TYSON, Neil deGrasse Tyson. Respostas de um
Astrofísico. 1 ª ed. – São Paulo: Record, 2020. (PDF).
Neil deGrasse Tyson, Ph.D em Astrofísica na
Universidade de Columbia, é certamente o cientista mais famoso do mundo nos
últimos, aparecendo em diversos programas na TV, em vídeos na Internet,
apresentando a inestimável série Cosmos na NatGeo, na ótima vendagem dos seus
livros, dentre outras coisas. Tyson sabe se comunicar de maneira atraente, de
modo calmo, sem palavras difíceis, fazendo com que o grande público leigo, como
eu, se interesse pelo que ele tem a dizer. Este é o segundo livro dele que
leio, sendo o primeiro Astrofísica Para Apressados.
Em Respostas de um Astrofísico, Tyson faz
uma compilação das várias mensagens no Facebook, cartas e e-mails que recebeu
durante todos esses anos. Algumas das mensagens são agradecimentos, outras
dúvidas, não necessariamente sobre ciência, que os seus leitores querem sanar,
e outras, obviamente, contestações ao que astrofísico mainstream ensina e
divulga, geralmente sobre a sua visão sobre a religião e suas tentativas de intervenções
na ciência, que ele rechaça veementemente, mas sem o tom agressivo e belicoso
do seu amigo Richard Dawkins.
Tyson não descarta a existência de vida inteligente
fora da Terra. O que ele rejeita como prova, ou evidência, são as experiências
visuais das testemunhas sobre seus avistamentos no céu. Ele enumera quatro
possibilidades.
“1. O observador é
maluco ou está delirante.
2. O observador
avista algo e narra o que viu de forma imprecisa, tornando confuso um relato
que seria uma simples descrição de fenômenos naturais.
3. O observador
avista algo e narra o que viu de forma precisa, mas não tem familiaridade
suficiente com fenômenos naturais para não se confundir com o que está vendo.
4. O observador
avista e narra de forma precisa algo que desafia qualquer explicação normal ou
convencional — constituindo um verdadeiro mistério.” P. 39.
Constituir “um verdadeiro mistério” ainda
está longe de se constituir em uma prova/evidência real de aquilo que se viu é
uma nave interplanetária, visto que “testemunhos
oculares são, de longe, a forma mais frágil de evidência que uma pessoa pode
apresentar para apoiar uma alegação.” P. 39. “Psicólogos
e cientistas sabem muito bem que testemunhos oculares são a forma menos
confiável de evidência.” P. 57.
Tyson é o cientista clássico, aquele que
acredita que a ciência é objetiva, revela a verdade sobre o mundo natural – é o
cientista estritamente realista.
“Na era da ciência experimental
‘moderna’, que basicamente parte de Galileu e Sir Francis Bacon em diante (os
últimos 400 anos), existe a ciência que foi testada e sobre a qual se chegou a
um consenso e existe a ciência da fronteira. A ciência da fronteira muda
mensalmente, se não semanalmente, à espera de dados suficientes para pôr fim às
controvérsias. A ciência testada, aquela em relação à qual já se chegou a um
consenso por meio de observações e experimentos, é imutável. O que pode
acontecer, e com frequência acontece, são novas ideias expandirem o alcance de ideias
previamente testadas — mas não as desdizerem.” P. 52.
“Mas eu tenho como
saber (e sei) o formato da Terra, da Lua, das estrelas e do universo, a origem dos
elementos químicos, a idade da Terra e do universo, os episódios de extinção
nos registros fósseis, o impacto de asteroides na Terra, a convergência
genética entre toda a vida na Terra, a proximidade genética entre os humanos e
os chimpanzés, e diversas outras verdades objetivas sobre o mundo.” P.
96.
“Eu diria que as
principais equações físicas modernas representam verdades cósmicas.” P.
113.
Com essas palavras acima, Tyson se opõe a
visão de outros cientistas de sua área, do qual podemos citar o Hawking e
Mlodinow, que abraçam uma perspectiva anti-realista em seu livro O GrandeProjeto.
Tyson não tem apreço pelos filósofos
(relativistas), dispensando os seus pitacos sobre o que a ciência é, ou o que
deveria ser/fazer.
“No decorrer dos
anos, os métodos e as ferramentas da ciência nos mostraram que, apesar do que
alguns filósofos afirmam, uma realidade existe independentemente da nossa
percepção dela.” P. 49.
A sua ojeriza não é apenas direcionada aos
relativistas, mas a toda a comunidade de Filósofos.
“Eu nunca fui um
grande fã da filosofia aplicada às ciências físicas no século XX (e XXI).
Percebi que os argumentos comuns são mais baseados no uso e no significado das
palavras do que em ideias, e assim vejo essas discussões como inúteis, em grande
medida, para o progresso da ciência.” P. 112.
