pegar o grande peixe, carregará o espírito do oceano dentro de si. Vamos seguir as ondas e vamos pegá-los.” 


Ursos na China, na América Latina, EUA, Noruega e Canadá. O Panda pode passar até 14 horas do seu dia comendo. O bambu, seu único alimento, é pouco nutritivo.


Um pouco antigo já. Gravado em 2003. Mas é um bom documentário sobre os elefantes, demonstrado o quanto eles são inteligentes. A título de curiosidade, esses "pequenos" animais quando adultos liberam 2000 litros de metano diariamente. Ou seja: peidam pra caramba. 

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Documentários Vistos (20)


Uma excelente fonte histórica sobre a Batalha de Midway no pacífico, entre os EUA (aliados) e Japão (eixo), em 1942. Micro-documentário propaganda, feito pelo governo norte-americano, com imagens coloridas dos ataques sofridos pelos soldados aliados, que derrotaram com a sua defesa anti-aérea e navios, os soldados japoneses. Precioso registro da época. 

Nem tudo está perdido. Muitas pessoas estão fazendo um maravilhoso trabalho em prol da reeducação alimentar dos pequenos. O índice de doenças em crianças, adolescentes e jovens, decorrente da ingestão descomunal de gorduras e açúcar é uma realidade, que já está custando muito caro. A máfia dos alimentos industrializados está lascando a saúde de todos. As crianças, tomando emprestado o título de outro documentário, são "a alma do negócio"; são as principais vítimas das multinacionais dos alimentos. Sabendo deste fato, pessoas engajadas estão unidas numa coalizão nacional, para abrirem os olhos dos pequenos, para que eles comecem a ingerir mais frutas, legumes e verduras. The Kids Menu trabalha nessa perspectiva, oferecendo um fio de esperança, em meio aos caos em que se encontra a nossa alimentação diária. O documentário naturalmente retrata a situação do EUA, mas a realidade brasileira é muito semelhante a de lá. Então o documentário tem o seu devido valor para o contexto tupiniquin.
Em 1965 começou no Harlem, o mais tradicional bairro negro localizado em Nova Iorque, um projeto esportivo de basquetebol, junto a comunidade, que transformou a vida de centenas de jovens negros da periferia, em atletas da NBA. Holcombe Rucker iniciou uma liga de basquete que mudou a cara do Harlem, fazendo esse bairro ser o centro das atenções de todo o país. A Liga Rucker há mais de 50 anos tem sido um celeiro de atletas de ponta, que dadas as condições de pobreza e marginalização em que estavam/estão inseridos socialmente, não teriam um futuro promissor no mundo dos esportes (e nem na vida), e provavelmente, muitos deles adentrariam o mundo da criminalidade.


Documentário sobre o cenário de música alternativa em Los Angeles. Festas realizadas nos quintais das casas em South Central, bairro conhecido pela pobreza e violência. Bandas underground de Punk, divulgando suas músicas em pequenos shows, para um público bem diferente e "estranho". Legal ver a diversidade que se encontra nas grandes cidades, por mais que não gostemos de muitas delas, criticando-as e julgando-as negativamente, por não se enquadrarem na nossa maneira de ser. Tribos, culturas, estilos, modos distintos de ver e viver a vida. 


Dois homossexuais. Duas histórias de luta contra os olhares condenatórios da sociedade. Fallon Fox e Terrence Clemens. A primeira, uma transgênero, que pratica MMA. O segundo, um jovem, que busca o seu lugar ao sol, no basquete universitário. O documentário concentra-se na batalha deles dois, para conseguirem seus objetivos profissionais, sem deixar de lado quem realmente eles são. Ser gay ainda é muito difícil. Os julgamentos vexatórios e hipócritas, correm a galope. Mas eles estão bem encaminhados. Persistência e boas amizades, fizeram toda a diferença em suas batalhas diárias.