sábado, 24 de dezembro de 2016

Livros Lidos (4)


Lúcia Santaella, Ph.D em Teoria Literária na PUC-SP, se debruça em explicar e simplificar os principais conceitos do teórico Charles Sanders Peirce, o pai da Semiótica moderna. Primeiro livro da Coleção Primeiros Passos, que não tive muito apreço em ler. 


O “Evangelho de Judas” torna o vilão em herói e os heróis em vilões pobres e ignorantes. Um escrito rejeitado pelos cristãos dos primeiros séculos, que finalmente nos últimos anos veio a conhecimento do grande público. O autor Norman Tom Wright (Professor e Pesquisador do Novo Testamento na Universidade de St. Andrews, na Escócia) é um dos eruditos mais requisitados quando o assunto é cristianismo primitivo. 

Para ele (e eu concordo), o tal “evangelho” do “traidor” de Cristo, não traz nenhuma informação histórica sobre as pessoas de Judas e Jesus. Mas reconhece que o documento é autêntico e traz informações importantes e relevantes sobre o que certos grupos estavam crendo e ensinando sobre Jesus, no século II de nossa era. 

Em resumo, Judas faz o que faz, porque o próprio Jesus o mandou fazer. Mas o motivo para tal...


WATTERS, Kerry. Ateísmo: um guia para crentes e descrentes. São Paulo: Paulinas, 2015.

Livro escrito pelo bispo Kerry Watters, Ph.D em Filosofia e Professor da Faculdade de Gettysburg, na Pensilvânia, que tenta analisar imparcialmente os argumentos em prol do ateísmo e teísmo. O autor com formação completa em Filosofia passeia com muita agudeza sobre os principais problemas levantados sobre Deus e sua suposta existência. Mostra-se atualizado com as principais linhas de pesquisa na polêmica entre crentes e descrentes. 

Apesar do autor ser um bispo episcopal, ficou a impressão de que ele tem uma afeição maior pela argumentação naturalista. A maioria das cipuadas que ele dá, são nos argumentos teístas. Numa análise rápida, ele enfraquece muitas afirmações usadas pelos apologistas da crença em deus. 

Ótimo livro.

“A religião é um fenômeno antropológico e psicológico, mas as perguntas a respeito de Deus são metafísicas. Segundo, ressaltar o absurdo das crenças e práticas fundamentalistas e depois anunciar de modo triunfal que, em resultado disso, a crença em Deus foi destruída, é argumento questionável da pior espécie. As objeções genuínas ao teísmo deveriam focalizar corretamente seus argumentos mais fortes, mais fundamentais, não as reivindicações bizarras de extremistas marginais que as pessoas mais razoáveis, teístas e ateístas igualmente, já rejeitam.” P. 15-16.

Watters vai ao ponto. O ateísmo popular vive caindo nesse erro grotesco. As merdas e absurdos que certas religiões ou religiosos venham a fazer, em nada contrapõe o teísmo ou deísmo, em si. Concluir que Deus não existe baseado na hipocrisia religiosa é estupidamente falacioso. Visto que “não há ligação necessária entre as crenças e práticas de instituições religiosas e a existência de Deus”. P. 17. 

Lembrando que quando o autor diz isso, ele não tem em mente o “Deus de Abraão, Isaac e Jacó”, mas sim, o “Deus dos Filósofos”. Ou seja, ele não está lidando com o deus de uma religião específica. Seu diálogo tem a ver com a ideia de Deus na tradição filosófica ocidental. 

“O naturalista quer que o universo seja tudo que existe, exatamente como o supernaturalista quer que exista um Deus. Cada um tem um interesse pessoal e emocional em sua respectiva posição que transcende o consentimento intelectual.” P. 69. 

Não acho que seja (sempre) desse jeitinho. Existem os naturalistas que queriam acreditar na existência de um deus amoroso, só não veem provas/evidências/indícios de que tal ser exista. O Neurocientista António Damásio (Ph.D em Medicina na Universidade de Lisboa) seria um exemplo de ateu que gostaria de acreditar, no entanto, ele não ver nenhum caminho que o leve a crença. 