“Ainda não vi nenhum
filósofo com formação acadêmica a partir do século XX (no Departamento de Filosofia
de uma universidade) fazer qualquer avanço palpável em nosso entendimento do
mundo natural. Eles normalmente carregam um nível de confiança em seus
conhecimentos que não é corroborado por nenhum dado ou observação do universo
físico. Filósofos não têm laboratórios. Nem telescópios. Nem microscópios. Eles
têm seus cérebros e suas poltronas, e incorretamente acreditam que isso é
suficiente para adquirir conhecimento sobre como a natureza opera.” P.
120.
Lidando com um ateu doido da cabeça,
revoltado, por usarmos um calendário que divide a história em Antes e Depois de
Cristo, Tyson dá uma bela resposta a ele. Parte da resposta:
“O calendário
gregoriano é simplesmente o mais preciso e estável já elaborado. Os padres
jesuítas, nomeados pelo Papa Gregório XIII no século XVI, fizeram um ótimo trabalho
com seus cálculos. Eles corrigiram o falho calendário juliano, no qual o
equinócio da primavera havia recuado, no decorrer dos séculos, do familiar 21
de março para o dia 10 de março. A correspondência do equinócio da primavera
com 21 de março está para sempre assegurada, podendo variar apenas em um dia
para a frente e para trás nos anos bissextos. Já outros sistemas, especialmente
calendários lunares, precisam intermitentemente introduzir meses inteiros para
conciliar o registro do tempo com a localização da Terra em sua órbita em torno
do Sol.
[...]
Pense que O
Messias, de Händel, é uma das melhores peças já composta para coral. Assim como
a Missa em Si Menor, de Bach. No entanto, nenhuma dessas obras existiria se
alguém não tivesse se sentido inspirado por Jesus. Isso não diminui (ou pelo menos
não deveria) a genialidade, a beleza e a majestade dessas grandiosas
composições musicais. Além do mais, como ateu, você com certeza utiliza as
palavras ‘holiday’ e ‘adeus’, cuja origem vem das expressões “holy day” e ‘a
Deus vos recomendo’.” P. 67-68.
Ao contrário do que muitos pensam, Tyson
não é ateu. Ele se diz agnóstico.
“A-teu:
literalmente, ‘sem Deus’. Nunca gostei desse termo. Estranho que existam
palavras que lhe digam o que você não é. Por acaso existe algum vocábulo para
não jogadores de golfe? Não chefs? Não astronautas?” P. 79.
“Não sei se Deus
existe. Sei apenas que as pessoas que citam evidências a favor de Deus fazem
vista grossa para a preponderância de evidências em contrário.” P. 162.
“Sou agnóstico, e
repudio energicamente o rótulo de ateu, como diversos vídeos online podem
atestar. Incluindo um com mais de 3 milhões de visualizações.” P. 218.
Tyson vê o atual momento da ciência em seu
país, EUA, em maus lençóis.
“Todas as
classificações de desempenho do nosso país no palco mundial da ciência,
tecnologia, engenharia e matemática (áreas STEM), junto às outras nações industrializadas,
nos colocam entre os 10% inferiores. Uma fração crescente do nosso eleitorado
(quase chegando aos 50%) nega as descobertas científicas quando elas entram em
conflito com suas visões políticas e/ou religiosas.” P. 88.
Muito se objeta, sobre os milhões, bilhões
de dólares que são gastos anualmente para pesquisas espaciais. Diante de tantas
necessidades aqui, em nosso planeta, porque gastar tanto dinheiro, recursos,
trabalho e tempo, com o universo lá fora? Muitos americanos estão putos da
vida, em ter que bancar essas pesquisas “inúteis”. A artilharia de Tyson
mostra-se imbatível. Sem as pesquisas no campo da Astronomia/Astrofísica...
“• Lá se vão os
circuitos integrados que estão nos seus aparelhos eletrônicos.
• Lá se vai o Canal
do Tempo do seu pacote de TV a cabo.
• Lá se vai seu
acesso a imagens de satélites (de qualquer fonte de notícias) que acompanham a
rota de tempestades, furacões e tornados em formação.
• Lá se vai o
sistema de GPS do seu carro (hora de voltar a comprar mapas de papel, se você
conseguir achar alguém que os venda).
• Lá se vão todas
as suas ferramentas que usam pilhas.
• Lá se vão
(algumas) das pessoas que você ama, levadas pelo câncer de mama porque o
algoritmo de processamento de imagens espaciais, que detecta células
cancerígenas mais cedo que nunca, não teria sido usado nelas.
• Lá se vai o
sistema de aviso de colisões do seu carro ou do carro que você planeja comprar
em breve.
• Lá se vão as
informações sobre o asteroide Apophis, que neste exato momento está vindo em
direção à Terra, e passará bem perto dela no dia 13 de abril de 2036.
• Lá se vão todas
as transmissões via satélite de notícias da Europa ou de qualquer outro lugar
do mundo para a sua TV.
• Lá se vai seu
conhecimento de que algo de ruim aconteceu em Vênus (deixando o planeta com um
efeito estufa descontrolado de 482 graus Celsius) e em Marte (que já teve água corrente
na superfície, mas agora está completamente seco e frio), informações que
embasaram a tomada de consciência internacional sobre o aquecimento global.