Assim como têm supernaturalistas que apesar de acreditarem num certo tipo de divindade, queriam que a mesma fosse mais “branda” ou mais suscetível aos seus desejos e vontades. Mas como a sua cosmovisão aponta para esse deus “rigoroso”, eles não podem deixar de crer e de reverenciá-lo, mesmo que isso lhes exija abnegação, e até uma certa tristeza e frustração por não poderem fazer o que lhes dá vontade. 

"Muita gente que antigamente se considerava religiosa voltou-se para o ateísmo não porque foi persuadida por um argumento lógico, mas porque o horror do mal do mundo abalou sua fé. [...] O problema do mal é um peso descomunal para o teísta. É sua grande tragédia." P. 121. 

É uma pedra que não sai do caminho do teísmo.

“A possibilidade de estar enganado em suas convicções religiosas é inimaginável para muitos crentes, porque exporia sua vida inteira a um erro – ou pior, à decepção com eles mesmos”. P. 156.

Por isso que muitos de nós, relutamos tanto em mudar de opinião, mesmo quando se torna insustentável a nossa crença diante das evidências que estão na nossa cara.

"Não escolhemos nossas crenças mais profundas, mais motivadoras, unicamente (nem mesmo primordialmente) com base na análise racional". P. 172.

Nem o teísta e nem o ateísta. Um ou outro irá fundamentar a sua visão de mundo, apelando para argumentos de toda espécie, no entanto, a sua volição em maior ou menor intensidade dependerá de sua paixão em acreditar no que acredita. A razão nunca opera sozinha. Impossível. 


WACHHOLZ, Wilhelm. História e Teologia da Reforma: Introdução. São Leopoldo: Sinodal, 2010.

Eis um tema e assunto que sempre me é recorrente. Nunca é demais estudar um pouco sobre o evento que desencadeou uma mudança gigantesca na espiritualidade vigente na Europa, com suas consequências que se fazem sentir até hoje. O autor com um Ph.D na Escola Superior de Teologia, em São Leopoldo, Rio Grande do Sul, enumera os posicionamentos do reformadores Lutero, Calvino, Zwínglio, Melanchthon e outros discordantes da igreja romana, sobre esses temas: Fé, Bíblia, Batismo, Estado, Iconografia e etc.

“[...] Entre as 27 afirmações sobre o poder papal, [o papa] Gregório VII deixou claro em Dictatus Papae o poder do papa na relação com o imperador ao reivindicar que o papa ‘é o único que deveria ter os pés beijados por todos os príncipes’. [...] O sucessor de Gregório, [o papa] Inocêncio (1198-1216), definiu a posição do papa como sendo ‘inferior a Deus, porém superior ao homem’, não podendo ser julgado por nenhum homem.” P. 23-24. 

Com o dinheiro adquirido pela igreja, o pé do papa era limpinho e bem tratado. Nada de frieira, pereba ou chulé. Ao contrário da grande massa de fiéis que lhe tinham como o representante oficial de deus.


GONDIM, Ricardo. Pra começo de conversa. São Paulo: Fonte Editorial, 2012.

Pra começo de conversa... Adorei o livro.

Esse é o sétimo livro do Gondim que leio. Um autor que escreve com a alma e com o coração. Suas reflexões, divagações e críticas geralmente acertam o alvo. Sua escrita é leve, agradável, poética e cheia de pensamentos elevados e sóbrios. Compartilho dos anseios, inquietações, dúvidas, medos e de muitas de suas idéias sobre a vida, pessoas, religião, Deus e futuro. Não vejo nele a arrogância costumeira que habitualmente me deparo com outros escritores (e até comigo mesmo). Às vezes encontro algumas contradições em suas palavras, mas quem não tem as suas?

“[...] Temos a sensação de que estar vivo é bom, por outro lado carregamos uma expectativa de perigo, que nos acompanha pela existência. Não demora percebermos: somos mortais. De repente, damos conta: o oceano onde nadamos não tem porto. Somos sabedores de que morreremos antes de alcançar qualquer margem, cansados de nadar contra a maré, provamos o fel da angústia.” P. 179. 

“[...] T. S. Eliot perguntou, há mais de cem anos, mas sua pergunta ainda é atual: ‘Onde está a vida que perdemos vivendo? Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento? Onde está o conhecimento que perdemos na informação?’. Insana, a humanidade se debate sem sequer saber qual o antídoto para o veneno que a destrói.” P. 187.

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