• Lá se vai a
eficiência aerodinâmica das asas dos aviões (lembre-se de que o primeiro A em
NASA é a inicial de Aeronáutica).
• Lá se vai seu
acesso ao Google Maps.” P. 92-93.
Respondendo a um leitor que acusa os
cientistas de odiarem os cristãos, Tyson diz o seguinte:
“Nem eu, nem
ninguém que eu conheça, tem a intenção de jogar os cristãos aos leões, apenas a
de manter a religião longe das salas de aula de ciências. Aliás, não existe
nenhum histórico de cientistas arrombando portas de escolas dominicais para
dizer aos pregadores o que eles devem ensinar. Cientistas não fazem piquetes
diante de igrejas nem atiram em pessoas que entram nelas. Cientistas não
costumam interromper pregadores durante os sermões. E, a propósito, quase
metade de todos os cientistas (no Ocidente) são religiosos e rezam para algum
Deus.” P. 95.
Até gente defendendo o Alcorão, aparece
para evangelizar o Tyson.
“Na quarta-feira, 3
de junho de 2009, Tahmid Rahim, mulçumano, respeitosamente me perguntou por
que, em minhas várias aparições em documentários científicos e em outros
lugares, a ciência presente no Alcorão nunca foi mencionada. Ele declarou que o
Alcorão contém muitos versos que fazem referência a descobertas específicas da
astrofísica moderna, da relatividade à expansão do universo. Para um livro
escrito por Maomé 1.400 anos atrás, isso seria extraordinário, se fosse
verdade.
* * *
Olá, Tahmid Rahim,
Obrigado por sua
mensagem.
Um grande desafio
com as verdades reveladas por profetas divinos é que ninguém nunca fez uma
previsão correta sobre objetos e fenômenos previamente desconhecidos baseada no
conteúdo de textos religiosos. Normalmente, o que acontece é que pessoas
devotas tomam conhecimento das descobertas dos cientistas sobre o mundo natural
e então retornam a seus textos religiosos em busca de passagens que façam
alusão ao que já se conhece. Mas, como a informação extraída vem depois da
descoberta, não é útil para o avanço da ciência. O que você precisa fazer, se
estiver convencido da capacidade do Alcorão de prever o futuro e da sua
infalibilidade, é apresentar previsões sobre o mundo natural derivadas de
versos do Alcorão que estimulem pesquisas. Se alguma dessas previsões se tornar
realidade (aliás, seria a primeira vez que algo assim aconteceria), os
cientistas minerariam o Alcorão em busca de seus insights, diariamente.
Isso nunca
aconteceu — com nenhum texto religioso —, e é por isso que esses textos não têm
lugar nas aulas de ciências. Ocasionalmente, quando pessoas muito religiosas
acham que a ciência está em conflito com seus textos religiosos, elas atacam os
conceitos, declarando que há algo de errado com a ciência.
Apresente uma lista
de previsões de fenômenos desconhecidos, derivados do Alcorão, e eu ficarei
feliz em oferecer meus comentários. Caso contrário, ciência e religião não têm
muito o que dizer uma à outra.” P. 104-105.
Respondendo a acusação de um leitor, de que
os cientistas acreditam religiosamente que a ciência explica tudo, Tyson diz:
“Cientistas em
atividade não saem correndo por aí declarando que a ciência pode explicar tudo.
Por exemplo, nenhum de nós alega que a ciência pode explicar o amor, o ódio, a
beleza, a coragem ou a covardia. Mas, à medida que a ciência avança, essas
noções podem, de fato, alcançar o âmbito experimental da ciência, como
aconteceu com tantos assuntos considerados insolúveis no passado. Isso não é
uma fé absoluta como você descreve, mas uma confiança baseada no desempenho pregresso
dos métodos e das ferramentas da ciência.” P. 115.
Um internauta pergunta sobre o porquê de
estarmos aqui, ao que Tyson responde:
“Nunca penso muito
no ‘porquê’. O porquê sugere um propósito ditado por forças exteriores. Eu
sempre fui da opinião de que propósito não é algo definido externamente, mas
bem dentro de nós. Meu propósito na vida é diminuir o sofrimento dos outros,
contribuir para aumentar a nossa compreensão do universo e enriquecer de
conhecimento os outros ao longo do caminho.” P. 118.
Sobre as pessoas que negam o aquecimento global:
“Pessoas que negam
as alterações climáticas causadas pelo ser humano estão muito mal informadas.
Essa posição não é politicamente liberal nem conservadora. Ela é factual. Embora
seja possível argumentar que todos aqueles que desejam preservar o meio
ambiente são os verdadeiros conservadores nessa discussão.” P. 218.
É um livro que se lê rapidinho e mostra de
forma clara e dinâmica, o que o Tyson pensa sobre diversos assuntos. Vale a
leitura.
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